Opinião
A obliteração do centro
A Europa tem uma nova dor de cabeça. No mesmo dia em que o impasse alemão deixou de o ser, nasceu o quebra-cabeças italiano. Logo numa altura em que a União Europeia terá de tomar decisões cruciais sobre o seu futuro.
A fresta política para avançar com as medidas que prometem tornar a Zona Euro e a União Europeia mais robustas para enfrentar uma próxima crise é estreita. O prazo-limite expira nas vésperas da campanha para as próximas eleições europeias.
Em cima da mesa estão questões tão cruciais como a concretização do fundo europeu de garantia de depósitos, que permitirá completar enfim a União Bancária, garantir um mecanismo de apoio financeiro para a resolução de bancos, caminhar em direcção a um Fundo Monetário Europeu ou dar passos concretos para um mercado único de capitais.
O objectivo é que em Junho exista um acordo sobre estas matérias para ser aprovado pelo Conselho Europeu. Um calendário que o impasse eleitoral em Itália poderá complicar. Sentir-se-á o governo em funções legitimado para decidir sobre um aprofundamento da União Europeia quando os italianos votaram massivamente em partidos que defendem o inverso? É indiscutível que entrou um enorme grão de areia na engrenagem da integração.
A resiliência que se pretende não é apenas contra crises. É também contra a ascensão de movimentos populistas e extremistas, a quem o próximo abanão económico pode dar ainda mais protagonismo.
Uma coisa é o "establishment" partidário ser substituído por outras forças ao centro, defensoras do projecto europeu. É o caso de França e é o que está a acontecer agora em Espanha com o crescimento do Cidadãos. Outra bem diferente é aquelas serem substituídas por movimentos populistas e extremistas, como aconteceu em Itália.
A "débacle" do centro, e em particular do centro-esquerda, é uma tendência histórica de dimensões preocupantes. Segundo contas do EU Observer, entre 2000 e 2017, esta área política perdeu eleitorado em 15 de 17 países, em alguns casos de forma dramática. Cada país é um caso. É fácil identificar na Grécia, em França ou Itália a responsabilização por uma recessão aguda ou pela incapacidade em tirar a nação do marasmo. Mas há aqui algo mais profundo do que um mero ciclo. Há uma quebra de confiança e de identidade.