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Assim (não) se faz Portugal

Privados dos melhores e sem capacidade para promover mudanças de fundo, limitamo-nos a um exercício de gestão do dia a dia.

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Esta súbita crise política é diferente de outras porque nasce de uma teimosia do primeiro-ministro, mas faz-nos igualmente desembocar no território do debate recorrente sobre a qualidade da nossa democracia e também dos efeitos perniciosos da incerteza.

Um dos lamentos recorrentes é o afastamento dos melhores da vida pública, devido à natureza cada vez mais agressiva da política e também da sua contaminação pelos pequenos interesses. Esta crise veio dar mais um importante contributo para que esse afastamento se aprofunde. Quadros competentes com uma atividade profissional estável, tanto do ponto de vista da realização pessoal como remuneratório, olham com reservas para o chamado serviço público devido à forma cada vez mais agressiva e até trauliteira como se comportam muitos políticos.

A campanha eleitoral que aí vem, tendo em atenção o caso Spinumviva e os comportamentos mais recentes de alguns líderes políticos, vai certamente reforçar esta tendência de divórcio entre a clique que gravita à volta dos partidos e os independentes que estes insistem em convidar para o Governo em circunstâncias cada vez mais adversas.

As próximas eleições não vão significar o início de uma regeneração política. Ao invés, serão mais um episódio de uma estafada novela que continuará a afastar os melhores da coisa pública.

Com as crises políticas surgem também os avisos recorrentes de muitos agentes económicos sobre os riscos da incerteza. Faz mesmo parte da encenação destes tempos, até porque a mudança cria sempre inquietações. O que a história recente nos mostra é que as crises tiveram um impacto praticamente nulo na atividade económica. Trata-se de um sinal de maturidade das instituições e da independência do setor privado relativamente ao Estado.

Todavia, estas sucessivas crises têm um efeito pernicioso na medida em que atiram para a terra do nunca decisões de natureza estrutural como a privatização da TAP, a terceira travessia do Tejo, a regeneração do SNS ou a reforma da justiça.

A política transformou-se numa arte de navegação à bolina e isso impede a evolução do país. Privados dos melhores e sem capacidade para promover mudanças de fundo, limitamo-nos a um exercício de gestão do dia a dia. Assim (não) se faz Portugal.

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