Opinião
A bola é quadrada
Começou a rolar a bola, depois de um defeso novamente agitado. Como nos mostra o recente negócio estratosférico - e a roçar o obsceno - de Neymar Jr., o futebol movimenta cada vez mais milhões, num mundo globalizado de dinheiros sem sotaque, nem cor.
Por cá, fizemos as contas. O saldo entre compras e vendas de passes de jogadores é, até agora, de uns impressionantes 190 milhões de euros. Este é o valor líquido que os três maiores clubes portugueses encaixaram nesta janela de transferências, com destaque para o Benfica e, um pouco mais abaixo, o Futebol Clube do Porto. O fenómeno não é novo e é parte intrínseca do modelo de negócio que vai mantendo os clubes à tona: comprar barato jogadores incertos mas promissores e vendê-los mais caro, já com algum estatuto nas pernas.
O resultado disto é a constante saída de talento, que mal começa a brilhar é arrebanhado por um punhado de milhões de euros. A conjugação desta estratégia com o aumento agressivo do poder financeiro de clubes de outras ligas não pode ter outro efeito que não seja o aumento inexorável do fosso de competitividade desportiva.
Por outro lado, é difícil encontrar novas fontes de receita, numa liga que não centraliza os direitos televisivos e cujos principais responsáveis vivem para o jogo de hoje, sem pensar na competição de amanhã. Como se pode tornar mais atractivo um espectáculo quando os presidentes dos principais clubes só têm uma estratégia, ganhar ou destruir a credibilidade de toda a competição quando isso não acontece?
O fosso financeiro não se irá estreitar até ao momento em que cair o tabu da propriedade dos clubes, quando se tornar aceitável que um xeque árabe ou um magnata angolano fique dono de uma equipa. Não é uma escolha fácil de fazer, mas a questão irá colocar-se mais tarde ou mais cedo.
Até lá, já seria um bom começo a valorização colectiva de um desporto que apaixona milhões. E que os dirigentes percebessem que o desportivismo não é uma coisa para totós, é algo que credibiliza a indústria como um todo e a torna em algo que não temos vergonha de mostrar aos nossos filhos, os potenciais consumidores do produto futebol, no futuro.