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Devedores públicos

Se os bancos têm sido demasiado grandes para falirem, então é preciso um escrutínio público maior sobre as suas decisões de crédito. Se os devedores são tão grandes que mandam mais do que os bancos, então devem ser conhecidos.

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De assunto tabu passou a fracturante e de fracturante passou a consensual. A divulgação da lista dos grandes devedores dos bancos que receberam ajuda pública passou a reunir o apoio de todos os partidos com assento parlamentar. Após a discussão e votação ontem no Parlamento, o assunto baixou à comissão parlamentar onde se espera que os partidos aproximem posições. A ambição das propostas varia muito, desde a abordagem mais restritiva onde o acesso à informação se limita às situações passadas até à abordagem mais ambiciosa de divulgação regular da lista de maiores devedores incumpridores.

Este é um assunto melindroso e compreende-se a preocupação da banca. "O segredo bancário é a pedra angular entre banco e cliente", disse na semana passada o presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), Faria de Oliveira. É verdade que a confiança é essencial no negócio bancário, mas também é necessária confiança da sociedade e dos cidadãos no sector bancário e essa ficou muito abalada nos últimos anos. Os sucessivos casos de bancos socorridos com perdas irreparáveis para o erário público deixaram um rasto de injustiça e impunidade na sociedade portuguesa.

Nesse sentido, a divulgação da lista dos devedores que incumpriram pode contribuir para restaurar esse elo de confiança perdido. Por outro lado, promove maior transparência não só sobre as decisões de política de crédito das instituições bancárias como também sobre a situação financeira das empresas, que interessa aos seus fornecedores, aos seus trabalhadores e aos cidadãos em geral.

Claro que há boas razões para que esta informação não seja tornada pública: a defesa do bom nome das entidades envolvidas, a salvaguarda da actividade bancária e a protecção da imagem do sistema financeiro português aos olhos dos investidores internacionais. Mas foram esses mesmos argumentos que serviram ao longo de anos para travar o levantamento do sigilo bancário, quer nos processos judiciais, quer no combate à evasão fiscal que hoje ninguém contesta. Se hoje em dia já divulgamos publicamente os nomes das pessoas e empresas com dívidas ao fisco, não fará sentido também tornar um pouco menos opaco o universo dos devedores cronicamente incumpridores?

Se os bancos têm sido demasiado grandes para falirem, então é preciso um escrutínio público e social maior sobre as suas decisões de crédito. Se os devedores são tão grandes que mandam mais do que os bancos, então devem ser conhecidos. Sobre isto parece haver agora um entendimento na Assembleia da República e já não é pouco. Fica faltar tudo o resto, que é muito: saber como, em que circunstâncias, a quem, a partir de que valores, se apenas para o passado ou com regularidade no futuro será disponibilizada essa informação que hoje é exclusiva do Banco de Portugal.
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