Opinião
Fazer render a sustentabilidade
Atendendo à crescente escassez de recursos naturais e à escalada do risco de perturbações na cadeia de abastecimento, devido a ocorrências atmosféricas extremas associadas às alterações climáticas, as empresas já não podem dar-se ao luxo de ignorarem as externalidades decorrentes das suas actividades.
Quão rentáveis são os principais sectores industriais e agrícolas do mundo? De acordo com um novo relatório da consultora Truscot, sedeada em Londres, quando se tem em conta os custos destes sectores para terceiros, sob a forma de danos ambientais e outros, a resposta é "não muito".
Muitos sectores parecem lucrativos quando são utilizados os cálculos económicos convencionais. A título de exemplo, as margens de lucro antes de impostos na produção de ferro, aço e cimento, e na extracção de crude e de gás natural, estão compreendidas entre cerca de 7% e quase 20%.
Contudo, depois de descontadas as externalidades, o sector mundial do cimento tem perdas médias antes de impostos de 67%, e a extracção de crude e gás natural chega com dificuldade ao "break even". Com efeito, o relatório da Truscot estima que as 100 principais externalidades ambientais a nível mundial – incluindo as emissões de gases com efeito de estufa, o esgotamento dos recursos naturais, a desflorestação, as alterações climáticas e os problemas de saúde provocados pela poluição do ar – custam à economia global cerca de 4,7 biliões de dólares anualmente.
No entanto, essas perdas raramente são contabilizadas nos balanços das empresas envolvidas. Em vez disso, são transferidas para os contribuintes, para os pobres e – sob a forma de um planeta degradado – para as gerações futuras.
Neste âmbito, entre os sectores com impacto mais elevado temos as centrais eléctricas movidas a carvão, do Leste Asiático e da América do Norte, com externalidades que ascendem a 453 mil milhões de dólares e a 317 mil milhões de dólares, respectivamente – superior ao valor da electricidade que produzem. A actividade agro-pecuária na América Latina é o terceiro sector mais prejudicial, com prejuízos associados à desflorestação de 354 mil milhões de dólares – mais de 20 vezes o valor da produção anual do sector, que é de 17 mil milhões de dólares. Os cálculos para as indústrias que usam muita água, como o cultivo de milho, arroz ou trigo em regiões secas como o Norte de África e o Sudeste Asiático, e para os sectores que precisam de muita energia, incluindo a produção de cimento e a moagem de ferro e de aço, são similarmente desanimadores.
Se bem que o mundo em desenvolvimento esteja a gerar uma significativa parte destes custos, os bens daí resultantes são consumidos em todo o mundo. Assim, a questão das externalidades é um assunto que deveria ser encarado como um desafio mundial, que deve ser lidado em conjunto por governos, produtores e consumidores.
Na Cimeira Rio+20, que decorreu no ano passado no Brasil, os líderes dos governos, as empresas e as ONG concordaram com um leque de medidas que exporá os custos dos principais sectores de actividade a um público cada vez mais interessado e envolvido. Ao mesmo tempo, os países estão a trabalhar no sentido de delinear um novo e abrangente indicador de riqueza que vá além do PIB na contabilização de algumas destas externalidades.
Além disso, alguns países, com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Ambiente e da Global Reporting Initiative, lançaram programas no sentido de impulsionar a apresentação de relatórios por parte das empresas no que diz respeito à sustentabilidade. Esses relatórios farão com que os fundos de pensões e outros investidores – bem como as agências de "rating" – entendam melhor os factores de risco das empresas no longo prazo.
Atendendo à crescente escassez de recursos naturais e à escalada do risco de perturbações na cadeia de abastecimento, devido a ocorrências atmosféricas extremas associadas às alterações climáticas, as empresas já não podem dar-se ao luxo de ignorarem as externalidades decorrentes das suas actividades. Os empresários mais visionários também já reconhecem que, no século XXI, a competitividade dependerá grandemente da utilização mais eficiente dos recursos naturais e da redução das emissões de dióxido de carbono.
Além dos benefícios óbvios, esta abordagem trará vantagens reputacionais, à medida que os consumidores – seja através da educação ou da experiência pessoal – forem ficando cada vez mais consciencializados do impacto ambiental e social dos bens e serviços que compram. Estima-se que a seca nos Estados Unidos, em 2012, tenha provocado perdas na soja e no milho em torno de 20 mil milhões de dólares, com os custos para os consumidores a aumentarem mais de 50 mil milhões devido à subida dos preços dos cereais e das oleaginosas. As empresas que aderem a práticas insustentáveis e prejudiciais – e que continuam a transferi-las para os custos associados aos consumidores – poderão vir a descobrir que os seus clientes começaram a fazer as compras noutro lado.
Externalizar o impacto da produção – seja na geração de electricidade ou na agricultura – era talvez mais fácil quando a população mundial ascendia a apenas alguns milhares de milhões; e como a maioria das pessoas vivia em países com economias subdesenvolvidas, a oferta de recursos naturais parecia ilimitada. No entanto, com as reservas de recursos naturais a diminuírem, com as economias a desenvolverem-se a um ritmo alucinante e com a previsão de que a população mundial deverá exceder os nove mil milhões em 2050, a necessidade de dissociar o crescimento económico do consumo de recursos e de apostar numa economia verde, eficiente em recursos e com baixa emissão de CO2 tornou-se mais aguda.
Do esgotamento dos recursos pesqueiros até à acumulação inexorável de gases com efeito de estufa na atmosfera, não há falta de provas de que os actuais sistemas são insustentáveis, e de que as empresas – que representam dois terços da economia global e que usam a vasta maioria dos recursos do planeta – devem modificar a forma como realizam as suas actividades. A avaliação da consultora Truscot mostra bem porquê.
© Project Syndicate, 2013.
www.project-syndicate.org
Tradução: Carla Pedro