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Esquerda trava cartas de António Domingues e SMS de Mário Centeno

PS, PCP e Bloco de Esquerda decidiram que as cartas de António Domingues e os e-mails e SMS que este trocou com Mário Centeno estão fora do âmbito da comissão de inquérito à CGD. O CDS diz que isso é “de uma gravidade extrema”.

Miguel Baltazar/Negócios
14 de Fevereiro de 2017 às 23:08
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Havia muita expectativa sobre a reunião desta terça-feira dos coordenadores da comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos. Expectativa que foi alimentada pelo próprio PS, que na semana passada garantia que a correspondência enviada por António Domingues ilibava Mário Centeno, e que isso seria provado ontem – o que dava a entender que a documentação seria tornada pública. Mas não foi isso que aconteceu. Pelo contrário: PS, PCP e Bloco de Esquerda defenderam que essa correspondência não se enquadra no objecto da comissão de inquérito.

Mas não só. Os três partidos da esquerda parlamentar também chumbaram os requerimentos potestativos apresentados pelo CDS e pelo PSD a exigir a consulta dos e-mails e SMS trocados entre Mário Centeno e António Domingues, o ex-presidente da CGD. Precisamente porque são coisas que "não fazem claramente parte do objecto da comissão de inquérito", afirmou o deputado João Paulo Correia, no final da reunião.

Ficou mais uma vez provado que o PSDe CDS actuamd e forma irresponsávele doentia numa cruzada contra o ministro das Finanças. João Paulo Correia
Deputado do PS

A reunião foi tudo menos pacífica e acabou por ser a esquerda a fazer valer a sua maioria. No final do encontro, que durou cerca de uma hora e meia, o coordenador do PSD na comissão, Hugo Soares, saiu visivelmente irritado. E o deputado João Almeida, coordenador do CDS, ficou incrédulo, dizendo que nunca tinha visto um comportamento deste tipo numa comissão de inquérito.

"O que se passou hoje [ontem] é de uma gravidade extrema", reagiu João Almeida. O que PS, PCP e BE dizem, de acordo com o deputado centrista, é que "comissões de inquérito podem existir, desde que os partidos que participam nelas não perguntem nada". "O que nos querem impor é uma ficção de democracia, uma ficção de comissão de inquérito, em que formalmente continua tudo a funcionar, formalmente continua a ser uma comissão de inquérito, mas na prática nós não podemos perguntar nada", criticou.

O que nos querem impor é uma ficção de democracia, uma ficção de comissãode inquérito, em que formalmente continua tudo a funcionar, [...] mas na prática nós não podemos perguntar nada. João Almeida
Deputado do CDS
João Paulo Correia, do PS, lembrou que o "objecto próprio" da comissão de inquérito é "apurar por que razão a CGD precisa de nova capitalização por parte do Estado". E criticou a actuação de PSD e CDS, cujos requerimentos visam apenas fragilizar Mário Centeno. "Ficou mais uma vez provado que o PSD e CDS actuam de forma irresponsável e doentia numa cruzada contra o ministro das Finanças", que é motivada pelos "resultados das contas públicas", afirmou.

O socialista reiterou que a documentação continua a provar que Mário Centeno diz a verdade. "Em momento algum o senhor ministro das Finanças se compromete com António Domingues quanto à dispensa da entrega da declaração de rendimentos". O problema "é que esta documentação não faz parte do objecto da comissão". E por isso não será distribuída aos 17 deputados da comissão de inquérito.

O jornal Eco divulgou alguma da documentação enviada por António Domingues, a pedido do CDS. O ex-presidente da CGD diz que viu "com grande surpresa" as dúvidas quanto à necessidade de os seus administradores entregarem a declaração de rendimentos no Tribunal Constitucional. Essa "foi uma das condições acordadas para aceitar o desafio de liderar a gestão da CGD e do mandato para convidar os restantes membros dos órgãos sociais, como de resto o Ministério das Finanças confirmou", escreveu Domingues nessa carta.

Esta segunda-feira, numa conferência de imprensa, Mário Centeno reafirmou que o único acordo que fez com Domingues foi para retirar a administração da CGD do Estatuto dos Gestores Públicos, e não a dispensa da entrega das referidas declarações. Mas admitiu que Domingues possa ter pensado que sim, devido a "um erro de percepção mútuo".

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Duas versões para a mesma história

É uma história cheia de aspectos pouco claros que se vem arrastando há vários meses. As versões do Governo e da oposição são antagónicas em diversos aspectos.

Governo

1. A única coisa com que Mário Centeno se comprometeu com António Domingues foi com a saída dos gestores da Caixa Geral de Depósitos do âmbito do Estatuto do Gestor Público. "Acordo do Governo para alterar o Estatuto dos Gestores Públicos, claro que houve; acordo do Governo para eliminar aquele dever [de entrega das declarações], não houve", explicou o ministro, na conferência de imprensa desta segunda-feira.

2. Foi por um "erro de percepção mútuo" que António Domingues disse ter tido o compromisso do Governo de que os gestores estariam dispensados de apresentar as declarações. "Admito que possa não ter afastado do entendimento do Dr. António Domingues, por um eventual erro de percepção mútuo, a ideia de que o acordo poderia cobrir de alguma forma a eliminação do dever de [entrega da] declaração", declarou o ministro.

3. Mário Centeno não mentiu quando disse na comissão parlamentar de inquérito à CGD que "inexistiam" comunicações com António Domingues. Apenas houve cartas e emails de Domingues dirigidos ao ministro aos quais este não respondeu.

4. Houve conversas informais com o ex-presidente do banco público sobre a questão das declarações, mas sem quaisquer compromissos. E essas comunicações são "privadas" e assim devem manter-se.

Oposição

1. Os partidos da oposição acusam Mário Centeno de ter mentido mais do que uma vez no Parlamento. Mentiu ao afirmar que nunca garantiu que a equipa de António Domingues não teria de apresentar declarações de rendimentos ao Tribunal Constitucional. A correspondência do ex-presidente do banco público dirigida ao ministro demonstram que este havia recebido essa garantia da parte do ministro, acusa o PSD.

2. Essa mentira é evidente num comunicado do Ministério das Finanças em que este assume que não foi por lapso que os gestores ficaram de fora das obrigações declarativas previstas no Estatuto do Gestor Público, em particular a entrega das declarações de rendimentos ao Tribunal Constitucional.

3. O ministro mentiu também quando disse na Comissão Parlamentar de Inquérito que não existia correspondência com António Domingues. Uma carta deste dirigida ao ministro prova que o ministro mentiu, alegam.

4. Para provar o seu ponto, primeiro o CDS e depois o PSD apresentaram requerimentos para aceder aos SMS trocados entre Domingues e Centeno. Os partidos que apoiam o Governo travaram essa pretensão o que é mais uma demonstração de que estão a esconder as provas da mentira de Centeno.

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