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Pós-troika: empresários apoiam o “cinto” da disciplina orçamental
A folga que existir deve ser usada para aliviar carga fiscal e é necessário um entendimento político alargado para garantir a descida dos custos de financiamento.
O Estado português não deve despir o “cinto” controlador da despesa pública depois de terminar o programa de assistência financeira para evitar que se repitam os erros do passado, mas deverá usar a folga que eventualmente vier a ser gerada pelos primeiros sinais de retoma para corrigir o peso dos impostos, defenderam os empresários ouvidos pelo Negócios sobre as perspectivas pós-troika.
“A economia está a dar sinais de recuperação e não pode levar com mais austeridade. Espero que o cinto comece a ser aliviada ligeiramente porque a economia tem sofrido muitíssimo. Mas tenho quase a certeza que se vai manter a disciplina orçamental [no pós-troika] e ela é necessária. Andamos décadas com maus hábitos e não são dois ou três anos de corda apertada que levem isto ao sítio. O País que conhecíamos antes nunca mais o vamos ter. Vamos passar do doente que toma injecções para o que toma comprimidos. Mas vamos ter de manter o tratamento”, apontou Frederico Albergaria, presidente da Cobermaster.
O fabricante de gradil e de componentes metálicas para a indústria e construção, que exporta 95% da produção, entende que Portugal “não está capacitado para sair à irlandesa, o que faria mais sentido era com um programa cautelar porque, embora os juros estejam a baixar, nada garante que os mercados continuem a comportar-se da mesma forma”. “Mas será que temos uma classe política capaz de negociar o cautelar de forma a não penalizar mais a economia portuguesa?”, questionou o empresário de Oliveira de Azeméis.
“Muitas vezes, em termos políticos, há o problema de não fazermos planos a médio e longo prazo. O caminho é continuar a fazer reformas, mas libertando um pouco esta pressão em termos de impostos. Mas acho que é preciso disciplina, no País como em qualquer empresa e família”, concordou Paulo Silva, director-geral da Portlane, uma tecnológica de Braga especializada na instalação e manutenção de sistemas críticos de cobrança de tráfego, que tem a Ascendi na lista de clientes.
Libertação... “psicológica”
Por “obrigação dos credores e até por uma razão de boa prática”, também o administrador da Firmo entende que o Portugal tem que “manter o Orçamento controlado nas despesas, sob escrutínio muito grande e controlo apertado”. Não tem “dúvidas nenhumas de que o controlo vai continuar para além de Maio” e “não vale a pena pensar que será um momento de libertação” porque continuaremos “sob escrutínio dos credores”.
Rui Carvalho, o líder da fabricante do clássico “caderno azul”, entre outros, sublinhou ainda que “o efeito [da saída da troika] será mais psicológico do que outra coisa”, embora possa acelerar a recuperação, que “até já tem ocorrido um pouco”, do consumo privado. “Mas em termos de animação da economia esse movimento será moderado, o grande ‘driver’ terá que continuar a ser a exportação”, alertou.
O CEO da Fermentum, uma ‘spin-off’ da Universidade do Minho que começou a vender em Outubro a cerveja artesanal com a marca Letra que produz em Vila Verde, sustentou igualmente que “a saída da troika vai ser positiva do ponto de vista psicológico para as pessoas, sabermos que temos os nossos credores controlados e que podemos construir o nosso caminho sozinhos, com mais independência”.
“Fez-se muita asneira nas últimas décadas e estas políticas recentes, que foram ligeiramente exageradas, vão contribuir para construirmos um País melhor. Há coisas que continuam mal, devia distribuir-se melhor os esforços, mas acredito que estamos no bom caminho. Embora não tenha filiação partidária, não havia outra saída, a não ser esta remodelação económica que se fez em Portugal, para pagar o que devemos”, concluiu Francisco Pereira.
O Negócios falou também com líderes das confederações e associações empresariais, que mostraram principal preocupação com o crédito à economia.