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Governos da UE preparam-se para apoiar procedimento contra Itália

Um documento de trabalho a que a Reuters teve acesso refere que se "justifica" a abertura de um procedimento por défices excessivos a Itália. No entanto, reuniões ao nível técnico podem não redundar na aprovação de um documento que recomende o PDE.

EPA
David Santiago dsantiago@negocios.pt 07 de Junho de 2019 às 20:25

Os governos europeus estarão a posicionar-se para validar a abertura de um procedimento por défices excessivos (PDE) contra Itália devido ao critério relativo à dívida, avança a Reuters. A Comissão Europeia propôs este procedimento, na passada quarta-feira, no âmbito das recomendações feitas aos Estados-membros.

A Reuters noticia, citando uma fonte comunitária que falou com base num documento de trabalho comunitário, que os governos dos 27 Estados-membros (excluindo o Reino Unido) se preparam para apoiar a abertura de um PDE a Itália, considerando tal medida como "justificada". Foi também esta a expressão utilizada pela Comissão para propor a abertura de um procedimento contra Itália.

No entanto, a mesma fonte sublinha que os responsáveis técnicos poderão sugerir à Comissão para que tenha em conta "novos elementos" que possam surgir, concretamente do lado italiano. Quando o comissário para os Assuntos Económicos, Pierre Moscovici, fez a apresentação das recomendações da Comissão, também salientou que Bruxelas mantém a "porta aberta" para dialogar com Roma e que permanece disponível para "ter em consideração novos dados" que venham a ser apresentados pelas autoridades transalpinas.

A concretizar-se a abertura do PDE, será a primeira vez que o mesmo é espoletado devido à violação do critério da dívida pública, que no caso italiano continua a crescer em vez de diminuir como determinam as regras europeias. E tem como eventual consequência a aplicação de sanções financeiras.

Nos próximos dias 11 e 12 de junho decorrem reuniões de um comité técnico composto por elementos dos ministérios das Finanças dos 27, cabendo-lhe a aprovação de um documento que segue para o Ecofin (fórum dos ministros das Finanças da UE). É o Ecofin que tem a palavra final sobre a abertura, ou não, do PDE, sendo que a reunião da próxima semana deverá ser para a discussão ao nível político, devendo ficar a decisão derradeira para o encontro de 9 de julho.

Os governos poderão aprovar o PDE a Itália ou optar por requerer mais informações a Roma e recomendar à Comissão Europeia que prossiga o diálogo com as autoridades transalpinas.

Quanto à posição de Portugal, particularmente relevante na medida em que Mário Centeno é ministro das Finanças e também líder do Eurogrupo, o Negócios sabe que o governo reserva a escolha entre uma posição contra ou a favor da abertura do PDE para o decurso da discussão que será feita no comité técnico acima referido. Ou seja, prefere aguardar pela exposição dos argumentos da Comissão e do governo italiano.

Seja como for, o documento de trabalho a que a Reuters faz referência confirma que a trajetória ascendente do endividamento público de Itália infringe as regras inscritas no Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC). "Um PDE com base na dívida é, portanto, justificado", sustenta a mesma fonte comunitária à Reuters.

UE exige corte de 3 mil milhões no défice de 2019

A Reuters revela ainda, baseada em informações adiantadas por dois membros destacados do governo italiano, que o executivo chefiado por Conte pode conseguir um défice abaixo dos 2,4% do PIB estimados por Bruxelas (previsões de primavera) para 2019, porém acima dos 2,04% acordados em dezembro depois do longo braço de ferro entre Roma e a Comissão. 

Ante o provável incumprimento da meta definida, outra fonte da UE revelou à Reuters que Bruxelas pediu a Itália que reduza o seu défice em 0,2 pontos percentuais, o equivalente a cerca de 3 mil milhões de euros. Recorde-se que, no final do ano passado, a pressão exercida por Conte e Tria foi decisiva para que Salvini e Di Maio aceitassem reduzir a meta para o défice de 2,4% do PIB para os 2,04% fixados no orçamento para 2019.

Esta sexta-feira, o Banco de Itália cortou a estimativa para a evolução económica em 2019, prevendo agora uma expansão do PIB de apenas 0,3%, inferior aos 0,6% projetados em janeiro. Também o executivo transalpino já baixara a perspetiva de crescimento da economia para 0,2%. 

Precisamente devido ao deteriorar da conjunta económica, interna e externa, os objetivos fixados no orçamento expansionista do governo italiano, desde o início considerados como demasiado otimistas pela Comissão, Salvini defende ser preciso aprofundar a redução de impostos ("tax flax"). Contudo, essa medida tenderia a implicar, pelo menos no curto e médio prazo, menos despesa e mais défice, cenário que dificultaria ainda mais um entendimento entre as partes.

Conte e Tria juntam-se ao presidente italiano para conter vices

A imprensa italiana e a CNBC escrevem esta sexta-feira, citando diferentes fontes sob condição de anonimato, que o primeiro-ministro Giuseppe Conte e o ministro das Finanças, Giovanni Tria, se reuniram com o presidente de Itália, Sergio Mattarella, para evitar que o país reentre numa crise institucional e económica.

Esta espécie de aliança informal entre os tecnocratas Conte e Tria e o político Mattarella tem em vista conter os ímpetos do próprio governo italiano de aliança entre a Liga e o Movimento 5 Estrelas, dois partidos populistas e eurocéticos que são respetivamente liderados pelos vice-primeiros-ministros Matteo Salvini e Luigi Di Maio.

O objetivo passa por condicionar a vontade de enfrentar Bruxelas, sobretudo da parte de Salvini, e evitar que seja aberto um novo PDE contra a república transalpina. Depois da vitória nas europeias em que duplicou o resultado alcançado nas legislativas de março de 2018, Salvini surge ainda mais determinado em fazer valer a sua agenda, até porque a hipótese de queda do governo e novas eleições não é descurada em virtude da quebra do 5 Estrelas.

E se até esta semana Di Maio contrariava Salvini opondo-se à violação das regras europeias (dívida e défice) como forma de impulsionar o crescimento económico e criar emprego, na quarta-feira o líder do 5 Estrelas reagiu aos reparos da Comissão feitos à facilitação do acesso a pensões (bandeira eleitoral do 5 Estrelas) garantindo que o recuo na reforma da Segurança Social feita em 2011 (lei Fornero) não é para mexer, uma declaração que pode ser lida como desafiadora face a Bruxelas.

Giuseppe Conte é o responsável por conduzir as conversações com a União Europeia, o que pode ajudar a um posicionamento mais moderado, até porque Salvini e Di Maio sabem que uma eventual demissão do primeiro-ministro – ameaçou fazê-lo no início da semana se Liga e 5 Estrelas não pusessem de parte as crescentes divergências – poderia ter impacto nos mercados com a subida dos juros da dívida transalpina.

Conte tem reiterado, nos últimos dias, que até ser possível criar consensos para mudar as regras europeias, estas são para cumprir. Resta saber se o primeiro-ministro vai conseguir garantir a coesão necessária num governo que funciona a "três vozes".

Depois das fortes subidas da semana passada, hoje os juros da dívida italiana a 10 anos caíram para mínimos de mais de um ano, sobretudo devido à garantia do Banco Central Europeu de que os juros vão permanecer em níveis historicamente baixos até pelo menos meados de 2020.  

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