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Tratado global sobre plásticos volta a ser discutido, com vários interesses em jogo

As negociações para redigir o primeiro tratado mundial sobre plásticos acontecem esta semana no Canadá. O objetivo é criar um documento que responda à crescente crise da poluição do plástico, mas existem vários interesses por conjugar.

23 de Abril de 2024 às 11:42
A Presidência promulgou o diploma que permitirá dar um novo rumo a garrafas de plástico e latas de metal.
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Esta terça-feira, líderes globais, cientistas, organizações sem fins lucrativos e lobistas reúnem-se no Canadá para redigir aquele que será o primeiro tratado mundial sobre plásticos – pelo menos, se conseguirem chegar a um consenso. O objetivo é que o tratado consiga responder à crescente crise da poluição do plástico e seja finalizado até ao final de 2024, com as últimas negociações a realizarem-se na Coreia do Sul; mas existem vários interesses que precisam de ser conciliados.

Em primeiro lugar, existe uma divisão sobre o quão ambicioso o tratado deve ser. Este documento pode tornar-se o acordo mais importante para a proteção ambiental desde o Acordo de Paris de 2015, onde 196 países se comprometeram a evitar um aquecimento global superior a 1,5ºC. No entanto, existem bloqueios na extensão do mesmo.

Vários países produtores de plástico e petroquímicos, onde se incluem o Arábia Saudita, o Irão e a China, opõem-se a restrições na fase de produção de plástico, focando só as medidas de combate na sua comercialização. Em negociações anteriores, a coligação destes países – conhecidos como os "Like-Minded Countries" – bloquearam a presença de linguagem que referisse limites de produção ou divulgação de produtos químicos presentes no plástico.

A acompanhar esta visão está o grupo dos Parceiros Globais para a Circularidade dos Plásticos (Global Partners for Plastics Circularity), composto por representantes de produtores de petroquímicos, que especulam que limites na produção iriam levar a um aumento de preços generalizados para o consumidor.

Para o grupo, o objetivo deveria ser encorajar a reciclagem e a reutilização de plásticos, ao mesmo tempo que se adota a combustão dos mesmos como uma fonte de combustível. Na perspetiva do coletivo de empresas, a transparência sobre os químicos usados na produção deveria ser deixada ao critério de cada companhia, e não ser obrigatória.

A contrastar com esta visão encontram-se as organizações sem fins lucrativos e uma coligação de países denominada "High-Ambition Coalition", que inclui os EUA, Japão e os Emirados Árabes Unidos. O objetivo deste coletivo de países é diminuir o uso de plástico até 2040, e para chegar a esse marco pretendem impor regras que "restrinjam e reduzam a produção e consumo de polímeros primários para níveis sustentáveis", cita a Reuters, a descontinuação progressiva de plásticos de uso único e o fim do uso de certos químicos nocivos na produção do plástico.

Várias empresas que comercializam plástico, como é o caso da PepsiCo e da Walmart, contrariam a tendência geral registada na indústria de produção de plástico e de produtos petroquímicos, e apoiam um tratado que tenham em conta "restrições e descontinuações, políticas de reutilização, requisitos no design de produtos, responsabilidade dos produtores e gestão de resíduos", de acordo com uma nota conjunta que lançaram antes das negociações no Canadá.

Estes objetivos contraditórios refletiram-se no rascunho do tratado que saiu das negociações em Nairobi, no Quénia. De um acordo inicial de 30 páginas, surgiu um documento com 70 – foram cerca de 40 páginas utilizadas para demonstrar objeções de vários países contra medidas que impusessem limites de produção e descontinuações progressivas de produtos.

"Este tratado representa uma oportunidade monumental num tempo de urgência", afirma o cientista dos oceanos, Neil Nathan, da Universidade da Califórnia, à AFP. "Medidas específicas e vinculativas são extremamente necessárias para evitar um acordo fraco que falhe em responder as necessidades do momento". 

As negociações desta semana têm agora o desafio de encontrar terreno comum entre os vários agentes presentes, naquelas que vão ser as reuniões sobre o tópico mais participadas de sempre – as negociações anteriores foram realizadas no Uruguai, França e Quénia.

A produção de plásticos liberta gases com efeitos de estufa para a atmosfera, que acabam por impulsionar o aquecimento global. Se nada for feito, e de acordo com um estudo de um laboratório dos EUA, a indústria do plástico pode ser responsável por 20% das emissões de CO2 de todo o planeta, em 2050 – neste momento, produzem cerca de 5%.

Nos últimos 20 anos, a produção de plástico mais do que duplicou para os 460 milhões de toneladas e apenas 9% são reciclados, de acordo com a OCDE.

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