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Crise política em Itália após Di Maio confirmar saída da chefia do 5 Estrelas?

Luigi Di Maio anunciou a demissão de líder político do Movimento 5 Estrelas, decisão que não coloca em causa a permanência como chefe da diplomacia transalpina na coligação de governo entre o partido anti-sistema e o PD. Divisões internas no 5 Estrelas põem em causa o governo italiano e ameaçam promover nova crise política.

Reuters
David Santiago dsantiago@negocios.pt 22 de Janeiro de 2020 às 17:37
Luigi Di Maio confirmou, através de anúncio público, a demissão como líder político do Movimento 5 Estrelas, 28 meses depois de ter sucedido a Beppe Grillo à frente do partido anti-sistema. No entanto, o também ministro dos Negócios Estrangeiros disse que continuará a chefiar a diplomacia transalpina e que a coligação de governo com o PD (centro-esquerda) permanece de pé. 

"É chegado o momento de nos refundarmos. Hoje fecha-se uma era. Cumpri até ao fim o meu dever", declarou Di Maio no discurso em que confirmou a saída da liderança do 5 Estrelas durante um evento em que foram revelados os novos responsáveis regionais do partido e em que tem início a preparação dos estados gerais dos "grillini", dentro de dois meses. 

Di Maio defendeu que esse será um "momento importantíssimo" para o 5 Estrelas pois será a altura em que terá de avançar com um novo projeto para os próximos 10 anos. Numa longa intervenção, o líder cessante deixou vários recados para fora mas sobretudo para dentro do partido. Lembrou as "traições" da Liga de Matteo Salvini para depois centrar o ataque aos críticos internos: "os rumores de poucos suplantaram o trabalho de tantos nestes anos", pois os "piores inimigos" são aqueles que menos se espera e que "não dão a cara quando se trata de construir, só pensam em destruir". "Chega de facadas nas costas", rematou.

Após ter recordado o seu percurso e o do partido desde 2013, Di Maio sublinhou que a intenção do 5 Estrelas foi "sempre ser a bússola dos cidadãos", desafio que se mantém tão ou mais premente tendo em conta que "estão a mudar os pontos cardeais da política em todo o mundo". E lembrou que, ao exercer funções executivas, o 5 Estrelas teve de fazer "escolhas duras e muitas vezes incompreensíveis" pelos respetivos apoiantes, com muitos a dizerem que a "sua confiança foi traída".  

A liderança do partido ficará agora temporariamente com Vito Crimi, que será o regente do 5 Estrelas até à escolha de novo líder. Crimi é o membro mais antigo da atual direção dos "grillini".

Antes ainda da intervenção de Di Maio, mas quando já era tido como certo o afastamento, surgiram de imediato garantias de que tal decisão não belisca o governo de aliança entre o 5 Estrelas e o PD. O primeiro-ministro, Giuseppe Conte, assegurou que o governo permanece unido e coeso e que a coligação formada no passado verão depois da crise política aberta pela demissão de Matteo Salvini não está em causa.


Também Nicola Zingaretti, secretário-geral do PD (partido júnior da coligação governativa), deu garantias de que o governo transalpino está seguro e irá prosseguir o seu trabalho. Salvini quase ignorou Di Maio e acabou por tecer duras críticas ao fundador do 5 Estrelas, Beppe Grillo, que o chamou de "traidor" por ter aceitado aliar-se ao PD, partido "dos poderosos e dos banqueiros". Mesmo sem certezas quanto ao futuro do cenário político, os juros da dívida italiana aliviaram esta quarta-feira.


Da euforia à crise em menos de dois anos
O anti-sistema Movimento 5 Estrelas não se está a dar bem com o exercício do poder e isso fica claro quando se olha para a forma como tem decorrido o mandato de Virginia Raggi (também alvo de fortes críticas no seio do partido) na câmara de Roma e, em especial, a participação do partido nos dois executivos formados desde as eleições gerais de março de 2018.

Nessas eleições, o 5 Estrelas tornou-se o maior partido italiano (32%) e, após longos meses de indefinição quanto à formação de um governo, acabou por forjar uma inédita coligação com a Liga de Salvini. Um ano volvido, com o 5 Estrelas em quebra nas sondagens e a Liga já na posição de maior partido ao capitalizar com a agenda anti-imigração de Salvini, a crise política promovida por líder da extrema-direita não resultou em novas eleições porque Di Maio se entendeu com o PD e o independente Conte para formar um governo comprometido com o projeto europeu. 

Desde então, a Liga manteve-se como maior força e o PD recuperou terreno ao ponto de superar o 5 Estrelas nas sondagens, que agora não vai além dos 16%. Nesta conjuntura, o 5 Estrelas foi perdendo diversos deputados ao longo dos últimos meses, parlamentares que saíram sobretudo para a Liga e para o novo partido de Matteo Renzi (Itália Viva). 

A agravar o cenário estão as sondagens que colocam o 5 Estrelas em torno dos 5% para as eleições regionais do próximo fim de semana na Calabria e na Emilia-Romagna. Neste último caso, a Liga lidera e Salvini espera um resultado robusto que lhe permita reabrir o debate sobre a legitimidade do atual executivo. 

Esta tarde, Luigi Di Maio quis calar os críticos garantindo que sem convulsões internas o 5 Estrelas teria "ainda melhores resultados" e invocando o "direito sacrossanto" de o 5 Estrelas não poder ser "julgado por 20 meses no governo", mas depois de concluídos os "cinco anos da legislatura". "Em frente até ao fim da legislatura", proclamou. 

A duração do governo depende, porém, menos da proclamação de vontade de Di Maio e mais daquele que for o caminho escolhido pela próxima direção de um partido envolto em polémicas e divisões pois também o filho do co-fundador do 5 Estrelas, Davide Casaleggio, responsável pela gestão da plataforma Rousseau (na qual assenta a democracia direta preconizada e da qual saem as principais decisões do partido) tem sido alvo de fortes críticas.

À fragilização da coligação de governo decorrente da incerteza quanto ao futuro do 5 Estrelas junta-se a tendência de Itália para se enredar em crises políticas cíclicas, o que deixa em aberto a possibilidade de uma nova fase de instabilidade política no horizonte.

 

(Notícia atualizada)
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