Opinião
Os assessores
Aviso desde já os espíritos mais liberais que este texto é dos mais conservadores até hoje aqui escrito. Deve, por conseguinte, descontar a quantidade de preconceitos pessoais que nele vai encontrar. Mas, antes de entrar no tema, gostaria de o desafiar pa
Um cenário teórico, em que lhe perguntavam o que pensava se, um dia, num país chamado Portugal, integrado no espaço europeu, classificado há década e meia como «país industrializado» pela OCDE, o seu primeiro-ministro fosse aconselhado por uma especialista da «imprensa cor de rosa».
E, a seguir, diziam-lhe que, enquanto esse país atravessa uma fase particularmente crítica da sua história, esse líder do Governo, recém-chegado a essas importantes funções, partira para curtas férias acompanhado de um jogador de futebol e de conhecidas «socialites». Que género de ideias podiam passar-lhe pela cabeça?
Se a sensação é estranha, então bem-vindo ao clube. Também é daqueles que pertence a um grupo de pessoas socialmente antiquadas e politicamente ultrapassadas.
Porque, já percebeu, o exercício proposto não é nada teórico e é bom que comece a habituar-se à ideia de que estas mudanças vieram para ficar. Parecem a brincar, mas são a sério. Tudo mudou. As figuras principais e os acólitos. As questões de forma e os assuntos de fundo.
Este Governo pode não ser o pior desde os tempos de Dona Maria, a Piedosa. Mas certamente que é um forte candidato a tornar-se o mais divertido desde Palma Carlos.
Pois Santana Lopes é primeiro-ministro. Pois acaba de recrutar a relações públicas da revista Lux como assessora de imagem. Pois são os amigos Ricardo Sá Pinto e Joana Lemos que, neste momento, acompanham o chefe de Executivo.
E, como é óbvio, é com toda esta sua «entourage» que o chefe do Executivo tem vindo a partilhar as angústias sobre o país, a pedir conselhos sobre a governação. A nova lei do arrendamento. As prioridades do Orçamento para 2005. A redefinição das funções que está por fazer no Estado.
Já sei: amigos são amigos e ninguém tem nada a ver com isso. Mas, por muito menos, a The Economist trazia um pequeno artigo, ácido sulfúrico autêntico, do género «diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és», sobre Tony Blair.
A conclusão era inequívoca: quem passa férias com Cliff Richard, na primeira semana, e com Sílvio Berlusconi, na semana seguinte, não pode chefiar um Governo no Reino de Sua Majestade.
Por cá segue esta «caravana da alegria», ainda por cima numerosa, a desfilar na modorra estival e perante a complacência geral, a começar pela nossa, dos jornalistas.
Aliás, a classe não se limita a assistir. Enquanto denuncia as incompatibilidades de advogados que passam a ministros, participa ela própria numa vil ciranda, em que se é num mês assessor de um gabinete ministerial para, sorrateiramente, regressar no mês seguinte à redacção e produzir uma prosa isentíssima sobre a política que acabou de servir.
A promiscuidade não é de hoje. A falta de vergonha é. Sempre houve alguns cuidados, «períodos de nojo». Agora nem o nojo incomoda.