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Fotógrafos sem mercado

Todos os dias surgem valores de destaque na fotografia documental portuguesa, mas o mercado mantém a sua atitude obstinada de não os incorporar nos seus portefólios.

Daniel Rodrigues
10 de Junho de 2017 às 09:00
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Há um caso muito curioso no mercado nacional da fotografia. Ao mesmo tempo que alguns dos mais recentes autores com produção de destaque trabalham na área da fotografia documental, ou seja, fotografam pedaços da realidade, os agentes da oferta, essencialmente as galerias e as leiloeiras, continuam fechadas na criação que se limita à fotografia artística, em contraciclo com o mercado global. Os casos mais ilustrativos deste conflito, porque os fotógrafos são muitos novos, são os de Daniel Rodrigues e de Bruno Aleixo, ou Baleixo, como o próprio assina.

Depois de uma formação clássica, e da passagem por um jornal de terreno, o Correio da Manhã, Daniel Rodrigues, www.danielrodriguesphoto.com, estabeleceu-se constantemente na cena internacional, tendo obtido de modo constante vários prémios de entidades de renome, como a World Press Photo, a IbericoAmerican Photographer of the Year - POY Latam ou a Estação Imagem, ao mesmo tempo que fotografa para órgãos de informação de topo, como o The New York Times.

A filiação cultural e estética de Rodrigues é o jornalismo de reportagem puro, em que o fotógrafo procura a paragem e as pessoas que pertencem a esta para contar uma história que aconteceu, num momento, ou numa extensão de tempo prolongada. O território de Bruno Aleixo, www.facebook.com /pg/baleixophotography, é ainda mais curioso, porque nunca teve grande expressão fotográfica no nosso país.

Baleixo trabalha no nicho do desporto, mais especificamente no subnicho da fotografia documental de surf, e um portefólio seu das ondas da Nazaré foi agora publicado na edição de Maio da revista inglesa Travelogue, com o sugestivo título de "Water Mountains". Ou seja, tanto o trabalho de Rodrigues como o de Aleixo possuem todas as regras determinadas pelo mercado global da fotografia documental que, como tem sido referido neste espaço, é um sector quente em termos de valorização.

Os dois fotógrafos captam histórias singulares, e o seu olhar é interessante, do ponto de vista documental e estético. No entanto, vamos à procura de Rodrigues e de Aleixo no mercado nacional, e nem sequer estão representados numa galeria, quanto mais terem uma cotação. Há, obviamente, várias razões para que tal aconteça.

A principal é o preconceito cultural dos nossos galeristas, que determina decisivamente a sua política comercial. Ou seja, para eles, a fotografia é ainda uma arte menor, e a fotografia documental não é sequer arte. A segunda razão principal, defendida pelos peritos e também pelos galeristas, é que o nosso mercado é ainda demasiado tradicional para se interessar por expressões fora do contexto normal, como é o caso da fotografia documental.

Mas, se a oferta não dá uma oportunidade à procura para se avaliar qual o estado do mercado, como é que pode fazer um juízo desta natureza? Deste modo, enquanto o mercado nacional continua a pedir tempo para testar o valor de cotação de artes menos tradicionais, aos investidores interessados, e existem bastantes - basta ver o valor de fotógrafos documentais portugueses clássicos, de Benoliel a Castello-Lopes -, resta apenas uma solução. Comprarem directamente aos fotógrafos, sem que possuam qualquer ferramenta de avaliação de valor.


Nota ao leitor: Os bens culturais, também classificados como bens de paixão, deixaram de ser um investimento de elite, e a designação inclui hoje uma panóplia gigantesca de temas, que vão dos mais tradicionais, como a arte ou os automóveis clássicos, a outros totalmente contemporâneos, como são os têxteis, o mobiliário de design ou a moda. Ao mesmo tempo, os bens culturais são activos acessíveis e disputados em mercados globais extremamente competitivos. Semanalmente, o Negócios irá revelar algumas das histórias fascinantes relacionadas com estes mercados, partilhando assim, de forma independente, a informação mais preciosa.


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