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Numa época em que cada vez mais poderes vão sendo concedidos às chamadas forças da ordem, é preciso garantir o maior controlo sobre o uso dos mesmos.

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Gostaria por exemplo de ver ampliada a acção da IGAI, único instrumento concreto que pode dar resposta à velha questão: e quem nos protege dos nossos protectores?

Uma coisa é clara. Alberto Costa fez bem em demitir o anterior director da Polícia Judiciária. Pois se pouco sabemos sobre a sua postura antes desse facto, hoje conhecemos em demasia o que se seguiu. Não há dia em que Santos Cabral não venha para a praça pública com declarações, contra-declarações, polémicas com ministros, secretários de estado e tudo o que lhe apareça pela frente. E faz mal. Pois se como director da Judiciária já saiu bastante mal, agora começa a não andar nada bem como juiz do supremo, cargo que exige outra serenidade e distância da agitação do dia-a-dia da política.

Mas citando Hal, o computador do 2001, quando se prepara para exterminar a presença humana da nave: David, esta conversa já não tem sentido.

E não tem mesmo. A um certo nível da administração pública todos os cargos são temporários e podem ser substituídos a qualquer momento. E só quem não percebe isto, que é fundamental para a democracia, se pode queixar por ser despedido.

É certo que a falta de dinheiro não permite a ninguém brilhar. Basta olhar para o aspecto das esquadras, degradadas, com sinalética amadora e na maioria dos casos bastante ingénua, verdadeiros buracos lúgubres onde só se podem passar maus bocados. Mas há também muita coisa que não depende directamente do dinheiro, mas da educação cívica e de um mínimo de cultura e civilização. Ainda recentemente o país teve notícia de uma patética cauboiada (parece que é assim que se escreve em bom português) em Albufeira. Perante a fuga de um touro manso a GNR local mais não soube fazer do que abater o animal a tiro, em plena avenida principal da cidade, atingindo também de raspão um jovem mirone e a montra de uma loja. A galhofa que a notícia tem provocado, ornamentada com os sorrisos alarves dos «pivots» das televisões, é bem esclarecedora sobre o atraso mental que domina a nossa sociedade. A notícia, mais do que focar a paródia, devia servir para demonstrar o quanto a nossa polícia é incompetente para resolver qualquer assunto menos comum. Pois se até um elefante se anestesia com um dardo? Já para não falar da brutalidade com que se tratam os animais, outro sinal forte do primitivismo social vigente.

Aliás, a brutalidade, que predomina na cultura policial portuguesa, surge em muitas ocasiões com a única solução razoável quando não se têm nem os meios, nem os saberes para resolver as coisas de maneira civilizada.

Mas há mais. Ainda recentemente numa operação stop, louvável em si, o polícia que operava o chamado balão atirava os tubos de plástico para a berma da estrada. Nem sequer lhe passando pela cabeça que ao mesmo tempo que se esmerava a tentar prevenir o crime de condução sob o efeito do álcool, cometia ele mesmo um crime contra o meio ambiente, passível de multa.

E que dizer das luvas de látex que sistematicamente ficam nos locais de crime e nos desastres rodoviários, deixados por polícias e funcionários do INEM, a quem objectivamente falta um mínimo de educação cívica e ambiental. Sem esquecer os despojos das viaturas retorcidas que muito pacatamente são varridos para as bermas, ficando para ali a decorar a paisagem e a prometer futuros acidentes sempre que a força da natureza os arrasta de novo para o asfalto.

À polícia falta obviamente dinheiro, mas a quem é que não falta? Mas acima de tudo falta competência, educação e principalmente a noção de que na sua acção deve dar o exemplo do civismo e cumprimento da lei que exige ao comum do cidadão.

Também não sou favorável ao direito de greve para as polícias, nem militares já agora, e muito menos as marchas na rua com o seu folclore de insultos e ameaças. A polícia representa nas nossas sociedades um estatuto de excepção. Aquele que permite usar a violência, e a maior violência pois tem o direito de matar, contra todos os restantes cidadãos. Por isso a exigência só pode ser a maior. A polícia deve ter mais deveres do que direitos. E uma vigilância permanente e apertada de forma a minimizar os abusos que sempre existem.

Numa época em que cada vez mais poderes vão sendo concedidos às chamadas forças da ordem, é preciso garantir o maior controlo sobre o uso dos mesmos. Gostaria por exemplo de ver ampliada a acção da IGAI, único instrumento concreto que pode dar resposta à velha questão: e quem nos protege dos nossos protectores?

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