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07 de Setembro de 2006 às 13:59

O estranho caso do túnel do Rossio

Em Outubro de 2004, os lisboetas apanharam um susto de morte: debaixo dos seus pés, o túnel do Rossio ameaçava ruir. Encerrou-se o dito e abriu-se concurso para obras de urgência.

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Em Julho de 2005, o consórcio Teixeira Duarte/Epos ganhou o concurso, por um valor estranhamente baixo e um prazo de execução de 13 meses e meio. Quase 13 meses depois, neste Agosto, surge uma sequência de perplexidades. Primeira: o construtor vem dizer que precisa de mais cinco anos para a obra, por razões «técnicas e de segurança». Segunda: a Refer não aceita e ameaça rescindir o contrato. Terceira: afinal, a obra vai ser revista e será concluída em apenas um ano. A obra que ia durar 13 meses e que por razões «técnicas e de segurança» precisava afinal de 70 vai ser concluída em menos de 30... Milagre? Não. As pressões da Refer foram mais fortes que as razões da Teixeira Duarte. Gabriel Alves comentaria melhor: a técnica da força venceu a força da técnica.

O absurdo deste caso espanta mesmo os que estão habituados às trampolinadas nas obras públicas. Passou a ser prática corrente ter preços de saldo para ganhar o concurso e imprevistos para ganhar o dinheiro. O mercado tem construtoras a mais e há uma multidão de quase 90 empresas com alvará para se candidatarem a quase todas as empreitadas, seja qual for o valor. E a concorrência gera o expediente: o departamento comercial prepara propostas à pele e depois surgem imprevistos que encarecem a obra: trabalhos a mais por falta de rigor entre a informação dada pelo dono de obra e a situação no terreno, pela adaptação do projecto por erros de medição, por omissões e situações imprevisíveis. Tudo manobras utilizáveis e utilizadas.

Se quisermos ser ingénuos, acreditamos que há uma pandemia de incompetentes entre os donos de obra pública, incapazes de lançar concursos correctamente; se preferirmos ser conspirativos, acreditamos que o recurso a manobras dilatórias é a regra e não a excepção.

Há hoje três túneis de Santa Engrácia em Lisboa. Mas o atraso no do Rossio não se compara ao do Marquês (interrompido pelo tribunal, por falta de estudo de impacto ambiental) nem ao do Metro do Terreiro do Paço (acidente durante a intervenção). A dilatação para cinco anos seguida de súbita contracção para um ano de obra é tão absurda que só pode ser ou um mau negócio ou um negócio mau. O que mudou foi que desta vez o dono de obra fez o impensável e decidiu não jogar o jogo, que levaria a crer que as partes negociariam condições intermédias (de tempo e dinheiro). Mas a Refer arriscou (sim, é um risco, até porque
um novo concurso pararia a obra pelo menos mais nove meses).

Fez «bluff»? Talvez. O empreiteiro não quis pagar para ver.

Sousa Pardal é presidente da Refer há poucos meses e entrou em condições estranhas, substituindo Braancamp Sobral, que saiu humilhado pelo ministro Mário Lino. Agora, o gestor recusa enfiar o chapéu de orelhas que usam os donos de obra fracos e mal assessorados, impondo moralidade na execução do contrato. Mas é pena que este tipo de casos não tenha outras consequências na relação posterior entre construtoras e Estado enquanto dono de obras. As denúncias do IMOPPI são pontuais e os casos de cassação de alvará limitam-se aos pequeníssimos empreiteiros. E assim a fama dos maus empresários contagia o proveito dos bons construtores. Todos estão num sector sobrepovoado e em crise, de margens e de produção.

Já são problemas que bastem.

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