Opinião
Pedro e os Lobos
Ver a selecção nacional de râguebi cantar o hino nacional na estreia do Mundial colocou Portugal no divã da autopsicanálise. O país não está habituado a ver-se representado assim, com aquela garra. Que Portugal era aquele, que ali gritava “Heróis do Mar”
Os “Lobos” obrigaram-nos num minuto de música a fazer mil perguntas sobre motivação, patriotismo, orgulho, honra, capacidade de exceder limites. As imagens tornaram-se campeãs de audiência na TV e no Sapo Vídeos. As derrotas no râguebi e no basquetebol honraram-nos mais que os empates no milionário futebol. Os desportos amadores, o atletismo, estão a dar ao país aquilo que o país não lhe dá a eles: reconhecimento, entrega, demonstração de competência, empenho e profissionalismo.
Não é grave, o deslumbre passa-nos depressa, mas enquanto não atinge o buraco negro das medalhas do Presidente da República, que simultaneamente exalta e extingue a façanha, vale a pena fazer reflexões. Não apenas sobre desporto, sobre humildade e sobre força, mas também sobre o sucesso e sobre as capacidades que temos - e as que estamos dispostos a ter.
Não vale a pena lamentarmos o desequilíbrio mediático a favor do futebol. A desproporcionalidade está nas audiências. Mas vale a pena enquadramos o orgulho numa selecção de basquetebol ontem derrotada no Europeu e de outra selecção que erege como objectivo no próximo jogo, contra a Nova Zelândia, perder por menos de 100 e chegar ao fim de pé: a sua presença nestes campeonatos equivale a ter um clube das Distritais na Champion’s League.
É frequente pedir-se à imprensa que contribua para melhorar a auto-estima nacional exibindo boas práticas e casos de sucesso. Os Governos e os grandes empresários adoram. Os leitores nem tanto, como mostram vários fracassos editoriais de produtos lançados com essa pretensão. Mas há excepções que confirmam a regra, como os programas “Sucesso.pt” da SIC Notícias e o “Radar de Negócios” da RTPN. Quem os vê encontra padrões nos casos de sucesso empresarial relatados. Um deles é a desnecessidade do Estado, a cosmopolitismo empresarial, a universalidade das ambições, a exclusão do círculo vicioso eu-apoio-o-Governo-que-me-apoia-porque-eu-o-apoio. Sucesso é isso. É vencer nos mercados abertos e sem ajuda do Estado nem balões de oxigénio como o que o Governo acaba de dar à Maconde, em benefício financeiro da empresa e mediático do ministro.
O Jornal de Negócios entende que puxar pelo país é não ser complacente, mas exigente com as suas empresas e os seus líderes. E, sim, o “Portugal de sucesso” existe. Ei-lo inspirador na selecção de râguebi, bem longe dos discursos enfunados. Não é à toa que Tomaz Morais, “o Mourinho do râguebi”, se tornou um guru instantâneo de liderança, sem espaço na agenda para mais palestras a quadros de empresas portuguesas.
O fracasso não é uma fatalidade. O sucesso não é uma sorte. Os “Lobos” do râguebi estão a revigorar a nossa auto-estima. E a dar uma lição ao País. Estaremos a aprender alguma coisa?
PS: Em reacção à manchete de ontem do Jornal de Negócios, em que o presidente da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos expunha as fragilidades do financiamento partidário a propósito do caso Somague/PSD, aqui se escreveu que a lei está feita para salvaguardar a absolvição prévia dos políticos. As várias reacções falam por si: as ilegalidades acontecem por ingenuidade (PS); é preciso pedagogia (PSD) e aperfeiçoamento (BE).