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O peso histórico do crucifixo

No Atelier Móveis d’Arte Canhoto, cria-se a partir do precioso património indo-português de mobiliário, gerando objectos únicos que atacam o esquecimento da história.

22 de Abril de 2017 às 09:00
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Há uma forte possibilidade de a família Canhoto ser um dos maiores bastiões de guarda do património português. O trabalho dos artesãos Canhoto, fixados há algumas décadas na Azueira, em Mafra, assenta em várias camadas criativas e históricas que levam sempre à construção de peças únicas, um elemento fundamental para o mercado.

Na base de tudo está o domínio superior das artes da marcenaria, do conhecimento da madeira e da sua moldagem ao objecto. Mas esta é apenas a camada de base, se a expressão puder ser empregada. Provavelmente, a camada mais importante é a que se segue, a que materializa o cruzamento entre a arte da marcenaria e a recuperação activa do património. De facto, onde os Canhoto se fixaram foi na singular e hoje quase perdida arte indo-portuguesa de mobiliário que, durante séculos, deu origem a contadores e outras peças avidamente procuradas em todo o mundo, fixando-se como centro de salas de honra, de igrejas de paços e de outros espaços privados e públicos.

Assim, o que os artesãos da Azueira fazem, tendo escassos pares no mundo, é manter vivo um património nosso que é único, não só pela recuperação de peças de época, mas também pela criação de outras, segundo as leis e os modelos da arte. O que isto gera é um nicho criativo de excepção, que caminha a par do ressurgimento do mobiliário português de design, mas bifurca no caminho em que prossegue uma senda histórica, enquanto os seus pares designers seguem pelo trilho da inovação. Não se trata de medir o valor de cada opção, trata-se de entender que são caminhos diferentes, ambos valiosos.


O que os Canhoto procuram é encontrar o maior número de peças da arte do mobiliário indo-português e recriá-las.


Mas há uma terceira camada no trabalho dos Canhoto que deve sempre ser apontada. De facto, os artesãos não se limitam a conhecer apenas a superfície da História e da história da sua arte, o que os faria concentrarem-se apenas nas peças mais populares, como são os contadores, os cofres ou as caixas de segredo. O que os Canhoto procuram é encontrar o maior número de peças da arte do mobiliário indo-português e recriá-las, como também partir das referências e inovar.

É neste último campo que surge agora esta peça de excepção, um crucifixo de secretária, que teve como destino a Diocese de Mafra. Os Canhoto partiram da matéria-prima de eleição da arte, teca, pau-santo, buxo e casquinha, para moldar e embutir os clássicos losangos estilizados, que se fundem com círculos e resplendor.

O que resultou do trabalho foi antes de mais um objecto fascinante, já que o trabalho da madeira é tão exímio que capta imediatamente o carinho de qualquer observador, mesmo que este não tenha qualquer convicção religiosa. Mas, neste objecto simples e reduzido, está também todo o peso da história da arte e da cultura portuguesa, que, assim, mais uma vez, sobrevive ao tempo.


Nota ao leitor: Os bens culturais, também classificados como bens de paixão, deixaram de ser um investimento de elite, e a designação inclui hoje uma panóplia gigantesca de temas, que vão dos mais tradicionais, como a arte ou os automóveis clássicos, a outros totalmente contemporâneos, como são os têxteis, o mobiliário de design ou a moda. Ao mesmo tempo, os bens culturais são activos acessíveis e disputados em mercados globais extremamente competitivos. Semanalmente, o Negócios irá revelar algumas das histórias fascinantes relacionadas com estes mercados, partilhando assim, de forma independente, a informação mais preciosa. 


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