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COP 29: Só faz falta quem lá está?

O primeiro-ministro português, Luís Montenegro, ficou em Lisboa por causa do Orçamento do Estado, enquanto a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, está a acompanhar as audições dos novos comissários. Lula da Silva faltou por causa de um "acidente doméstico".

13 de Novembro de 2024 às 10:00
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A conferência anual das Nações Unidas para o Clima (COP 29) está a ser marcada pela ausência de alguns dos principais líderes mundiais que, ano após ano, costumam marcar presença. Portugal é um dos muitos países que este ano não se fará representar por um representante de alto nível, já que nem o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, nem o primeiro-ministro, Luís Montenegro, estarão no evento.

De acordo com a organização estão inscritos 72 mil participantes de 196 países para assistir à conferência anual da ONU sobre o Clima que decorre até 22 de novembro em Baku, entre eles 80 presidentes, vice-presidentes e primeiros-ministros.

Na abertura da Cimeira de líderes da COP, esta terça-feira, o secretário-geral da ONU, António Guterres, mais uma vez não poupou nas palavras de alarme e subiu ao palco para dizer aos líderes presentes que estamos a assistir a uma "masterclasse em destruição climática". 

Já Presidente do país anfitrão, Ilham Aliyev, disse que o petróleo e o gás são "um presente de Deus", tal como o sol, o vento e os minerais. "Os países que têm petróleo e gás não podem ser culpados por isso e nem por trazerem esses combustíveis para o mercado, porque o mundo precisa deles". Disse ainda que não é justo dizer que o Azerbaijão é um "petro Estado", já que produz menos de 1% do petróleo e gás no mundo.

Aos gritos e com um ar grave, o Presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, também discursou no primeiro dia da cimeira de líderes e aproveitou os holofotes da COP para condenar a ofensiva israelita no Médio Oriente e pedir ao recém eleito presidente dos EUA, Donald Trump, para acabar com a guerra na Ucrânia. Por seu lado, o novo primeiro-ministro do Reino Unido anunciou a nova meta climática do país: reduzir as emissões de gases com efeito de estufa em 81% até 2035.

Com um ar visivelmente cansado e abatido, o presidente do Governo espanhol, Pedro Sanchéz, falou dos impactos climáticos na primeira pessoa: "Se não conquistarmos a sustentabilidade, todos cairemos e os primeiros a sofrer serão eles, a classe média e a classe trabalhadora, porque são eles que trabalham nas áreas mais ameaçadas e foi o que aconteceu em Espanha, especificamente em Valência".

Na sala do plenário, um após outro, os líderes de vários países das mais variadas geografias mundiais (na sua esmagadoria maioria homens), usam as suas vozes e os seus três minutos no palco da COP para mostrar serviço, deixar apelos e partilhar angústias.

Na manhã de quarta-feira (segundo dia de cimeira de líderes e terceiro de cop), o primeiro-ministro do Paquistão, Muhammad Shehbaz Sharif, garantiu que "está em curso uma revolução energética no país", com ambição de chegar a 60% de renováveis até ao final da década.

O primeiro-Ministro de São Tomé e Príncipe, Patrice Trovoada, sublinhou o acordo com Portugal para transformar a dívida do país em projetos de apoios à descarbonização, enquanto lembrou que o pequeno país africano é um dos que menos polui, mas também um dos que mais sofre com o aquecimento global. 

E o primeiro-ministro da Albânia, Edi Rama, decidiu deixar de lado o discurso que tinha escrito para "falar com o coração" e dizer que, "cada vez mais, as COP são vazias e não fazem sentido, porque não conduzem à mudança necessária". 

O líderes das pequenas ilhas de Tonga e Grenada (pela "primeira e última vez numa COP", prometeu), localizadas no Pacífico e nas Caraíbas, respetivamente, lembraram que, ao mesmo tempo que o mundo discursa em Baku, os seus países continuam a ser devastados por eventos climáticos cada vez mais extremos. Espanha foi várias vezes mencionada como "a mais recente vítima" mundial das alterações climáticas.

Pelo contrário, os líderes das 13 economias mais poluentes do mundo - China, EUA, Índia e Indonésia, entre outros - nem sequer vão chegar a entrar num avião com destino ao Azerbeijão, ainda que os seus países sejam responsáveis por mais de 70% das emissões de gases poluentes em 2023. 


A primeira falta de comparência vai logo para os Estados Unidos: o democrata Joe Biden está de saída em janeiro e o republicano Donald Trump, que acaba de ser eleito para mais quatro anos na Casa Branca, não é conhecido por ser fã de debates sobre alterações climáticas. Aliás, uma das suas primeiras decisões deverá ser a retirada dos EUA do Acordo de Paris, de novo. Washington já tinha avisado que a delegação americana seria chefiada por John Podesta, atual conselheiro de Biden para a política climática internacional.

Também Lula da Silva cancelou a viagem a apenas escassos dias do arranque da COP, por causa de um "acidente doméstico", mesmo sendo o Brasil o próximo anfitrião da conferência, em 2025. 

Do lado da União Europeia, várias baixas de peso, a começar pela própria presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Ao Negócios, a diretora-geral de Energia da UE, Ditte Juul Jørgensen, explicou que a responsável teve de ficar em Bruxelas. "Ela queria muito vir, mas nesta semana o Parlamento Europeu está a realizar as audiências dos novos comissários que foram nomeados para os próximos cinco anos", justificou.

O presidente francês, Emmanuel Macron, e o chanceler alemão Olaf Scholz estarão ausentes. Do Reino Unido também não virá o rei Carlos III.

No caso de Portugal, esta será a primeira vez, em nove anos, que o país não será representado ao mais alto nível. Luís Montenegro não se deslocará ao Azerbaijão, deixando essa responsabilidade para a ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, e para os seus secretários de Estado.

"Pela primeira vez nos últimos nove anos, Portugal não se fará representar na COP pelo chefe do Governo. Considerando o papel de destaque que o país tem procurado desempenhar em matéria de negociações climáticas, esta decisão marca uma mudança na sua postura, especialmente sendo este um ano crítico em que o financiamento climático e a implementação de novos compromissos estão no centro das discussões", disse a Zero, em comunicado, apelando para que "se mantenha o nível de influência e o compromisso que Portugal tem procurado construir ao longo dos anos na arena climática internacional".

Aos jornalistas, Maria da Graça Carvalho admitiu que gostaria muito de ter a companhia do primeiro-ministro em Baku, "mas estamos no meio da negociação de um Orçamento do Estado, que necessita a atenção de todo o Governo".

"O primeiro-ministro precisa de estar em Portugal, para que todos tenhamos um bom orçamento no próximo ano. As questões das alterações climáticas são responsabilidade dos ministros do Ambiente e, nesta COP, os ministros das Finanças também são muito importantes. Estão cá vários ministros das Finanças. Não está o nosso, mas eu estive numa reunião com ele antes de vir para aqui para nos coordenarmos. Estando em coordenação entre Ambiente e Finanças, e sempre em contacto com o primeiro-ministro, estamos assegurados na nossa negociação", explicou Maria da Graça Carvalho.

E acrescentou ainda: "Esta também é uma COP que antecede uma outra que vai ter uma importância muito grande. Eu quero muito que haja bons resultados aqui, mas a próxima conferência é que será decisiva". 

Por seu lado, Jorge Moreira da Silva, nomeado pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, como diretor executivo da UNOPS - United Nations Office for Project Services, não concorda a 100% e defende que "esta COP não pode, de maneira nenhuma, ser desvalorizada em relação à sua ambição".

"Fui-me apercebendo. nos últimos dias, que tem havido uma certa desvalorização desta COP, dizendo que a do Brasil é que vai ser mesmo importante. É verdade porque é onde os países vão ter que acordar as novas metas, que nos coloquem na linha do limite de aumento da temperatura de  1,5°C em vez dos 2,6°C a 2,8°C atuais. Mas não será possível ter um bom acordo no Brasil sobre metas mais ambiciosas, se os meios financeiros que permitem essas metas não forem criados. Ora, neste momento há um gap de financiamento enorme no apoio à descarbonização e à ação climática nos países do Sul, explicou.

O responsável avisa mesmo que "não nos podemos dar ao luxo de ter um fracasso nesta COP".

"O secretário-geral das Nações Unidas tem dito que 1,5° não é uma meta ou um objetivo tecnocrático, é um limite físico. Nós só conseguiremos preservar o equilíbrio planetário se conseguirmos limitar o aumento da temperatura a 1,5°C. Neste momento já ultrapassamos 1,2°C. Mesmo com 1,5°C vamos ter quase 1.000 milhões de pessoas no mundo a viver em zonas desertificadas ou com stress hídrico. Imaginem o que acontecerá com 2,6°C a 2,8°C", frisou ainda, acrescentando que, "independentemente do número de participantes nesta COP, do número de chefes de Estado e de Governo, nada poderá servir de desculpa para não se atingir o resultado o mais ambicioso possível, até porque todos os países estão aqui representados".

Nos últimos anos, o número de participantes nas conferências climáticas da ONU tem crescido exponencialmente. No Dubai, a COP28 registou um recorde de 83.884 pessoas. Já para a COP29, foi estabelecido um limite (não cumprido) de aproximadamente 40.000 participantes, quantidade similar à COP26, em Glasgow, na Escócia. 


Bárbara Silva, na Cop 29, em Baku

(A jornalista viajou no âmbito da iniciativa Negócios Sustentabilidade 20|30)

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