Opinião
O partido justicialista
Em 1946, Juan Domingo Perón criou na Argentina o Partido Justicialista, resultante da fusão de dois partidos. Mais tarde, este movimento político ficou conhecido como peronismo, devido à importância que o seu fundador conquistou na Argentina.
Este intróito serve apenas para capturar a nomenclatura partido justicialista e trazê-la como suporte para analisar a realidade portuguesa, profundamente marcada pela actividade judicial. Seja ela a investigação a Mário Centeno, por causa de ter pedido dois bilhetes para o clássico Benfica-Porto, seja a Operação Lex, que já constituiu arguidos o juiz Rui Rangel e o presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, seja o julgamento que resultou da Operação Fizz, ou ainda a acusação de dois secretários de Estado do Governo de José Sócrates, José Magalhães e José Conde Rodrigues, pelo crime de peculato pelo uso indevido de cartões de crédito.
Mas há mais. O chamado caso dos CMEC, que transformou em arguidos o CEO da EDP, António Mexia, e o ex-presidente da REN,_Rui Cartaxo, sem esquecer o caso BES e ainda a Operação Marquês, em que o principal visado é José Sócrates.
Há ainda o caso dos vistos "gold", envolvendo o ex-ministro do PSD Miguel Macedo, que já está em julgamento, ou das viagens ao_Europeu de França, pagas pela Galp, que conduziram à demissão de três governantes: Jorge Costa Oliveira, Fernando Rocha Andrade e João Vasconcelos.
Perante esta catadupa de investigações, umas absolutamente relevantes, outras mais questionáveis, a percepção dominante é a de que o ímpeto justicialista tomou conta do país. O problema de fundo não é do ímpeto em si, mas a forma como a actividade judicial tomou conta da praça pública, o que pode também fazer perigar a sua eficácia. O julgamento dos envolvidos começa muito antes de os casos chegarem à barra dos tribunais e as sentenças produzidas pela opinião pública ganham uma natureza irreversível.
A justiça transformou-se num partido, na medida em que uns defendem a sua acção, outros criticam-na, e pelo meio há quem a avalie casuisticamente. Na balança dos três poderes: o executivo, o legislativo e o judicial, este último desequilibra os pratos a seu favor. O putativo segredo de justiça encarrega-se de caldear todos os ingredientes. Porque mesmo antes dos factos já há culpados e não há memória de que algum agente da justiça tenha sido punido pela violação do referido segredo.