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Fernando Santos: O engenheiro do título

Fernando Santos trouxe a quase mais improvável das vitórias para Portugal, servindo-a como o prato de glória que os portugueses há muito ansiavam. Não será esquecido.

Pedro Ferreira
15 de Julho de 2016 às 13:00
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Agora, vencido o Euro de França, uma missão impossível, Fernando Santos parece irredutível como seleccionador nacional, numa época em que se vai prevendo uma alteração geracional dos jogadores que poderão estar no Mundial de 2018.

Leonardo da Vinci dizia que: "O pé humano é uma maravilha da engenharia e um trabalho de arte." São os pés que transformam o futebol numa engenharia perfeita e numa arte abstracta ao serviço das emoções. Talvez por isso, para Fernando Santos, que nunca se livrou da memória de ter sido engenheiro, ganhar seja algo diferente: mais do que arte, é um exercício de contenção, de táctica e resistência defensiva. Esperando que, num momento em que a arte individual se sobrepõe ao colectivo, Ronaldo, Nani ou Éder resolvessem o dilema. Fernando Santos venceu o Euro. Não é algo fácil ou normal. Trouxe a quase mais improvável das vitórias para Portugal, servindo-a como o prato de glória que os portugueses há muito ansiavam. Não será esquecido.

No fundo, o seu pragmatismo venceu. Ele que dizia: "Entre um pássaro na mão ou dois a voar, prefiro ter um na mão. Não sou maluco." Ao vencer o Euro, depois de um início titubeante e de vitórias onde a contenção defensiva esteve sempre um passo à frente da explosão criativa em que os nossos jogadores são mestres, Fernando Santos sempre pensou no resultado. Ou seja, no que, em alguns casos, fica na História. Nela não cabem os derrotados. Ou alguns deles, porque todos nos recordamos da Holanda de Cruyff, do Brasil de Zico e Sócrates, do Portugal de Eusébio. Os jogos da selecção portuguesa reacenderam o eterno debate entre vencer e a forma de o fazer. Entre o resultado e a classe. E Fernando Santos foi sempre, com a sua estratégia de contenção defensiva à espera que Ronaldo resolvesse, um defensor claro do resultado face à beleza estética do futebol. Nada que espante quem seguiu a sua carreira. Mesmo na Selecção, quando substituiu Paulo Bento e conseguiu, com resultados tangenciais, levar Portugal a França. Aí também os resultados sempre se sobrepuseram às exibições. A FPF, ao escolhê-lo, optou pela experiência, não iludindo aquilo que era um problema essencial no início: Santos estava castigado pela FIFA e não podia estar no banco. Mas, do lado das coisas positivas, estava a sua trajectória: treinara Benfica, Sporting e FC Porto (onde foi o "engenheiro do penta"), além do PAOK e do Panathinaikos. E da selecção grega. Um currículo cheio de resultados.

Fernando Manuel Fernandes da Costa Santos nasceu em Lisboa a 10 de Outubro de 1954. Foi jogador no Benfica, no Marítimo e no Estoril. Enquanto isso, estudava: licenciou-se em Engenharia Electrónica e Telecomunicações, com 23 anos. Ou seja, não fez do futebol o seu centro gravitacional. Mas este atraiu-o: começou por treinar o Estoril Praia, para onde fora com Jimmy Hagan, que o apreciava como jogador no Benfica, em 1986, seguindo-se um período no Estrela da Amadora, onde conseguiu boas classificações. Passou a estar no radar de clubes com outras ambições. Foi assim que, em 1998, vai treinar o FC Porto, onde, numa época em que os dragões dominavam o futebol, havia segurança para ganhar: foi campeão, claro. Ou melhor, pentacampeão. Um feito inédito. Ali ficou até 2001, partindo nessa altura para Atenas para treinar o AEK, começando aí a sua aventura grega. Treinou a seguir o Panathinaikos. Regressou a Portugal em 2003 para dirigir o plantel do Sporting, mas ficou ali apenas uma época, regressando ao AEK (e aí conseguindo colocar a equipa na Liga dos Campeões).

Acabou por voltar a Lisboa, desta vez para ser o treinador do Benfica, após a saída da Luz de Ronald Koeman. Mas não teve sorte: ficou em terceiro no campeonato e foi substituído por José Antonio Camacho. O avião volta a rumar no mesmo sentido: Grécia. E aí vai treinar o PAOK, levando-o à Liga dos Campeões. Em 2010, é convidado para treinar a selecção grega. Com ele, os gregos alcançam os quartos-de-final no Euro 2012. Depois vão ao Mundial de 2014, onde chegam aos oitavos-de-final, sendo derrotados nas penalidades pela Costa Rica. Fernando Santos é expulso e condenado pela FIFA a oito jogos de suspensão. O avião ruma novamente a Lisboa: em Setembro de 2014, é apresentado como novo seleccionador de Portugal, substituindo Paulo Bento. Missão: a qualificação para o Europeu de 2016. Veio e venceu.

Agora, vencido o Euro de França, uma missão impossível, Fernando Santos parece irredutível como seleccionador nacional, numa época em que se vai prevendo uma alteração geracional dos jogadores que poderão estar no Mundial de 2018. Para o qual ainda é preciso apurarmo-nos. Adepto do 4-4-2 e das posições defensivas, Santos não irá alterar a sua perspectiva. Mas, daqui a dois anos, Ronaldo (que já alterou a sua forma de jogar) ou Quaresma estarão a chegar ao fim das suas carreiras. E alguns outros jogadores nucleares da sua estratégia estarão também a ver os seus últimos dias como jogadores. Mas despontam novos valores que poderão tornar a selecção portuguesa mais dinâmica e atrevida, até porque os principais clubes portugueses começaram a voltar a olhar para as suas academias. De onde estão a sair novamente bons valores para quase todas as zonas do campo (os pontas-de-lança continuam a ser uma raridade, é verdade). Não faltarão alternativas a Fernando Santos para outra missão de "engenharia futebolística": levar Portugal ao próximo Mundial e preservar a herança desta vitória histórica. À qual, a sua figura e fé ficarão sempre ligados.

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