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Francisco Veloso: "Resposta do Governo ditará se vamos ter novo resgate"

Há cinco anos como "dean" da escola de negócios da Católica, Francisco Veloso vai dirigir a prestigiada Imperial College Business School. Parte preocupado com o impacto que a retirada dos estímulos terá numa economia ainda com problemas estruturais.

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Francisco Veloso considera que a retirada dos estímulos monetários pelo BCE vai obrigar o Governo a tomar medidas que vão pôr em causa a actual solução governativa. E não partilha da opinião de Mário Centeno de que as agências de "rating" estão a ser injustas com Portugal.

O que é para si, neste momento, capital em Portugal?

Não posso deixar de responder alinhado com os meus próprios interesses – mas não só, porque é algo em que acredito muito –, que é a continuada aposta no empreendedorismo e nas novas empresas como instrumento de transformação da nossa economia. É absolutamente crítico para levarmos Portugal de onde está para onde todos gostaríamos que estivesse. Esta é uma dinâmica que já existe, mas tem de continuar e ser amplificada, para ter ainda mais impacto no país.

Como é que avalia a evolução de Portugal em termos económicos e financeiros, considerando a execução orçamental de 2016 e as perspectivas para 2017?


Francisco Veloso destaca a recuperação lenta
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Há cinco anos como "dean" da escola de negócios da Católica, Francisco Veloso vai dirigir a prestigiada Imperial College Business School. Olha para a recuperação da economia como lenta e com algumas dificuldades.

Estamos a evoluir lentamente e com algumas dificuldades. Aquilo que eu sinto, e talvez em função do arranjo de forças que suporta este Governo, é alguma quase esquizofrenia em algumas situações. Este Governo tem feito imenso por esta questão do empreendedorismo e da capitalização das empresas que são dois aspectos fundamentais, como eu referi. É algo meritório, têm existido medidas, instrumentos e actividade nesse sentido.

No entanto...

No entanto, quando olhamos para os 2,1% do défice, e de facto é um bom resultado, mas ele foi feito à custa de um enorme corte no investimento público, que é algo que é preocupante a nível das perspectivas de crescimento a médio prazo. E foi feito a um nível que não está a resolver a montanha de dívida que nós temos aí para resolver. Ou seja, é uma evolução que resulta destes equilíbrios de forças associados à estrutura política que suporta o Governo. Mas acho que nós temos uma série de reformas estruturais e de evolução nas próprias funções do Estado que não está a acontecer, nem vai acontecer provavelmente nos próximos tempos, e que limita o nosso potencial de resolução dos problemas. Não houve grande evolução no défice estrutural. Essencialmente as coisas ficaram iguais, ou seja, a nossa capacidade de estruturalmente resolvermos os problemas do Estado não evoluiu significativamente. Nesse sentido estamos num compasso de espera, à espera que o crescimento evolua, mas o crescimento dificilmente irá evoluir com pouca capacidade de financiamento e muita dívida. E isso significa que vamos continuar num ritmo de evolução, e os indicadores para o futuro assim o indicam, relativamente lento. E isso não é bom para o desenvolvimento a médio prazo do país, que precisava de uma dinâmica e de uma robustez de crescimento bastante maior do que aquela a que temos conseguido chegar até agora.

"Basta falar com qualquer pessoa que esteja no mercado financeiro, eles também fazem as contas e sabem como é que se chegou a este tipo de resultado [redução do défice para 2,1% do PIB]." Francisco veloso, director da Católica Lisbon School of Business

Concorda com a visão do ministro das Finanças de que as agências de "rating" estão a ser injustas com Portugal?

Não consigo perfilhar dessa perspectiva. Se nós tivéssemos reduzido de uma forma visível, em alguns pontos percentuais, a nossa dívida, acho que as agências de "rating" teriam olhado já de uma forma possivelmente diferente. E isso tem exactamente a ver com as decisões que são feitas. E eles próprios também sabem fazer contas. Porque uma coisa é nós obtermos um determinado tipo de objectivo, e isso tem mérito. Até porque tem implicações claras, por exemplo, nos procedimentos por défices excessivos, na possibilidade de aplicação de coimas da União europeia. Tem, de facto, relevância real obtermos esse tipo de resultados. Mas basta falar com qualquer pessoa que esteja no mercado financeiro, eles também fazem as contas e sabem como é que se chegou a este tipo de resultado e portanto sabem que há factores estruturais que não estão a ser solucionados com o nível de afinco que talvez fosse necessário para mudar o "outlook" destes investidores internacionais. E depois há aqui uma questão a pairar sobre tudo isto, e também sobre as agências de "rating" – e eu acho que só nessa altura é que as coisas vão começar a dissipar-se um bocadinho – que é: quando o BCE começar a retirar os estímulos e começar-se a ver o que é que vai acontecer ao nosso mercado de dívida secundária. Está toda a gente à espera disso. Não são só as agências de "rating". Se nós olharmos para a evolução das taxas de juro do mercado secundário da nossa dívida, têm crescido alegremente ao longo deste último ano e não sentiram de todo um alívio naquela semana da confirmação do défice de 2,1%.

A prova de fogo vai ser a retirada dos estímulos do BCE?

Vai ser muito importante. Não quero dizer com isto que esteja aqui a vaticinar cataclismos, mas certamente vai ter algum impacto e a questão é vermos até onde é que esse impacto vai. É diferente os juros subirem para 4,5% ou de repente passarem os 5%.


Francisco Veloso fala sobre o risco da subida das taxas de juro da dívida
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O futuro director da Imperial College Business School afirma que as taxas de juro vão subir e vão ser necessárias medidas para conter a despesa e criar uma almofada. E essa vai ser a "prova de fogo" para o governo e para a actual solução governativa.

Mas com os dados que existem actualmente, considera que é possível Portugal aguentar esse impacto?

Vai ser uma das provas de fogo deste Governo. Acho que as taxas de juro vão subir um valor importante e vai ser necessário tomar algumas medidas em termos de contenção de despesa, que vão pôr à prova a estrutura deste Governo. Começa a haver pressões especulativas no sentido de dizer "não vão conseguir", todos os fundos especuladores vão começar a entrar sobre essa perspectiva. Vai começar a haver pressão para que o Governo demonstre que mesmo que isso aconteça será capaz de contrapor com algumas medidas, nomeadamente criar uma almofada. Isso vai criar uma prova de fogo ao actual Governo e à actual solução governativa. A capacidade ou incapacidade que exista por parte do Governo de dar uma resposta firme e convincente a essa situação é que, quanto a mim, vai ter um impacto mais significativo a médio prazo sobre o que vai acontecer à nossa situação económica, e a possibilidade ou não de virmos a ter um problema maior. E um problema maior significa a possibilidade de um novo resgate ou algo como isso.

perfil

Um físico apaixonado pela inovação

Francisco Veloso vai a partir de Agosto abraçar um novo desafio como director da escola de negócios do Imperial College, deixando a liderança da Católica Lisbon School of Busines & Economics, que exercia desde 2012. Na Católica foi também professor de Inovação e Empreendedorismo, tema que é a sua paixão académica. Entrou na Universidade Católica como professor associado em 2001 e foi subindo os degraus da hierarquia académica. Percurso que fez também na Universidade Carnegie Mellon, na Pensilvânia (EUA), onde exerceu o cargo de "full professor" do departamento de Engenharia até 2013. Francisco Veloso licenciou-se em Engenharia Física no Instituto Superior Técnico em 1992, fez um mestrado em Gestão no ISEG e o doutoramento no prestigiado MIT. O seu trabalho de investigação académico foi distinguido com vários prémios. Ser "dean" não é só trabalho. Francisco Veloso gosta de conviver com os alunos, sendo presença frequente nos jantares de "alumni" da universidade. É casado e tem três filhos.

Respostas rápidas

Instituto Superior Técnico

É a minha "alma mater" onde eu tenho ainda muitas ligações e uma escola excelente que muito tem feito pela ciência e pela inovação em Portugal e no mundo.

Bicicleta

BTT em particular, um dos meus hóbis favorito e algo a que dedico uma parte do meu tempo fora das minhas responsabilidades profissionais e de que muito gosto.

Açores

Um dos destinos de férias que acaba por se tornar favorito de uma forma quase orgânica. Desenvolvi uma afinidade e apreciação dos Açores como destino de férias e relaxamento para toda a família, porque é um contexto que tem agradado a toda a família de muitas idades diferentes. Gosto muito das ilhas, das paisagens, das pessoas e do ambiente.

Silicon Valley

Continua a ser a Meca do empreendedorismo, da inovação e da tecnologia. Foi também, durante muito tempo, um assunto que estudei com muita precisão para aprender muito sobre algo que é fundamental para estes processos de empreendedorismo, que são os "spin-off". Esta ideia de que de boas empresas saem outras boas empresas com enorme resultado económico. Foi assim que Silicon Valley se fez.

Donald Trump

Uma grande preocupação para a América, para as universidades americanas, já tenho sentido isso, mas também um pouco por todo o mundo, porque é uma pessoa imprevisível com uma perspectiva sobre a vida e as pessoas da qual eu não partilho.

Mário Centeno

Conheci-o pela primeira quando nos cruzámos em Boston. Ele estava a acabar o seu doutoramento em Harvard, eu estava a começar o meu no MIT. É uma pessoa por quem tenho muito respeito técnico e científico e que está a procurar fazer navegar as nossas finanças num momento de equilíbrio difícil, do ponto de vista daquilo que é o arranjo parlamentar de apoio ao Governo.

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