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Vices do governo de Itália entendem-se após ultimato de Conte
Pode não ser uma paz definitiva, mas Salvini e Di Maio dialogaram e decidiram aproximar posições para trabalhar em conjunto. Acordo relativo às novas regras dos concursos públicos sela pacificação. Resta saber se unidade se mantém num potencial novo embate com a UE.
O primeiro-ministro italiano Giuseppe Conte exigiu "responsabilidade" aos líderes dos partidos que integram o governo transalpino, e trabalho conjunto para bem de Itália, caso contrário demitia-se. Di Maio e Salvini responderam com uma trégua para que o governo se mantenha em funções.
Depois de um encontro com o presidente italiano, Sergio Mattarella, o líder do Movimento 5 Estrelas, Luigi Di Maio, garantiu que "o governo quer continuar".
O também vice-primeiro-ministro acrescentou, citado pelo La Repubblica, que na conversa telefónica mantida durante a manhã com o líder da Liga, Matteo Salvini, a primeira em várias semanas, os dois encontraram "pontos em comum" que serão a "solução" para a continuidade do inédito executivo de aliança entre duas forças populistas e anti-sistema.
Em comunicado do gabinete de Giuseppe Conte destaca-se, resumidamente, que "o regresso ao diálogo é um bom sinal".
A selar esta trégua esteve também o recuo da Liga relativamente à parte de um decreto-lei em discussão que está relacionada com a criação de novas regras para concursos públicos. O próprio primeiro-ministro havia pedido à Liga, em reuniões intragovernamentais relatadas pela imprensa italiana, que cedesse.
O acordo fechado esta terça-feira é tão mais importante na medida em que a criação de novas regras para a adjudicação de contratos públicos, que a Liga quer usar para combater a influência da máfia, estava a ser usada como arma de arremesso entre os partidos de Di Maio e Salvini. A solução encontrada assenta sobretudo pela não inclusão das normas que causavam maiores divisões no seio do executivo.
Este acordo e a trégua entre os dois números dois do governo põem fim a semanas de escalada na atribulada relação entre a Liga e o 5 Estrelas, que iniciaram funções governativas a 1 de junho do ano passado.
A piorar o áspero relacionamento entre Salvini e Di Maio esteve o resultado dicotómico das eleições europeias de 26 de maio. Depois de ter vencido as legislativas de março de 2018 por expressivos 32,5%, o 5 Estrelas caiu agora para a casa dos 17% que a Liga tinha alcançado há um ano.
A sublinhar a troca de posições, o partido de Salvini venceu as europeias com 34%, o que permite à Liga assumir o papel de partido mais preponderante da política transalpina.
Em alta nas sondagens e nos níveis de popularidade, Matteo Salvini começou a correr em pista própria tentando ditar a agenda da governação, o que foi lido como uma possível tentativa de erodir por dentro o governo e levar o 5 Estrelas a provocar eleições.
Neste contexto, e com a economia italiana a comportar-se muito aquém do estimado nas projeções macroeconómicas do governo, Salvini endureceu ainda mais as críticas contra Bruxelas e ameaçou romper os limites das regras orçamentais europeias para estimular a criação de emprego e o crescimento do PIB.
Esforço para atenuar tensão com Bruxelas
Perante a possibilidade de a Comissão Europeia propor a abertura de um procedimento por défices excessivos a Itália – a posição do órgão executivo da União Europeia é conhecida esta quarta-feira, ficando uma decisão final a cargo do Ecofin -, o primeiro-ministro italiano está a tentar fazer controlo de danos.
Conte defendeu na segunda-feira que não vale a pena seguir o caminho de confrontação empreendido por Salvini – que disse recentemente que Bruxelas tem de parar de enviar "cartinhas" e concentrar-se em promover o crescimento – porque as regras europeias vão estar em vigor "até ao momento em que as conseguirmos mudar".
Também o eurocético Di Maio tem feito declarações nesse sentido, afirmando que Itália deve evitar novas violações com compromissos assumidos com Bruxelas para impedir nova escalada nos juros da dívida pública.
Porém, até ao momento, Salvini insiste ser necessário reforçar a despesa (agravando o défice) para financiar medidas como a famosa "flat tax" (descida de impostos para famílias e empresas mediante a criação de uma taxa única), a bandeira eleitoral da Liga que foi só parcialmente implementada.
A este respeito, o ministro italiano das Finanças, Giovanni Tria, reiterou hoje que não será preciso "furar limites" se a economia crescer. O problema é que depois da estagnação, no primeiro trimestre de 2019, o PIB transalpino avançou apenas 0,1%. Tria reafirmou ainda o compromisso com a descida da dívida pública (Bruxelas estima que, em vez de continuar a baixar, como estipulam as regras, cresça e supere os 135% do PIB em 2020).