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Quando a subida de impostos é uma boa notícia

Com a publicação do já denominado PEC II, através da Lei 12-A/2010, que viu a luz do dia a 30 de Junho, muitas empresas puderam respirar de alívio.

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Não porque tivessem constatado que a célebre tributação das mais-valias mobiliárias não constava do diploma, mas porque o IVA subiu mesmo.

O contra-senso é apenas aparente. O alívio não resulta da subida, resulta da sua confirmação. Claro que os agentes de mercado não terão ficado satisfeitos por verem o consumo dos seus produtos ser ainda mais tributado. No entanto, por outro lado, puderam descansar ao confirmarem que o trabalho dos dias anteriores não tinha sido em vão.

Uma alteração das taxas do IVA implica sempre a adequação de processos, pessoas e sistemas para, por exemplo, enfrentar situações como as de encomendas feitas ao abrigo da taxa antiga e facturadas à taxa nova. Afectam-se pessoas, pedem-se conselhos para questões técnicas de fronteira, contratam-se alterações aos programas de facturação. Gasta-se tempo e dinheiro.

O projecto-lei foi tornado público pelo Governo a meio de Maio, foi votado a 2 de Junho e foi anunciada ao País a promulgação pelo Presidente da República no dia 28 do mesmo mês.

Ora, qual não foi a surpresa dos que, tendo-se preparado para a subida das taxas, folhearam na manhã dos dias 29 e 30 de Junho o DR, sem nele encontrarem qualquer referência ao PEC II.

Isto porque a sua publicação apenas ocorreu em Suplemento ao Diário da República, por volta das 16h30 do dia 30 de Junho, para entrar em vigor às zero horas do dia seguinte (i.e., escassas sete horas e trinta minutos antes do início da sua aplicação pelos agentes económicos).

Numa altura em que se assiste a retrocessos legislativos (veja-se o recente caso das Scut), e perante um documento que poderá estar ferido de inconstitucionalidade no que respeita às taxas de IRS, muitos se questionavam durante a manhã do dia 30 se o diploma entraria mesmo em vigor no dia seguinte.

À medida que as horas iam passando, ia aumentando a incerteza e as questões dos que, quanto ao dia seguinte, tinham apenas por segura uma das taxas de IVA: a taxa de 4% para as Regiões Autónomas. Será que a fiscalização a que se referia o Presidente da República era, afinal, preventiva, e não sucessiva? Seriam as novas taxas noticiadas em comunicado a publicar nos jornais, aplicando-se também ao IVA o mesmo conceito inovador de retroactividade e sendo o diploma apenas publicado depois da entrada em vigor das taxas? O Governo recuara, porque ouviu os que apregoam que este choque fiscal potenciar a recessão económica? Em suma, no dia seguinte teríamos ou não em vigor novas taxas de IVA?

A sete horas e meia da sua entrada em vigor, o diploma foi publicado. Agora, as taxas normal, intermédia e reduzida são de 21%, 13% e 6% no Continente e de 15%, 9% e 4% para as Ilhas, respectivamente.

Os mais previdentes, que se prepararam para as novas taxas, ficaram então aliviados por não ter de voltar a reestruturar os sistemas de facturação. Os menos cautos, que aguardavam a saída do diploma para se adaptarem a ele, tiveram então pouco mais de sete horas para a impossível missão de proceder aos devidos ajustamentos.

Acontece, porém, que esta situação ocorreu também com agentes absolutamente previdentes e diligentes. É que em muitas multinacionais não é possível alterar os sistemas sem autorização central e esta não é possível sem um fundamento seguro. Ora, sem a legislação publicada, inexistia tal fundamento seguro, pelo que a desejada autorização não era possível. Mais, se o fuso horário fosse desfavorável, a missão seria verdadeiramente impossível (pensemos, por exemplo, no caso do Japão).

Mas a questão não é apenas logística, mas igualmente de tempo para boa interpretação técnica. A título de exemplo, a disposição transitória constante do diploma, que derroga o n.º 9 do artigo 18.º do Código do IVA, relativamente às transmissões de bens e prestações de serviços de carácter continuado que, por norma, levanta muitas dúvidas quanto ao seu alcance, teve de ser interpretada e aplicada correctamente pelos sujeitos passivos, sob pena de incorrerem numa contra-ordenação.

Deste modo, quem não tiver cumprido com a nova redacção do artigo 18.º do Código do IVA, tendo emitido facturas, com data de 1 de Julho ou posterior, às taxas de IVA antigas, incorre assim em contra-ordenações e poderá ser sujeito a liquidações adicionais, coima e juros.

No entanto, e apesar das referidas sete horas, o facto é que formalmente a Lei foi cumprida ao longo de todo o processo legislativo e o diploma publicado no dia anterior à sua entrada em vigor. Desta forma, se pensarmos que às 23 horas e 59 minutos ainda seria dia 30 de Junho de 2010, vistas bem as coisas, sete horas e meia de antecedência até é de considerar um intervalo temporal generoso.



PricewaterhouseCoopers





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