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Acusado de manipular dívida pública diz que caso é "politicamente motivado"
O economista Peter Boone sabe esta quinta-feira se vai ou não ser julgado pela manipulação da dívida pública portuguesa.
Ainda antes de essa decisão ser conhecida,Boone divulgou um comunicado no qual resume o que tem sido o processo e apresenta, mais uma vez, a sua defesa. "A ausência de qualquerprova objectiva contra oProfessor Peter Boone, a mudança e a forma inadequada e errada como a acusação está sustentada, assim como a aparente falta de vontade de apurar a verdade sugerem que a acusaçãoé politicamente motivada, tentando travar criticas de comentadores à política económica do antigo Governo", afirma.
Em causa estavam artigos escritos por Boone a partir de Abril de 2010, salientando as fragilidades da economia portuguesa e da sua capacidade de financiamento, e um ganho que uma empresa relacionada com o economista terá tido com a desvalorização da dívida pública nacional. O caso partiu de uma denúncia da CMVM, em 2012.
O economista descreve as várias fases do processo até aqui, afirmando mesmo que, "em 14 de Setembro de 2016, durante o debate instrutório, o senhor procurador informou o Tribunal que já não considerava que o Professor Peter Boone fizera parte de uma conspiração criada para desvalorizar a dívida pública portuguesa".
A defesa de Boone conclui, assim, que está em causa uma tentativa de limitar a liberdade de expressão - salientando que muitos economistas escreveram textos semelhantes aos seus - "tentando travar críticas de comentadores à política económica do anterior Governo".
E é na liberdade de expressão que o autor assenta a sua defesa. "Portugal encontra-se na situação incómoda de ser o Estado Membro da União Europeia com o maior número de condenações por violação da liberdade de expressão", lembra a nota.
O Ministério Público acusa o académico de manipulação de mercado. Em causa estão artigos de opinião deste autor, em 2010, alertando para a necessidade de Portugal pedir um resgate financeiro, sendo que Boone estaria ligado a um 'hedge-fund' que beneficiou quando as 'yields' da dívida pública portuguesa dispararam nos mercados.
A tese inicial do Ministério Público é que o autor tinha como intenção usar a credibilidade das suas análises técnicas para pressionar a evolução dos títulos de dívida pública portuguesa em mercado secundário, o que foi aproveitado pelo 'hedge-fund' Moore para lucrar com as quedas das taxas. Acontece que Peter Boone estava ligado à Salute Capital Management, que prestava serviços de aconselhamento de investimento em dívida pública portuguesa à Moore.
Nos artigos, na parte do disclaimer, o autor assumia a sua ligação à Salute Capital Management, mas nunca fez referência aos serviços por esta prestados à Moore, ou seja, ao conflito de interesses que a sua opinião poderia representar.
Em causa estão vários artigos, mas um deles foi o que causou maior impacto, dando mesmo lugar a uma reacção do então Ministro da Finanças, Teixeira dos Santos. O artigo "The Next Global Problem: Portugal", era assinado por dois autores: Peter Boone e Simon Johnson.
O artigo foi publicado a 15 de Abril de 2010 no blog Economix, associado ao The New York Times, tendo imediatamente grande repercussão e sendo citado em vários meios de comunicação social, entre eles alguns portugueses. Também a versão online do New York Times fez uma notícia sobre a análise nesse mesmo dia.
Nesta altura, num momento em que a situação grega estava ao rubro e o país havia pedido um resgate, defendia-se que Portugal seria a vítima seguinte, algo que efectivamente veio a verificar-se um ano mais tarde. Teixeira dos Santos, na altura ministro das Finanças, chegou a qualificar publicamente a análise de Boone e Johnson como "disparates sem fundamentação".