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Pedro Santos Guerreiro psg@negocios.pt 27 de Junho de 2012 às 00:01

Férias grandes

Uma vez por mês, obrigamo-nos a estar bem-dispostos. Preparamos uma edição especial, sempre com um tema, e esmeramo-nos numa espécie de super-maxi de jornalismo. Nesse dia, o editorial estende a bandeira branca e dá tréguas à desgraça. Esse dia é hoje. Pelo tema de hoje, as férias, devia ser fácil estar bem-disposto. Bom, fácil não é.

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Uma vez por mês, obrigamo-nos a estar bem-dispostos. Preparamos uma edição especial, sempre com um tema, e esmeramo-nos numa espécie de super-maxi de jornalismo. Nesse dia, o editorial estende a bandeira branca e dá tréguas à desgraça. Esse dia é hoje. Pelo tema de hoje, as férias, devia ser fácil estar bem-disposto. Bom, fácil não é.

É como uma dieta episódica, e regular, mas contra a magreza. Neste dia, queremos engordar. Engordar de jornalismo, engordar de reportagens, engordar de histórias, casos, pessoas, conhecer outros rumos, constiparmo-nos com correntes de ar de outros mares, virar a bússola aos marasmos, aos pasmos e aos asnos, queremos barrigas cheias, cérebros despertados, corações vivos, mãos, narizes e lábios, queremos saltos, urros e danças. Afinal, é Verão. Verão sem férias da austeridade, mas Verão. Férias sem subsídio, mas Verão. Hoje, estão quase quarenta graus à tarde, Portugal joga contra Espanha à noite e amanhã os impostos, o desemprego e as zangas continuarão maiores do que desejaríamos. Mas hoje, hoje podemos tentar estar bem-dispostos.

Nesta edição falamos essencialmente de turismo. Sobretudo de turismo de baixo custo. De novos e velhos destinos, de ideias para sair da casca, de oportunidades, de bagatelas, de lugares de lazer, livros para ler, coisas para fazer, coisas para nada fazer, andámos por Portugal, visitámos países estranhos, apanhámos boleia com os jornalistas da Antena 1 - rádio parceira do Negócios -, que puseram em letras para os nossos leitores o que as vozes contam aos seus ouvintes. Depois, porque queremos engordar de comidas das férias e não de gravidezes histéricas, ouvimos empresas turísticas, analisamos o estado do sector, que é sofrido. Muito sofrido.

Cuidámos do litoral, mas andámos a dar cabo do sul. Como escreve André Jordan na página 71, "é lamentável que o Algarve, queimado pelo fracasso do pretensioso e ridículo programa Allgarve, tenha abandonado o esforço de atrair uma clientela com bom nível". Um Algarve com portagens impagáveis para turistas, estádios impagáveis para contribuintes, autódromos impagáveis para credores. Um Algarve em risco de erosão do perfil de turista estrangeiro. Em parte, porque houve atenção a mais para "sheiks" aldrabões e crédito a mais para hoteleiros que quiseram ser construtores. Mas um Algarve, por isso mesmo, em saldos. E cheio de cantos.

Um problema no sector turístico é um problema nacional. E não só por causa do volume de exportações, da entrada de capitais, do emprego que se cria, da economia que cresce, dos impostos que se pagam. Hoje, há centenas de empreendimentos hoteleiros que apodrecem nos balanços dos bancos, incapazes de cobrar as dívidas com que financiaram as suas construções. Vários casos, como o dos hotéis Carlos Saraiva, estão neste estertor. Se os bancos vendem estes activos a saldo a investidores despreocupados com a qualificação do turismo, podemos perder no Algarve o que se ganhou em Lisboa: turismo de pé bem calçado.

Mas voltemos às barrigas, esta edição é-lhes dedicada. Não vende ilusões nem promete outros sóis. Estamos imersos na pobreza, estamos no sul de um continente sem norte, somos povo de um país sem sorte. Mas hoje, pelo menos hoje, podemos, como Cesário Verde, "comer dos mesmos bolos e presuntos, e rir dos miseráveis."

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