Opinião
A ligação francesa entre o clima e terror
Desde os ataques terroristas sangrentos de 13 de Novembro em Paris, a Cidade Luz tem estado praticamente sob lei marcial. Neste contexto submisso e desafiante, líderes mundiais reúnem-se na Conferência do Clima das Nações Unidas para discutir um novo acordo para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa. Desestabilizar as conversações poderia estar na agenda dos terroristas?
Parece certamente possível. Afinal, as condições ambientais severas nas regiões do Médio Oriente e do Norte de África, na região do Sahel, contribuem para o sentimento de desespero que alimenta do extremismo islâmico. Atendendo a isto, levar a cabo os ataques de forma a desestabilizar os esforços para melhorar estas condições – enquanto se avançam com outros objectivos dos terroristas, claro – poderia configurar-se como uma estratégia "vencedora".
A situação no Médio Oriente e no Sahel é certamente séria e urgente, com a rápida desertificação a devastar a economia pastoril e o sustento dos agricultores, dos pastores, dos nómadas, e daqueles que dependem destes. Esta combinação de degradação ambiental e económica criou condições férteis para movimentos islamitas criminosos, incluindo o Boko Haram na Nigéria, o al-Shabaad na Somália e no Quénia, e o Estado Islâmico no Iraque e na Síria. Onde as alterações climáticas ameaçam destruir profundamente o ambiente, os fanáticos uniram-se para destruir a civilização.
Estejamos certos, as alterações climáticas são sem dúvidas a causa primordial do extremismo islâmico. Economias falhadas, e ditaduras seculares brutais, juntamente com características étnicas profundamente enraizadas e contendas religiosas, potenciaram uma combinação volátil de medo, instabilidade e fúria. Mas ninguém deve duvidar de que o contexto do fanatismo tem sido sustentado pelas devastadoras condições ambientais que agora prevalecem em muitas zonas do Médio Oriente e do Sahel.
E essas condições deverão deteriorar-se no futuro, à medida que o rápido crescimento da população coloca ainda maior pressão sobre os recursos. O aumento acentuado das emissões de dióxido de carbono não foi gerado somente pela industrialização: as Nações Unidas esperam que a população mundial atinja os 9,7 mil milhões de pessoas em 2050 e os 11,2 mil milhões em 2100.
Esse crescimento vai ter lugar desproporcionalmente no mundo muçulmano, incluindo no Médio Oriente e no Sahel. De facto, os países com as taxas mais altas de fertilidade são predominantemente muçulmanos, liderados pelo Niger, com 7,6 nascimentos por mulher, seguido pela Somália, com 6,7 e Chade com 6. De acordo com o Pew Research Center, o número de muçulmanos no mundo vai quase ser equivalente ao de cristãos em 2070, e o Islão tornar-se-á a maior religião do mundo em 2100.
O rápido crescimento da população em países onde o ambiente não supre actualmente as necessidades das pessoas, e onde as economias mostram sinais insuficientes de virem a criar novas oportunidades de emprego, desenvolve-se um ambiente fértil para o fanatismo.
Consideremos o Mali, onde os militantes islamitas atacaram um hotel cheio de estrangeiros apenas uma semana depois dos ataques em Paris. As secas e a desertificação exacerbaram a pobreza – o PIB per capita do país é de apenas 765 dólares, colocando-o na 168º posição a nível mundial – e as condições de vida extremamente arriscadas reflectem-se na sétima maior taxa de mortalidade infantil do mundo: 123 em cada 1000 crianças não chegam ao quinto aniversário.
Em sociedades tão pobres, os sistemas de educação inadequados deixam as pessoas sem o conhecimento que precisam para melhorar a sua situação, como limitar o número de vezes que engravidam ou tirar partido de oportunidades que aumentem a produtividade económica. Acresce-se a isto um fornecimento de energia que é tudo menos fiável, muito menos limpa, e a gravidade da situação torna-se óbvia. Sob estas condições, não deveria ser surpreendente que o terrorismo islamita seja uma chaga persistente.
Resumindo, muito do Médio Oriente e do Sahel estão presos num ciclo vicioso de degradação ambiental, insucesso económico e islamismo extremista. A questão é como quebrar o ciclo.
A Cimeira do Clima de Paris será provavelmente uma batalha diplomática entre países por garantias que suportem o cumprimento dos seus compromissos para a mitigação e adaptação às alterações climáticas. Infelizmente, a concretização dos compromissos que serão feitos – particularmente em terras devastadas como na Somália, norte da Nigéria, e na província de Anbar, no Iraque – é inteiramente incerta.
O factor mais importante num esforço de longo prazo para salvar as sociedades no Médio Oriente e no Sahel da ruina ambiental e económica – com grandes implicações no combate ao extremismo islâmico – não será discutia em Paris. Esse factor é a Educação. Afinal, para melhorar as suas condições económicas e preservar o ambiente, as pessoas precisam de aceder a informação sobre métodos contraceptivos, agricultura moderna, práticas de culinária, e muito mais. E para melhorar as suas perspectivas económicas, é necessário que tenham o conhecimento e as capacidades que os empregadores procuram.
O ex-primeiro ministro britânico, Gordon Brown, enviado especial das Nações Unidas para a Educação Global, está a trabalhar de forma incansável para promover o acesso à educação entre os milhões de refugiados na região. É tempo de mais actores globais apoiarem este esforço, para que possa ser ampliado por todo o Médio Oriente e pelo Sahel.
A Educação é essencial para dar às populações constrangidas esperança de um futuro melhor. E a esperança é fundamental para contrariar o fascínio pelo extremismo, em todas as suas formas.
Yuriko Koike é ex-ministra da Defesa e conselheira de segurança nacional, foi presidente do Concelho Geral do Partido Democrático Liberal do Japão e é actualmente deputada do Parlamento japonês.
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Tradução: Inês Alves