Opinião
Quando o preço do petróleo ajuda...
Se tivermos em consideração que, em 1990, o investimento estrangeiro global correspondia a 63% do PIB mundial e que, em 2006, já equivalia a 150% deste, facilmente concluímos que, em 15 anos, os modelos e os paradigmas económicos e financeiros foram profu
Para que estas alterações fossem tão profundas e significativas, muito contribuíram os denominados Países do Conselho de Cooperação do Golfo – Emirados Árabes Unidos, co-liderados por Abu Dhabi e Dubai, assim como o Bahrein, Kuwait, Qatar, Omã e Arábia Saudita. Precisamente aqueles países que, nos últimos tempos, têm sido beneficiados com a alta do petróleo e que, revelando um apurado sentido estratégico e de oportunidade, investiram cerca de 2000 mil milhões de dólares no estrangeiro e que, em 2020, terão atingido o colossal número de 8500 mil milhões, liderando, hoje, a lista dos principais credores mundiais!
O mundo, entretanto, ficou mais pequeno. A globalização transporta-nos para novos desafios, aproximando povos e culturas, permitindo um crescimento exponencial do conhecimento, interligando economias, promovendo o aparecimento de novas oportunidades, relativamente às quais os países do Golfo têm estado particularmente activos, gerindo com bom-senso e enorme pragmatismo os excedentes de liquidez que o petróleo tem proporcionado e que, ironicamente, têm sido, em simultâneo, um problema e uma ajuda para a economia mundial.
Os Fundos Financeiros Soberanos com origem nos países produtores de petróleo, detidos por estados e não por particulares – ainda que nos países do Golfo, saber onde termina o Estado e começa a esfera privada da Família reinante, ou vice-versa, seja uma tarefa bastante complexa ou mesmo impossível – têm vindo a ser notícia, pelas melhores razões. O impacto destes Fundos na economia mundial é incontornável e revela, pelos valores envolvidos e pelo potencial dos investimentos efectuados, que quem tem sido beneficiado com a alta do petróleo tem, também, contribuído para a resolução de algumas situações, por vezes muito difíceis, que os mercados ocidentais, nomeadamente nos Estados Unidos e na Europa, têm sido confrontados.
Sabemos, por exemplo, que os investimentos efectuados por estes países – e a rapidez com que os fizeram – em algumas instituições financeiras norte-americanas e suíças, como o Citigroup e a UBS, foram cruciais para atenuar o impacto negativo da crise do crédito hipotecário de alto risco. E aqui o maior protagonista tem sido o Abu Dhabi Investment Authority, dos Emirados Árabes Unidos, que dispõe de 875 mil milhões de dólares e é, nesta data, o maior Fundo Soberano do mundo, seguido de perto pelo Reserve Fund for Future Generations, do Kuwait, e pelo Saudi Arabian Monetary Agency, da Arábia Saudita, com cerca de 250 mil milhões cada um.
Mas, estes países estão a jogar, simultaneamente, em vários tabuleiros. O Dubai começa a afirmar-se como um dos melhores e mais sofisticados destinos turísticos do mundo. O governo de Abu Dhabi anunciou, recentemente, investimentos de 15 mil milhões de dólares em projectos de energias renováveis (é apenas a primeira fase, o que revela que quem produz petróleo está a preparar-se, inteligentemente, para as alternativas...). Os projectos imobiliário-turísticos mais apetecíveis, um pouco por toda a Europa e Estados Unidos, são disputados pelos Emirados, estando Portugal na “short-list”. Alguns dos principais e mais emblemáticos activos imobiliários de Londres e Nova Iorque já transitaram para fundos com origem no Golfo. No Fórum da Aliança de Civilizações, realizado em Madrid no início do corrente ano, o Emir do Qatar, através da sua mulher, fez uma doação de 100 milhões de dólares (aliás, idêntica à efectuada pela Rainha Noor da Jordânia), destinada à concretização de uma rede de apoio à criação de postos de trabalho para os jovens do Médio Oriente e do Norte de África, com a apoio do Banco Mundial.
Os petro-dólares originam fluxos financeiros, cada vez mais significativos e cada vez mais regulares, para o mundo ocidental, representando um poderoso e eficaz instrumento, no seu destino, para a regularização de algumas situações difíceis e potenciando, na sua origem, negócios com excelentes retorno, aproveitando e articulando, da melhor maneira, o excesso de liquidez com as acções e demais activos a preços convidativos.
Com os problemas do “subprime” americano ainda não digeridos pelos operadores financeiros; com a ânsia de protagonismo do Presidente francês no cenário internacional; com o arrefecimento da economia espanhola e a crise latente no seu mercado imobiliário, percebem-se bem as recentes visitas de George Bush e Sarkozy aos países do Golfo, ou a oportunidade da “escala técnica”, na noite de passagem-de-ano, que o Rei de Espanha efectuou no Kuwait.
É que, no tempo e na circunstância, o preço do petróleo ajuda mesmo!