Notícia
Gaeiras: Vamos dar atenção à casta Vital
É com gosto que se anuncia que o famoso Gaeiras está de volta. Vamos a ver se outros produtores decidem plantar mais cepas Vital. Seria muito bom.
O Casa das Gaeiras Branco é feito pelo enólogo António Ventura.
Vinho desafiante sempre que se prova. Custa €8,5.
Gabámo-nos com galhardia da nossa riqueza e diversidade de castas face ao que se passa no resto do mundo, que, regra geral, enche a boca com meia dúzia de variedades (coitados). Em tese, esta diversidade torna-nos ricos e diferentes nos mercados externos. Digo em tese porque, na realidade, 90% dos consumidores externos só consegue memorizar três ou quatro castas e acha que o mundo do vinho começou na Austrália ou na Argentina. Pelo que a percentagem daqueles enófilos cultos e interessados em coisas diferentes (as nossas e as de outros no Velho Mundo) é muito baixa. Ainda assim, há gente que entende que, mais cedo ou mais tarde, os vinhos portugueses vão dar que falar. Vão ser primeiras opções de compra e não soluções por causa do preço baixo. Jorge Monteiro, da ViniPortugal, dizia-nos, há dias, que quase todo o trabalho feito neste momento "é para ter sucesso no futuro". Admitia alguma frustração por não ver os resultados no imediato, mas está "absolutamente convencido que um belo dia vamos dar um salto tremendo".
É por estas e por outras que acho preocupante o estado a que chegou a casta branca Vital. Outrora importante da região de Lisboa e Tejo, foi votada ao abandono, de tal forma que os dedos de uma mão chegam para contar os grandes vinhos feitos com as suas uvas. E, no entanto, quando bem trabalhada, a casta produz vinhos que encantam e desenjoam face receitas padronizadas.
Em certo sentido, até se percebe o desleixo com a casta, visto que a mesma é caprichosa: quando apanha muito sol, as uvas ficam em passa; quando chove, a podridão ataca em força. Por outro lado, como é muito vigorosa, o agricultor tem de destruir parte dos cachos (para que os sobreviventes fiquem mais ricos) e tem de desfolhar a planta para evitar ataques de podridão. Ou seja, é uma casta difícil e dispendiosa. Nalgumas regiões vitícolas, e para castas manhosas como estas, os agricultores dizem que elas são umas p.... enfim, umas meretrizes.
Sucede que quando bebemos, por exemplo, este Casa das Gaeiras Reserva 2013 Vinhas Velhas, regalamo-nos de imediato porque estamos perante um branco diferente, mineral, salino e untuoso, com personalidade, aptidão gastronómica e história. E é isso que interessa. Ainda por cima, por um preço ridículo, tendo em conta que o vinho é feito a partir de vinhas velhas, donde, pouco produtivas. Cerca de 4 hectares dão 3.300 garrafas.
Noutros tempos, beber um Gaeiras branco - feito em Óbidos - era coisa para dias de festa, tal era a fama dos vinhos. O pequeno château que é a Casa das Gaeiras foi fundado em 1790 por António da Silva Pinheiro, médico do reino e administrador do real Hospital das Caldas. Passaram-se os tempos e, nos anos 40 do século passado, José Ferreira Pinto de Basto entra para a família por via do casamento. Estudante de enologia em França, rodeou-se depois em Portugal de nomes grandes ligados ao mundo vitícola. Os vinhos passaram a ser falados cá dentro e lá fora. Por seu falecimento, a propriedade passou para Frederico Pinto Basto Lupi, tendo este decidido, há alguns anos, fazer uma parceria com o Grupo Parras (Quinta do Gradil e outros vinhos), de forma a recuperar uma marca com pergaminhos.
Foi uma bela ideia porque permite agora oferecer aos consumidores de bom gosto um vinho alternativo e - acima de tudo - chamar a atenção para o valor da casta. Agora só falta mesmo ouvirmos notícias sobre novas plantações de Vital.