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"Ask not what your country can do for you "*

Ao longo dos últimos anos, tem-se assistido a uma espiral de notícias sobre a persistente degradação da situação económica de Portugal, particularmente visível em termos relativos com a de outros países da Europa. Analisando os factos e as...

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Ao longo dos últimos anos, tem-se assistido a uma espiral de notícias sobre a persistente degradação da situação económica de Portugal, particularmente visível em termos relativos com a de outros países da Europa. Analisando os factos e as projecções:

1. Fomos e seremos o país mais pobre da Zona Euro em termos de PIB per capita: a 31 de Dezembro de 2008, Portugal era o mais pobre da zona Euro. A entrada da Eslováquia, a 1 de Janeiro de 2009, permitiu dizer que éramos o penúltimo quando saíram os dados oficiais do Eurostat, mas segundo o que o FMI previu e este jornal anunciou a 2 de Outubro último, a Eslováquia ultrapassará Portugal já em 2010, pelo que voltaremos ao fim da lista. Noutra nota, o World Factbook da CIA indica que a Grécia, que possuía um PIB per capita inferior ao Português na viragem do século, e com quem a imprensa nacional gostava de nos comparar, estava, em 2008, 44% acima de Portugal. Quarenta e quatro por cento acima do nosso país! De facto, há muito tempo que não se ouvem comparações com a Grécia;

2. Esta descida não é só de agora nem apenas contra "os suspeitos do costume", mas em relação ao conjunto de toda a média comunitária: segundo a Euromonitor, em PIB per capita, Portugal passou de 71,6% da média da Zona Euro para 66,6% (o padrão de comportamento é o mesmo se ampliarmos a toda a União Europeia: de 80,8% para 72,3%), tendo descido em termos relativos todos os anos;

3. Na óptica das empresas, o cenário não é melhor: na comparação destas com as congéneres Espanholas, em finais de 2008, as empresas Portuguesas já só representavam cerca de 8% do valor total das grandes empresas ibéricas (sendo consideradas as empresas com facturações superiores a 500 milhões de euros, com estimações para as empresas não cotadas). Ou seja, 92% do valor era representado por empresas Espanholas. No que concerne aos principais pilares da economia, apenas duas empresas Portuguesas conseguiam entrar no pódio dos seus sectores (em ambos os casos, com o bronze);

4. Prospectivamente, este outlook negativo não indicia reversão: foi anunciado neste jornal, no passado dia 4 de Novembro, que a Comissão Europeia estima que Portugal registará, em 2010, a menor taxa de crescimento das exportações (0,7%) de toda a União Europeia (UE), o que contribuirá para uma estabilização do défice externo num valor possivelmente superior a 10% do PIB, o maior da UE.

Parafrasear o discurso inaugural de John F. Kennedy não é algo que se faça levianamente. Pareceu-me adequado, dado que muito do que se pode fazer para mudar a tendência diagnosticada reside em cada um dos nossos gestores, reconhecidos como muito capazes, mas que não têm conseguido mudar o rumo macro da Nação. Existem (pelo menos!) quatro acções que qualquer gestor pode encetar (nenhuma delas fácil, todas elas da responsabilidade de qualquer gestor):

1. Ofereça proactivamente a sua perspectiva ponderada do que seria necessário para a sua organização duplicar de tamanho. Arrojado? Não está no manual de funções? Paciência. Estamos cada vez mais pequenos em termos relativos: a forma de sair é crescer, apoiar as "grandes" empresas Portuguesas a serem grandes empresas europeias ou mundiais e as famigeradas nano-mini-micro-pequenas-e-médias empresas a saírem desta toponímia. Com certeza que algumas - muitas - ficarão pelo caminho, mas na base das ideias fundamentadas dos gestores estará a génese do crescimento futuro. É útil seguir uma linha de raciocínio de: "O que é que sabemos fazer bem? (ou seja, qual é o nosso core business?); "Como obter o máximo rendimento desse core business"?; "Que negócios adjacentes devemos explorar?"; "Em Portugal ou noutros sítios?".

2. Vá falar com os seus clientes. Pergunte-lhes se recomendariam a sua empresa, e pergunte-lhes porquê. Pergunte-lhes o que é que poderia fazer para que a sua experiência melhore, e tente aprofundar as verdadeiras razões das respostas (para além do politicamente correcto, que tantas vezes enviesa a procura de mercado primária e as sondagens eleitorais). Essa é a essência de "A Pergunta Definitiva", que documenta de forma científica a melhor forma de compreender os seus clientes e, consequentemente, crescer de forma orgânica.

3. Ajude a "limpar" a complexidade na sua organização. Saber quem faz o quê ajuda a fazer as coisas acontecer e a tornar a vida mais fácil a quem trabalha consigo. A "Harvard Business Review" publicou há uns anos um artigo chamado "Quem tem o "D"?", que apresenta uma metodologia à prova de bala desenvolvida pela Bain, identificando claramente para cada processo-chave da organização: quem tem a responsabilidade pela decisão (o "D"), quem tem que fazer a recomendação sobre a qual se toma a decisão (o "R"), quem tem que dar o seu acordo - ou, inversamente, quem pode vetar - (o "A"), quem tem que ser ouvido para dar o seu input (o "I") e quem tem que executar (o "P" de "perform"). A metodologia foi baptizada como "RAPID". Nos casos em que foi implementada, a simplificação e eficácia da tomada de decisão cresceram exponencialmente.

4. Reconheça e premeie o mérito na sua equipa. Costuma ler-se que "em Portugal a culpa morre solteira" (expressão notável). Ora, o reverso da medalha também é verdadeiro - existe a tendência para não destacar ninguém, para não ferir susceptibilidades (recorde-se o exemplo recente da avaliação dos funcionários públicos, em que todos eram bons e muito bons). Por essa razão, e porventura outras, não se sabe quem inventou a "Via Verde" ou o "Multibanco" como o conhecemos: temos muito orgulho destas inovações, mas o mérito também parece morrer solteiro. Este reconhecimento passa por começar a ponderar sistemas de incentivos, tangíveis e intangíveis, que se liguem às variáveis de negócio e que permitam conhecer e premiar os bons desempenhos.

Se já está a fazer todas estas coisas - parabéns! Por favor, não pare.

Para terminar, parafraseando o final do mesmo discurso, peçam-nos os mesmos elevados níveis de esforço e sacrifício que vos pedimos. Com uma consciência limpa como única recompensa certa, com a História como juiz final das nossas acções, deixem-nos seguir em frente para mostrar o caminho neste nosso País, sabendo que aqui o trabalho a fazer terá que ser feito por todos e cada um de nós.


* Não perguntem o que o vosso país pode fazer por vocês...

Partner da Bain & Company
joao.soares@bain.com

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