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Governo contraria advogados e recusa dar subsídio a pais nas "pontes" de dezembro

Ministra da Presidência diz que a lei que garantiu aos pais receber um subsídio quando as escolas estiveram encerradas no primeiro confinamento agora já não se aplica, apesar de ainda estar em vigor. Os pais têm direito a falta justificada mas perdem dois dias de remuneração, ou seja 7% do seu vencimento.

Lusa
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O Governo entende que os pais impedidos de trabalhar nos dias em que as escolas estarão encerradas, a 30 de novembro e 7 de dezembro, não devem receber o subsídio previsto na lei que compensa pelo menos parcialmente a perda de remuneração. Em causa estão dois dias de vencimento, ou seja, numa simples divisão por 30 dias, 7% da remuneração mensal. 

Em entrevista à Rádio Renascença, a ministra da Presidência afirmou que "têm direito a falta justificada, mas não remunerada". Mariana Vieira da Silva defende que "neste momento, não existe uma prestação desenhada para estes dois dias", apesar de a mesma lei que garantiu este subsídio durante o encerramento de escolas no primeiro confinamento ainda estar em vigor. 

As declarações da ministra foram divulgadas no dia em que o Negócios noticiou que os trabalhadores com filhos menores de 12 anos têm direito a falta justificada e a um subsídio que os compense pela perda remuneratória, com base nas conclusões de dois advogados, uma vez que o decreto-lei que enquadra este direito ainda está em vigor. As questões foram colocadas ao Ministério da Segurança Social logo na segunda-feira que, apesar da insistência, não respondeu ao Negócios.

Esta quarta-feira, após uma reunião de concertação social, a ministra do Trabalho confirmou que a intenção do Governo é não atribuir o subsídio mas, questionada pelos jornalistas, não explicou em que legislação está a basear o direito a faltas justificadas, respondendo que os esclarecimentos serão prestados pela Direção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho (DGERT).

"Estamos a falar de dois dias no meio dos feriados e o apoio à família foi desenhado para um outro contexto para o ano letivo 2019/2020, e portanto aquilo que temos é uma situação diferente, de uma falta justificada [sem remuneração] mas aqui também deve haver uma gestão de partilha entre os pais: um dia ser um dos pais, outro dia ser outro", sugeriu a ministra do Trabalho.

A questão aplica-se ao setor privado, uma vez que a Função Pública tem tolerância de ponto. Questionada sobre a resistência do setor privado à "recomendação" de encerramento de empresas nesses dias, Ana Mendes Godinho afirmou que o Governo que enviou um email a cerca de 400 mil entidades empregadoras "pedindo a mobilização de todos neste momento difícil".

Questionada sobre se considera justo que os funcionários públicos e os trabalhadores do privado em teletrabalho não percam rendimento, enquanto outros trabalhadores poderão ter de perder (ou ser forçados a trabalhar presencialmente), a ministra limitou-se a responder que o Governo decidiu a tolerância de ponto para a Função Pública "enquanto empregador público" e renovou o "apelo" para que as empresas do privado façam o mesmo.

O que diz a lei

Uma fonte do Governo não identificada citada pelo Expresso sustentou esta manhã que os advogados ouvidos pelo Negócios estão equivocados porque "o mecanismo de apoio à família está previsto na lei mas diz respeito expressamente ao calendário escolar do ano letivo 2019-2020, abrangendo portanto apenas as suspensões letivas que não estivessem previstas nesse calendário".

A intenção do Governo é sublinhar que o apoio foi pensado para o ano letivo anterior. Mas o decreto-lei continua em vigor, podendo ser consultado em Diário da República, e a suspensão letiva prevista para os próximos dias 30 de novembro e 7 de dezembro, decidida pelo Governo, também não consta desse calendário.


Estabelece o decreto-lei que "fora dos períodos de interrupções letivas fixados nos anexos II e IV ao Despacho n.º 5754-A/2019", ou seja, fora dos períodos de férias que foram definidos no ano letivo anterior, "consideram-se justificadas, sem perda de direitos salvo quanto à retribuição, as faltas ao trabalho motivadas por assistência inadiável a filho ou outro dependente a cargo menor de 12 anos, ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica, decorrentes de suspensão das atividades letivas" decretadas por autoridade de saúde ou "pelo Governo", como é o caso.

Diz também que nestes mesmos casos "o trabalhador por conta de outrem tem direito a receber um apoio excecional mensal, ou proporcional, correspondente a dois terços da sua remuneração base, pago em partes iguais pela entidade empregadora e pela segurança social", estabelecendo outros subsídios para os independentes.

O que concluem os advogados

Foi com base na legislação que os advogados contactados pelo Negócios referiram esta terça-feira que vigora o direito à falta justificada e ao subsídio da Segurança Social. Tal como explicávamos na edição de hoje, o apoio só é devido a um dos progenitores, independentemente do número de filhos, e apenas se nenhum dos dois estiver em teletrabalho

"O artigo 22.º do DL 10-A/2020, de 13.03, prevê que em caso de suspensão de atividades letivas presenciais, fora dos períodos de férias escolares, se considera como justificada a falta dada para acompanhamento de menor de 12 anos ou, independentemente da idade, para acompanhamento de filho com deficiência ou doença crónica", disse ao Negócios Nuno Ferreira Morgado, sócio co-coordenador da área de Laboral da PLMJ. "Nestas situações, o trabalhador por conta de outrem tem direito a receber um apoio excecional mensal, ou proporcional, correspondente a dois terços da sua remuneração-base, pago em partes iguais pela entidade empregadora e pela Segurança Social."

Inês Arruda, sócia responsável pelo departamento Laboral da Vasconcelos Arruda Associados, concordou. "Parece-me que se aplica a Lei n.º 10-A/2020, que não foi revogada", referiu, sublinhando que a lei garante este direito quando a decisão de encerramento da escola é do Governo.

Nuno Ferreira Morgado explicou que o apoio "só pode ser solicitado durante o(s) dia(s) de suspensão de atividade letiva, pelo que nada impede que seja solicitado por um ou dois dias". O apoio é proporcional e como diz Inês Arruda "o cálculo é em relação a remuneração diária (30 dias)".

Os advogados lembraram que o apoio só pode ser requisitado por um dos progenitores e apenas se nenhum deles estiver em teletrabalho, uma regra que foi bastante contestada. "A lei considerou que quem está em teletrabalho pode prestar essa assistência", afirmou Inês Arruda. "Esta falta tem como premissa a necessidade de acompanhamento do menor no período de interrupção de atividade letiva. O menor não necessita de ser acompanhado pelos dois progenitores", acrescentou Nuno Ferreira Morgado.

Se no caso dos trabalhadores por conta de outrem o apoio previsto corresponde a dois terços da remuneração-base, com o limite mínimo de um salário mínimo (635 euros) e máximo de três (1.905 euros), sendo calculado de forma proporcional aos dias, no caso das trabalhadoras do serviço doméstico corresponde a 2/3 do salário de janeiro.

No caso dos independentes que tenham pelo menos três meses de descontos seguidos nos últimos 12, o apoio é de um terço da base de incidência média mensal do primeiro trimestre, com o limite mínimo de 438,81 euros e máximo de 877,62 (2 IAS).


Em declarações à Rádio Renascença, a ministra da Presidência acrescentou que muitas empresas já responderam ao apelo do Governo no sentido de darem tolerância de ponto aos seus funcionários e afirmou ainda que há muitas pessoas que estão em teletrabalho.

Esta terça-feira, o Ministério do Trabalho revelou dados preliminares de um estudo do Gabinete de Estratégia e Planeamento que mostra que só 20% dos trabalhadores estão em teletrabalho e que 66% de um amostra de 10 mil empresas não tem nenhum funcionário a trabalhar à distância.

Notícia atualizada às 15:50 com as declarações da ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho.
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