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18 de Novembro de 2014 às 19:00

Optimizar a Zona Euro

A Zona Euro enfrenta um cenário económico sombrio, com o crescimento estagnado e uma ameaça de deflação. O economista Martin Feldstein, que se mostrou céptico em relação ao projecto da Zona Euro desde o início, chama-lhe agora um "fracasso". Feldstein está certo, ou a Zona Euro poderia tornar-se a "área monetária óptima" que os seus criadores acreditavam que fosse?

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Responder a esta pergunta exige, em primeiro lugar, uma compreensão dos custos e benefícios dos vários sistemas de taxas de câmbio. O Fundo Monetário Internacional foi criado há 70 anos para gerir um sistema de indexação ajustável - um sistema híbrido em que as taxas de câmbio eram geralmente fixadas ao dólar, mas podiam ser modificadas ocasionalmente para melhorar a posição competitiva do país nos mercados de exportação.

 

Pela primeira vez em várias décadas, este sistema apoiou-se pesadamente nessa fixação devido à conversibilidade directa do dólar em ouro. Isso trouxe uma estabilidade significativa para a ordem monetária global, que se seguiu às desvalorizações competitivas da década de 1930 que alguns economistas consideraram prejudiciais.

 

Mas o sistema de câmbio fixo também minou a capacidade dos Estados Unidos de gerirem a sua balança de pagamentos. Foi por isso que, em 1971, o presidente Richard Nixon abandonou unilateralmente a convertibilidade do dólar em ouro, deixando as taxas de câmbio das principais moedas flutuar umas contra as outras.

 

Tal sistema oferece vantagens importantes – principalmente, permite que a Reserva Federal dos Estados Unidos injecte dinheiro na economia para evitar ou pôr fim a uma recessão. Mas também acarreta riscos graves, exemplificados nos desequilíbrios comerciais que surgiram na década de 1980.

 

De 1980 a 1985, o dólar americano apreciou-se em cerca de 50% face às moedas do Japão, Alemanha Ocidental, França e Reino Unido; o défice das contas correntes dos Estados Unidos aproximava-se dos 3% do PIB; e os seus quatro principais concorrentes tiveram excedentes enormes e um crescimento negativo do PIB. A fim de corrigir estes desequilíbrios, os cinco países assinaram o Acordo Plaza, no qual concordaram em intervir no mercado cambial para desvalorizar o dólar.

 

Foi com este pano de fundo que o euro nasceu, com o objetivo de impulsionar as economias europeias, expandindo o seu mercado "local", reduzindo os custos de transacção e facilitando o fluxo de informações. Em 1991, a perda de independência em matéria de política monetária parecia valer a pena para as economias da Europa; hoje, parece que poderá ter sido um erro.

 

Na verdade, a experiência dos Estados Unidos na década de 1960 deveria ter funcionado como um aviso para os criadores da Zona Euro de que amarrar as mãos das autoridades monetárias nacionais pode não ser uma boa ideia. Não seria o caso se a Zona Euro operasse de acordo com a visão de Robert Mundell sobre uma área monetária óptima, com ajustamentos ao nível do trabalho e do capital a substituir os ajustamentos da taxa de câmbio. Além disso, a experiência da Alemanha com a reunificação sugere que a união política é essencial para o sucesso de uma tal união.

 

A Zona Euro não cumpriu qualquer destes critérios. Os países da Zona Euro têm enfrentado fortes choques assimétricos, para os quais não têm resposta devido à falta de instrumentos de política monetária. Como resultado, têm lutado contra recorrentes crises económicas.

 

Para entender o poder correctivo da política monetária, basta considerar os progressos recentes do Japão em escapar de décadas de estagflação. A expansão monetária foi um dos três pilares da estratégia económica do primeiro-ministro Shinzo Abe - uma abordagem que poderia ter sido implementada há muitos anos para travar a forte valorização do iene. O problema é que os antecessores do governador do Banco do Japão, Haruhiko Kuroda, comportaram-se como se estivessem ligados por um regime de câmbio fixo.

 

Ao contrário do Japão, o fracasso dos países da Zona Euro em implementarem medidas de política monetária corajosas não é uma escolha. A única ferramenta de política monetária disponível é mudar colectivamente o valor do euro em relação às moedas externas. Mas o uso dessa ferramenta é limitado pelas grandes discrepâncias entre o apetite dos países individuais por níveis de preços inflacionistas ou deflacionistas.

 

Para ser mais preciso, a integração económica europeia - um processo que, pode dizer-se, culminou na criação da Zona Euro - também trouxe benefícios políticos claros. Tal como Robert Schuman prometeu quando concebeu a ideia de uma Comunidade Europeia, a integração tem impedido a ocorrência de uma guerra entre a Alemanha e a França. Mas se era necessária uma união monetária numa escala tão grande para atingir esse objetivo, isso já deixa dúvidas.

 

De qualquer forma, a Zona Euro existe - e, neste ponto, seria extremamente difícil desmontá-la totalmente. Perante isto, o objetivo deve ser o de caminhar em direcção a uma área monetária ideal.

 

Antes de mais, os líderes europeus devem reconhecer que a Zona Euro, como está actualmente constituída, é maior do que a área monetária óptima da Europa. Alguns dos seus estados-membros - certamente a Grécia, e, provavelmente, Itália e Espanha - precisam de uma política monetária independente. Caso contrário, vão continuar a passar de uma crise para outra, com os países que se enquadram na área monetária óptima – como por exemplo, a Alemanha e a França – a enfrentarem as consequências.

 

Quando a adesão à Zona Euro for optimizada, o próximo passo será o de garantir o progresso contínuo em direcção à consolidação política. O resultado será uma Zona Euro mais eficiente e mais forte, em que os benefícios realmente superam os custos.

 

Koichi Hamada, assessor económico especial do primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, é professor de Economia na Universidade de Yale e professor emérito de Economia na Universidade de Tóquio.

 

Copyright: Project Syndicate, 2014.
www.project-syndicate.org

 

Tradução: Rita Faria 

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