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Vítor Constâncio lamenta morte de "um homem raro"
O vice-presidente do BCE sublinhou a "honestidade intelectual" e o "espírito de serviço público" de Silva Lopes, considerando serem "valores inevitavelmente em declínio numa época de extremado individualismo utilitarista", mas que "são valores fundamentais".
O vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE), Vítor Constâncio, lamentou hoje a morte de "um homem raro" como José da Silva Lopes, salientando que "deixa um enorme vazio na comunidade dos economistas portugueses".
"Sinto a sua morte como uma enorme perda pessoal", afirmou Vítor Constâncio numa mensagem escrita enviada à agência Lusa.
José da Silva Lopes, que foi ministro das Finanças e governador do Banco de Portugal (BdP), entre 1975 e 1980, morreu na quinta-feira, aos 82 anos.
Vítor Constâncio, que também foi governador do BdP (2000-2010), recordou de Silva Lopes os "valores de probidade, de integridade, de enorme dedicação e capacidade de trabalho, de empenhamento numa contínua intervenção pública".
O vice-presidente do BCE sublinhou a "honestidade intelectual" e o "espírito de serviço público" de Silva Lopes, considerando serem "valores inevitavelmente em declínio numa época de extremado individualismo utilitarista", mas que "são valores fundamentais".
"Nunca vi o Dr. Silva Lopes hesitar em dizer o que lhe parece ser verdadeiro. Nem hesitar em exprimir dúvidas ou fazer perguntas, como é próprio dos homens seguros de si, a quem a verdade interessa mais do que a mera pretensão de saber, essa honestidade intelectual que o levava muitas vezes a ser politicamente ‘incorrecto’", recordou Constâncio.
"O seu proverbial pessimismo, uma deformação profissional dos economistas, era em parte o fruto desse honesto sentido da realidade", acrescentou.
Vítor Constâncio destacou, ainda, o "espírito de serviço público" de Silva Lopes, referindo que era o "paradigma em Portugal daquilo que os franceses designam como um Grande Servidor do Estado".
Recordou que Silva Lopes foi "assessor nas negociações para a entrada de Portugal na EFTA e na preparação do Acordo de Comércio Livre com a então CEE" e responsável numa primeira fase pelas negociações para a entrada na Comunidade Europeia como país membro, em que trabalharam juntos.
Aludiu igualmente ao trabalho de Silva Lopes no âmbito da regulação do sistema financeiro português ou sobre a reforma fiscal e "ainda o seu importante papel como governador do Banco de Portugal" e depois como ministro na "superação da crise da balança de pagamentos de 75-77".
Vítor Constâncio referiu também, na mensagem enviada à Lusa, que Silva Lopes "nunca foi propriamente um simples tecnocrata" e reconheceu sempre que "não existe neutralidade em economia aplicada e que, até mesmo na teoria, a economia não é uma asséptica ciência exacta".
O antigo ministro das Finanças, segundo Constâncio, "tinha um pensamento firmemente ancorado nos valores da solidariedade e da equidade social, mas teve sempre a honestidade de não acomodar reivindicações irrealistas ou de curto prazo mesmo quando pretendem passar por defesas justas de valores sociais".
"Silva Lopes sempre foi transparente sobre a perspectiva em que intervinha, a de um conceito de bem comum, de um interesse geral que procurava servir e que em democracia é o resultado do livre confronto de ideias e das escolhas das legítimas instâncias políticas e não um dado apriorístico e unívoco", acrescentou.