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30 de Maio de 2016 às 20:30

Plano B para a economia global

Alcançar consensos a nível global é sempre difícil. Mas, no contexto dos dias de hoje, é impossível contornar a questão. Se os países continuarem a avançar sozinhos, o mundo inteiro sofrerá.

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Em Março, os encontros do G-20, o Congresso Nacional Popular chinês e os múltiplos grupos de reflexão, todos eles expressaram uma crescente consciencialização dos riscos para a economia global colocados pela deflação e o aumento da instabilidade do sector financeiro. Para reduzir estes riscos, o caminho que a China tomar vai ser particularmente importante. Mas evitar uma aterragem forçada na China é condição necessária mas não suficiente para uma recuperação mundial.

Contra as recomendações de muitos economistas chineses, os decisores políticos optaram por não seguir a abordagem ocidental convencional de usar as taxas de câmbio flexíveis a actuar como um amortecedor a fluxos de capital voláteis e deste modo libertar a política monetária para fornecer liquidez para ajustamentos estruturais internos. Satisfazendo simultaneamente economistas ocidentais e mercados financeiros mundiais, que respiraram de alívio quando os líderes chineses reafirmaram o seu empenho em manter o  renminbi estável.

O receio era, se a China procurasse taxas de câmbio mais baixas para escapar à deflação, uma nova série de desvalorizações concorrenciais a nível global e ainda mais deflação. Felizmente, os líderes chineses reconheceram que, se o mundo se mantiver atolado numa recessão de balanços financeiros, a falta de procura agregada, o continuar do enfraquecimento do comércio, irá também arrastar o crescimento do seu próprio país.

Mas, claro, a China ainda precisa de encontrar o caminho para lidar com saída de capitais, prosseguindo as reformas estruturais que são necessárias para colocar a economia numa trajectória de crescimento sustentável a longo prazo.

Como defendemos ultimamente, a solução será manter uma taxa de crescimento anual próxima dos 6,5%, enquanto prossegue no curto prazo um multifacetado plano de estabilização que vise estimular a criação de emprego para compensar perdas registadas na reestruturação de indústrias ineficientes e na eliminação da capacidade excedentária.

 

Entretanto, o Banco Popular da China (PBOC) enfrentará a difícil tarefa de manter a estabilidade cambial e combater a deflação, assegurando a liquidez necessária para salvaguardar a mudança da indústria para os serviços e consumo disponível a preços razoáveis.

 

Tendo em conta o montante de reservas oficiais que a China já gastou para estimular a economia e estabilizar a taxa de câmbio e as saídas de capital – o equivalente a três vezes o excedente de transacções correntes de 2015 – é muito importante diminuir as reservas mínimas.

 

O Banco popular da China (PBOC), tem de, naturalmente, apertar o controlo do mercado cambial. Mas também deve considerar outros instrumentos macroprudenciais, tal como uma espécie de Taxa Tobin, imposto sobre as movimentações financeiras internacionais, pela primeira vez proposto em 1972 pelo economista laureado com o Prémio Nobel, James Tobin, a fim de desencorajar movimentações financeiras internacionais de carácter especulativo.

 

Tudo isto nos conduz ao Plano A – uma inevitável estratégia para parar a deflação na China. Mas, no sistema global multipolar dos dias de hoje, um país sozinho não consegue salvar a economia da deflação. É por essa razão que o mundo inteiro deve também considerar a implementação de uma estratégia partilhada, chamemos-lhe o Plano B.

 

Claro que, uma acção colectiva não será fácil – até porque algumas das medidas, como a política monetária ou política fiscal, foram postas de parte na conferência de Bretton Woods (1944), onde os líderes mundiais criaram as regras para as relações comerciais e financeiras entre países que prevalecem até hoje. Mas, face a uma ameaça sem precedentes à estabilidade da economia global, talvez seja tempo de convocar um novo tipo de conferência de Bretton Woods para determinar que medidas colectivas são possíveis.

 

Há imensos incentivos para a acção. Com as economias desenvolvidas a enfrentar um rápido envelhecimento da população, elevados encargos da dívida pública, políticas económicas esticadas, e políticas turbulentas, a capacidade da economia global escapar desta situação difícil depende em grande medida dos países emergentes.

 

Afinal, enquanto estas economias estão a enfrentar os seus próprios desafios, gozam de demografias mais favoráveis e registam uma rápida urbanização. Como resultado têm um imenso potencial para ganhos de produtividade, que permitem reforçar o crescimento da economia mundial, e uma elevada procura em infra-estruturas sustentáveis de maneira a reduzir a destruição dos recursos naturais e reduzir o aquecimento global.

 

O maior constrangimento na realização do potencial das economias emergentes é financeiro, com as instituições de Bretton Woods incapazes de providenciar o capital necessário. Se o mundo conseguir escapar à armadilha da deflação – para não falar do aumento de rendimento e da desigualdade na distribuição da riqueza – esta situação tem de mudar.

 

O recente pânico gerado pela desvalorização do renminbi chinês destaca outro motivo imperioso para uma acção colectiva. No mundo de hoje, ninguém está livre de grandes e voláteis fluxos de capital – nem mesmo os países que construíram uma imensa montanha de segurança na forma de reservas de divisas estrangeiras.

 

Em 2007-2009, as economias desenvolvidas conseguiram escapar a uma crise de liquidez, em grande medida porque a Reserva Federal Americana esteve disposta em empenhar-se em linhas de liquidez com bancos centrais chave, a maior parte deles aliados norte-americanos. Só com um sistema de liquidez mundial de segurança – suportado por acordos cambiais de divisas – podem os países alcançar a tão necessária reflação, sem excessivos receios de fuga de capitais e/ou desvalorização da taxa de câmbio.

 

Finalmente, a acção colectiva é necessária para tornar a política monetária não convencional mais efectiva. Até agora, essas políticas não foram bem-sucedidas para relançar a economia, em grande medida porque bancos comerciais e outros financiadores retêm a liquidez que recebem dos bancos centrais, em vez de a canalizarem para a economia real concedendo crédito a pequenas e médias empresas e investindo em projectos de infra-estrutura de longo prazo.

 

Não é coincidência o facto de entre 2010 e 2014, os maiores bancos, empresas e fundos de investimento terem aumentado a sua liquidez em 3 biliões de dólares – mais ou menos o montante com que os bancos centrais reforçaram as reservas de divisas dos países no mesmo período. Ao permitir aos países eliminarem o excesso de capacidade, reduzir a alavancagem, e equilibrar políticas fiscais – reduzindo a incerteza geopolítica em simultâneo – a acção colectiva para escapar à deflação e estimular o crescimento atenuaria a aversão ao risco das instituições financeiras, melhorando assim os mecanismos de transmissão das políticas monetárias não convencionais.

 

Alcançar consensos a nível global é sempre difícil. Mas, no contexto dos dias de hoje, é impossível contornar a questão. Se os países continuarem a avançar sozinhos, o mundo inteiro sofrerá.

Andrew Sheng é um ilustre membro do Instituto Asia Global na Universidade de Hong Kong e membro do UNEP Advisory Council on Sustainable Finance. Xiao Geng, director do Instituto IFF, é professor da Universidade de Hong Kong e membro do Instituto Asia Global.

 

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2016.
www.project-syndicate.org

Tradução: Rosa Castelo

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