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Governo justifica retirada de poderes do BdP com "nuvens" e "conflitos de interesses"

Mourinho Félix explicou as polémicas mudanças na supervisão macroprudencial e na resolução bancária, que marcam o novo modelo de supervisão financeira que pretende fechar "antes de outra crise" surgir.

Miguel Baltazar
31 de Outubro de 2017 às 16:31
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O secretário de Estado adjunto e das Finanças considerou esta terça-feira, 31 de Outubro, que "a supervisão financeira é uma matéria que não tem sido tratada pelo poder político com a devida relevância", surgindo "esporadicamente na sequência de problemas com alguma instituição" e saindo depois da agenda "quando esse problema específico aparenta estar solucionado ou, por vezes, resolvido com elevados custos para a sociedade",

 

Na abertura de uma conferência na Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP) sobre a reforma da supervisão financeira, a que quer dar tradução legislativa até ao final do ano, Ricardo Mourinho Félix aproveitou para justificar a polémica retirada dos poderes de supervisão macroprudencial e de resolução bancária ao Banco de Portugal (BdP), os dois temas "marcantes" do novo modelo desenhado por um grupo de trabalho liderado por Carlos Tavares, que esteve em consulta pública até 20 de Outubro.

 

O relatório que serve de base à reforma, elaborado pelo ex-líder da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e pelo agora ministro Pedro Siza Vieira, passa esses poderes para o novo Conselho de Supervisão e Estabilidade Financeira, com administração própria e que agrega os três supervisores – BdP, CMVM e Autoridade de Supervisão dos Seguros e Fundos de Pensões (ASF) – e que "deve ter a capacidade de ter um conhecimento transversal e integrado dos problemas do sector financeiro, bem como a capacidade de coordenar a actuação dos diferentes supervisores sectoriais".

 

"Importa ter presente que as nuvens podem surgir em qualquer um dos sectores – seja no bancário, no segurador ou no mercado de capitais –, e que só a detecção e o confronto das variáveis dos diversos sectores poderá permitir uma compreensão clara de um determinado fenómeno", referiu o governante, salientando de seguida que "mesmo que um dos sectores tenha mais instrumentos para actuar, essa actuação provoca inevitavelmente efeitos nos outros sectores".

 

Para o membro da equipa das Finanças, "é pelo facto de um determinado instrumento macroprudencial poder produzir consequências noutros sectores que a entidade investida da função de supervisão macroprudencial não deve acumulá-la com a função de supervisão microprudencial de um sector específico".

 

Perante uma plateia onde se destacavam o próprio Carlos Tavares, os ex-ministros Fernando Teixeira dos Santos (que arrasou a proposta apresentada ao Executivo), Daniel Bessa e Miguel Cadilhe, e o ex-líder bloquista Francisco Louçã, que integra o Conselho Consultivo do BdP, o secretário de Estado das Finanças abordou também a clarificação para o exercício da função de resolução, proposta pelo grupo de trabalho, justificando a busca desta nova solução com o "bem conhecido (…) conflito de interesses no papel do supervisor microprudencial e da autoridade de resolução". Admitindo que a solução possa ter de ser mais elaborada.

 

"Por um lado, o exercício de algumas funções de resolução não se encontra claramente desligado do exercício das funções de supervisão microprudencial e depende da informação e dos recursos técnicos existentes nesta área. Por outro lado, é necessário confrontar o exercício das funções da autoridade nacional de resolução com a enorme integração hoje existente no mecanismo único de resolução e com o alargamento que se encontra a ser preparado relativamente aos mecanismos de resolução de entidades fora do sector bancário", declarou Mourinho Félix.

 

Discussão "tecnicamente maturada e desapaixonada"

 

Além destas duas mudanças e do surgimento do Conselho de Supervisão e Estabilidade Financeira, cuja liderança ainda não foi definida, o novo modelo proposto, que ainda aguarda formalização legislativa, cria também o Conselho Superior de Política Financeira, em que o ministro das Finanças tem uma palavra a dizer sobre as decisões que afectam a evolução económica.

 

Ricardo Mourinho Félix apontou ainda que "os momentos de elevada tensão financeira são precisamente aqueles em que é mais difícil discutir este tema com a serenidade que ele exige", pelo que, acrescentou, "é quando a situação está estável que é possível discutir soluções de forma serena e aprofundada, tecnicamente maturada e desapaixonada".

 

Para o membro da equipa das Finanças, esta reforma surge naquele que classificou como um momento crucial: "na saída de uma crise financeira que não vamos esquecer, e antes de outra que todos queremos evitar". Frisando que "as crises financeiras não surgem sem aviso", contrapôs que "são grandes tempestades que, com o conhecimento e as ferramentas adequadas, é possível antecipar e, senão evitar, pelo menos mitigar os seus efeitos sobre a economia e a vida dos cidadãos".

O modelo desenhado por Carlos Tavares e Siza Vieira

O modelo da reforma proposto pelo grupo de trabalho, liderado pelo ex-presidente da CMVM, retira poderes ao BdP e cria novos organismos com função de coordenação de supervisores.

 

O PROCESSO
O Governo sempre insistiu na reforma da supervisão. Contratou Carlos Tavares para liderar o grupo de trabalho. O relatório resultante esteve em consulta pública até 20 de Outubro. APB e APS deram contributos. Falta a legislação.

 

O BdP

O modelo mantém três supervisores (Banco de Portugal, CMVM e ASF). Só que o primeiro deixa de ter os poderes de resolução e de supervisão macroprudencial, continuando, contudo, responsável pelo acompanhamento de supervisão de cada instituição financeira.

 

O CONSELHO

O actual Conselho Nacional de Supervisores Financeiros é extinto e dá lugar ao Conselho de Supervisão e Estabilidade Financeira. Assume os poderes retirados ao BdP e fica responsável por articular os supervisores. Tem supervisores e membros próprios na administração.

 

A POLÍTICA

A funcionar junto do primeiro conselho, há um outro órgão: o Conselho Superior de Política Financeira. Presidido pelo ministro das Finanças, conta com representantes dos supervisores e acompanha os temas de banca e finanças com impacto na política financeira e económica.

 

AS NOMEAÇÕES

O governador do BdP e o líder do Conselho de Supervisão são nomeados pelo Presidente da República, após proposta do Governo e depois de audição parlamentar com direito de veto. Os restantes devem ser sujeitos a concurso e a nomeação do Governo.

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