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02 de Novembro de 2015 às 09:55

O profeta Peter Boone

Peter Boone vaticinou, com um ano de antecedência, que Portugal iria ter o mesmo destino que a Grécia.

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Peter Boone vaticinou, com um ano de antecedência, que Portugal iria ter o mesmo destino que a Grécia. Os artigos que publicou em 2010 revelaram capacidade de análise. O pecado foi ter-se esquecido de mencionar que nas suas premonições havia um conflito de interesses.

Estávamos em Abril de 2010, e poucos economistas eram tão assertivos sobre o risco de Portugal vir a necessitar de um resgate como o foram Peter Boone e Simon Johnson num artigo divulgado num blogue do The New York Times. A Grécia tinha acabado de perder a capacidade de se financiar nos mercados internacionais, quando os dois economistas decretaram Portugal como o "The Next Global Problem".

Não foi o único artigo que Peter Boone escreveu sobre o malogrado destino que esperava Portugal - no comunicado sobre a acusação do crime de manipulação de mercado tendo por objecto a desvalorização das obrigações do Tesouro, o Ministério Público fala de vários textos, entre Fevereiro e Abril de 2010 . Há ainda um de Maio, no Financial Times. Mas o artigo do NYT é claramente o de maior alcance. Espalhou-se pela rede. Basta "googlar" e apanham-se várias referências.

O texto é virulento. "O próximo no radar será Portugal. Esta nação não tem estado sob os holofotes, por causa da queda vertiginosa da Grécia. Mas ambos estão economicamente à beira da bancarrota, e parecem mais arriscados do que a Argentina em 2001, quando entrou em incumprimento na dívida." O artigo salienta o descontrolo no défice e o elevadíssimo nível de dívida pública dos dois países, impossível de corrigir no quadro de pertença a uma zona monetária com taxas de câmbio fixas.

Os dados em que os textos se baseiam - o nível da dívida e do défice - eram todos públicos. E a interpretação destes feita por Boone e Johnson, muitos outros fizeram, como de resto alega o economista num comunicado divulgado na sexta-feira, em que nega ter manipulado o mercado.

Onde o economista falhou foi ao não avisar explicitamente nos artigos que naquela altura era administrador de uma consultora que prestava serviços de aconselhamento financeiro para o "hedge fund" Moore Capital Management. E que este, inspirado nas opiniões do economista, apostou na queda dos preços das obrigações portuguesas. Operações que geraram um lucro de 819 mil euros. Faltou o "disclaimer". Sem ele, é legítima a suspeita de que terá colaborado numa manipulação do mercado, espalhando artigos com o intuito de baixar as cotações. É por aí que a CMVM, que reuniu os primeiros indícios, e o Ministério Público lhe pegam.

Além do Moore Capital, muitos outros investidores institucionais tentaram lucrar com a situação de Portugal. Mas convém não confundir a responsabilidade de profetas da desgraça e especuladores, com a daqueles que deram real substância às circunstâncias que conduziram ao resgate de Abril de 2011: os governantes que permitiram que o défice, a dívida pública e o endividamento externo chegassem a níveis insustentáveis.

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