Opinião
Empresas melhores
Em todo o mundo, o cenário de 'corporate governance' está a mudar, com os esforços para melhorar as políticas e práticas de negócios a ganharem apoio e impulso.
A onda de reformas tornou-se visível em todo o lado - desde novos regulamentos mais rígidos no Japão a fundos soberanos como o Norges Bank Investment Management da Noruega a adoptarem uma abordagem mais activa para os seus investimentos - e certamente continuará a aumentar.
Há três factores que estão a contribuir para estes desenvolvimentos. Em primeiro lugar, a incerteza económica actual ampliou a consciência das pessoas sobre a influência que as empresas têm sobre a política, os políticos e as suas próprias vidas. E, não como eu observei anteriormente, as pessoas não estão só a prestar mais atenção; também têm mais poder do que nunca para se fazerem ouvir.
Em segundo lugar, tem havido uma consciência crescente entre os governos que o crescimento económico requer uma abordagem regulatória pró-activa. Economias robustas e resilientes precisam de empresas fortes e, para construir empresas fortes, os governos devem garantir uma supervisão de alta integridade sobre a actividade empresarial. A gestão das empresas e a gestão do país estão cada vez mais ligadas, e as autoridades reconhecem agora que pagar para garantir a boa governação agora é muito menos dispendioso (em termos financeiros e políticos) do que pagar, posteriormente, pelas consequências da má governação.
No Japão, a Agência de Serviços Financeiros promulgou o Stewardship Code em 2014, com um Código de 'corporate governance' da Bolsa de Tóquio que entrou em vigor em Junho deste ano. Ao criar um ambiente de maior igualdade entre os accionistas, garantindo mais informação e transparência, especificando as responsabilidades dos órgãos sociais, e exigindo a existência de administradores independentes nos conselhos de administração, os códigos consagram mudanças que tornam o Japão mais atractivo para os investidores estrangeiros. O primeiro-ministro Shinzo Abe já enfatizou que a boa governação corporativa é fundamental para o crescimento económico e a prosperidade a longo prazo.
O recente escândalo contabilístico da Toshiba – descobriu-se que a empresa inflacionou os seus lucros em 1,2 mil milhões de dólares ao longo de vários anos, desde 2008 - representa uma oportunidade para o governo do Japão demonstrar a sua seriedade acerca dos novos regulamentos. O CEO da Toshiba, Hisao Tanaka, e outros altos executivos tiveram de renunciar; o CEO interino pediu desculpas ao governo de Abe; Norio Sasaki, vice-presidente da empresa e ex-CEO, deixou os seus cargos em painéis governamentais; e o ex-presidente do comité de auditoria da Toshiba demitiu-se do painel de contabilidade do governo.
Nos Estados Unidos, a Securities and Exchange Commission promulgou uma regra no início de Agosto, exigindo que as empresas públicas divulguem a diferença de remuneração entre trabalhadores e CEO. O comportamento empresarial e a governação tornaram-se temas de campanha para os candidatos presidenciais americanos. Hillary Clinton fez um discurso, no final de Julho, condenando o "capitalismo trimestral" que persegue o crescimento a curto prazo à custa do desenvolvimento de negócios sustentáveis, denunciando o crescimento exponencial da remuneração dos CEO, e defendendo a necessidade de aumentar o salário mínimo.
A União Europeia e os seus Estados-membros também estão a adoptar uma abordagem cada vez mais activa acerca da governação corporativa, incluindo regulamentos relativos à diversidade dos conselhos de administração. Itália, França, Espanha, Noruega e outros países promulgaram quotas de género nos conselhos de administração, obrigando as empresas a preencher 30-40% dos assentos independentes com mulheres. O exemplo mais recente chega da Alemanha onde, depois de muito debate, as novas quotas exigem que, a partir de 2016, as grandes empresas tenham 30% dos assentos no conselho não executivo ocupados por mulheres.
O terceiro factor, e talvez o mais importante, tem sido o forte aumento dos investimentos transfronteiriços. Fundos soberanos, fundos de pensões, bancos de investimento globais e hedge funds não investem apenas no seu próprio quintal. Eles percorrem o planeta à procura de lugares para colocarem o seu dinheiro, e esperam que as empresas que o recebem actuem de acordo com regras racionais.
O escândalo da Olympus em 2011-2012 - quando as investigações no Japão, Reino Unido e Estados Unidos revelaram que os executivos da empresa falsificaram as contas para esconder perdas de 117,7 mil milhões de ienes - é um exemplo do confronto entre uma cultura corporativa fechada e o escrutínio internacional. Revelado o escândalo, os investidores estrangeiros como o GIC Private Limited (fundo soberano de Singapura) rebelaram-se.
Singapura vendeu quase toda a sua participação de 2% imediatamente, e outros investidores estrangeiros e analistas reagiram de forma semelhante. Foi um ponto de viragem para o Japão, na medida em que a sua cultura de investimento fechada se viu confrontada com os padrões globais de contabilidade e de transparência. As coisas nunca mais foram as mesmas, tanto para o Japão como para o entendimento das empresas sobre as expectativas e influência dos investidores estrangeiros.
Os investidores internacionais estão numa posição única para incentivar, ou mesmo reforçar, as melhores práticas globais de governação corporativa. Se esses investidores mostrarem que estão dispostos a retirar o seu financiamento, vão ganhar influência real na promoção de uma mudança sustentável - para o benefício de todos nós.
Isto é especialmente verdadeiro se os investidores estiverem orientados por princípios que vão além do retorno financeiro. Fundos globais que sustentam elevados padrões éticos relativos a práticas trabalhistas e proteção ambiental são a salvaguarda do ecossistema global de que eles, e todos nós, dependem. Se eles estabelecem e aplicam esses princípios, o impulso resultante altera a governação corporativa e o comportamento em todos os sectores e regiões.
Isto é evidente em vários casos. O CalPERS (sistema de pensões dos funcionários públicos da Califórnia), um fundo de pensões de 300 mil milhões de dólares, publicou os seus princípios de governação corporativa, que incluem a diversidade do conselho de administração, práticas trabalhistas justas e proteção ambiental. O Norges Bank Investment Management, fundo soberano da Noruega de 870 mil milhões de dólares (o maior do mundo), também tem feito esforços para mudar as regras de governação, incluindo a separação do papel do presidente executivo e do presidente não executivo, e mais relatórios, por parte das empresas, sobre a forma como estão a abordar as alterações climáticas.
A ênfase nas melhores práticas de 'corporate governance' é real, e veio para ficar. Vem de pessoas que levantam as suas vozes, dos políticos que reconhecem a importância da governação corporativa para o crescimento económico sustentável e de investidores influentes que exercem uma pressão real sobre as empresas para que estas alterem o seu comportamento. As empresas e os quadros que ignorem esta tendência, estão a fazê-lo para o seu próprio mal.
Lucy P. Marcus é CEO da Marcus Venture Consulting.
Copyright: Project Syndicate, 2015.
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Tradução: Rita Faria