Opinião
Pessimismo ou optimismo na luta contra a evasão fiscal internacional?
Os pequenos passos que se vão dando no sentido de uma fiscalidade mais justa, à escala internacional, valem a pena e fazem crer que as coisas irão melhorando, a pouco e pouco, sem nunca porventura chegarem à perfeição que mentes mais radicais certamente almejam.
1. Muito discutida tem sido, nos últimos tempos, a problemática da fiscalidade internacional, sobretudo pelo que toca ao comportamento de sociedades multinacionais, com actividades espalhadas por vários Estados as quais, através de esquemas vários, incluindo acordos pouco transparentes com autoridades fiscais, conseguem taxas de tributações, à escala global, surpreendentemente baixas. Várias jurisdições se sentem prejudicadas por estes comportamentos, que muitas vezes resultam de insuficiências das regras de coordenação fiscal internacional, as quais nasceram e se desenvolveram num mundo ainda não globalizado como o actual e em que a liberdade de circulação de capitais e a economia digital não existiam ou estavam em fase incipiente.
Está aqui em questão a distribuição das receitas dos impostos entre as diferentes jurisdições. Vários casos escandalosos, a que os meios de comunicação internacional deram grande relevância – o caso Starbucks, no Reino Unido, o Luxleaks, os casos da Amazon e tantos outros – chamaram a atenção para os desvios de lucros que as multinacionais conseguem a fim de beneficiar de tratamentos de favor em jurisdições apropriadas, geralmente (mas não exclusivamente) nos designados paraísos fiscais.
2. Tem sido no seio da OCDE que têm vindo a efectuar-se os maiores esforços no sentido de criar mecanismos de coordenação internacional capazes de estabelecer uma mais equilibrada distribuição das bases de incidência entre as diferentes jurisdições.
Um relatório de 2105, intitulado "Base Erosion and Profit Shifting" – o relatório BEPS, como é correntemente designado – propôs a adopção de um conjunto de acções, que visa o combate à erosão da base tributária e ao desvio de lucros para jurisdições de baixa tributação. As quinze medidas ou acções propostas, em vários domínios, desde regras destinadas a evitar o abuso dos Tratados de Dupla Tributação (acção 6), passando pelo aperfeiçoamento das regras sobre preços de transferência (acções 8, 9 e 10) até à revisão, que se afigura crucial, do conceito de estabelecimento estável como elemento de conexão fulcral para a atribuição do direito ao imposto sobre os lucros a uma dada jurisdição (acção 7), constituem um conjunto equilibrado e tecnicamente sólido de regras susceptíveis de atingir o objectivo do combate a práticas de erosão das bases tributárias.
Embora com as dificuldades que já se esperavam, não há dúvida que alguns progressos têm sido feitos neste domínio, com a adopção, por vários Estados, de algumas das acções propostas. A experiência da OCDE no domínio da fiscalidade internacional tornou-a um foro adequado e respeitado para a preparação de novas regras de coordenação fiscal internacional, que não pode impor aos Estados, mas que são susceptíveis de serem por eles aprovadas.
3. Também pelo que toca à luta contra a evasão através dos paraísos fiscais alguns progressos têm sido feitos e são de esperar desenvolvimentos. O número de jurisdições não cooperantes – isto é, que se recusam prestar informações sobre capitais aí colocados – tem vindo a diminuir. Como se sabe, o carácter vicioso, ou mesmo criminogéneo, dos paraísos fiscais não está em terem taxas de tributação reduzidas ou nulas, mas antes e sobretudo na sua opacidade, na sua recusa de prestar informações sobre os beneficiários últimos dos "veículos" neles constituídos e respectivos valores, de modo a permitir aos Estados da residência exercer o seu direito ao imposto.
A troca de informações constitui assim um elemento fulcral na luta contra a evasão fiscal internacional. Em 2016, a União Europeia alterou uma sua directiva de 2011 sobre a troca automática de informações, alargando o âmbito da sua aplicação, de modo a obrigar os Estados membros em que tenham sede as sociedades-mãe de grupos multinacionais a trocarem, de modo automático com os outros Estados membros, elementos relevantes das declarações fiscais. Nos considerandos da directiva, menciona-se expressamente as recomendações da OCDE, constantes do relatório BEPS, o que mostra existir convergência de propósitos entre as duas organizações, um factor de esperança de desenvolvimentos futuros.
A troca de informações é essencial também na luta contra a evasão fiscal das pessoas físicas, mas essa troca de informações só é eficaz se for acompanhada, como é óbvio da utilização dessas informações pelas administrações fiscais competentes. A massa de dados hoje objecto de troca de informações é certamente imensa, mas de nada valerá se não puder ser utilizada para penalizar os infractores.
4. Também preocupa a evasão aos impostos que assume a natureza de fraude através da deliberada omissão ou falsificação dos rendimentos, ou até, mais radicalmente, a tentativa de se tornar invisível aos olhos das autoridades tributárias. Recentemente, em Março de 2017, a OCDE publicou um importante relatório sobre a utilização da informática na luta contra estas formas, diríamos mais primitivas, de evasão. Embora reconhecendo que a tecnologia também fornece aos contribuintes desonestos meio mais sofisticados de evasão, as autoridades tributárias podem e devem usar as novas tecnologias para contrariar tais práticas. O relatório, intitulado "Technology Tools to Tackle Tax Evasion and Tax Fraud" mostra que várias jurisdições obtiveram sucesso na prevenção da fraude fiscal, através do uso de tais tecnologias, recuperando milhares de milhões de euros de receitas fiscais.
5. Os pessimistas, apressados, dirão que estamos longe de conseguir que cada um pague o que é justo pagar e que cada Estado receba a sua fatia justa das receitas das actividades económicas que se prendem com o seu território. Para quem, todavia, conhece a complexidade destes problemas, as divergências de interesses entre as diferentes jurisdições, e as características das economias em que hoje vivemos, com liberdade de circulação de capitais e com comércio electrónico, os pequenos passos que se vão dando no sentido de uma fiscalidade mais justa, à escala internacional, valem a pena e fazem crer que as coisas irão melhorando, a pouco e pouco, sem nunca porventura chegarem à perfeição que mentes mais radicais certamente almejam.
Está aqui em questão a distribuição das receitas dos impostos entre as diferentes jurisdições. Vários casos escandalosos, a que os meios de comunicação internacional deram grande relevância – o caso Starbucks, no Reino Unido, o Luxleaks, os casos da Amazon e tantos outros – chamaram a atenção para os desvios de lucros que as multinacionais conseguem a fim de beneficiar de tratamentos de favor em jurisdições apropriadas, geralmente (mas não exclusivamente) nos designados paraísos fiscais.
Um relatório de 2105, intitulado "Base Erosion and Profit Shifting" – o relatório BEPS, como é correntemente designado – propôs a adopção de um conjunto de acções, que visa o combate à erosão da base tributária e ao desvio de lucros para jurisdições de baixa tributação. As quinze medidas ou acções propostas, em vários domínios, desde regras destinadas a evitar o abuso dos Tratados de Dupla Tributação (acção 6), passando pelo aperfeiçoamento das regras sobre preços de transferência (acções 8, 9 e 10) até à revisão, que se afigura crucial, do conceito de estabelecimento estável como elemento de conexão fulcral para a atribuição do direito ao imposto sobre os lucros a uma dada jurisdição (acção 7), constituem um conjunto equilibrado e tecnicamente sólido de regras susceptíveis de atingir o objectivo do combate a práticas de erosão das bases tributárias.
Embora com as dificuldades que já se esperavam, não há dúvida que alguns progressos têm sido feitos neste domínio, com a adopção, por vários Estados, de algumas das acções propostas. A experiência da OCDE no domínio da fiscalidade internacional tornou-a um foro adequado e respeitado para a preparação de novas regras de coordenação fiscal internacional, que não pode impor aos Estados, mas que são susceptíveis de serem por eles aprovadas.
3. Também pelo que toca à luta contra a evasão através dos paraísos fiscais alguns progressos têm sido feitos e são de esperar desenvolvimentos. O número de jurisdições não cooperantes – isto é, que se recusam prestar informações sobre capitais aí colocados – tem vindo a diminuir. Como se sabe, o carácter vicioso, ou mesmo criminogéneo, dos paraísos fiscais não está em terem taxas de tributação reduzidas ou nulas, mas antes e sobretudo na sua opacidade, na sua recusa de prestar informações sobre os beneficiários últimos dos "veículos" neles constituídos e respectivos valores, de modo a permitir aos Estados da residência exercer o seu direito ao imposto.
A troca de informações constitui assim um elemento fulcral na luta contra a evasão fiscal internacional. Em 2016, a União Europeia alterou uma sua directiva de 2011 sobre a troca automática de informações, alargando o âmbito da sua aplicação, de modo a obrigar os Estados membros em que tenham sede as sociedades-mãe de grupos multinacionais a trocarem, de modo automático com os outros Estados membros, elementos relevantes das declarações fiscais. Nos considerandos da directiva, menciona-se expressamente as recomendações da OCDE, constantes do relatório BEPS, o que mostra existir convergência de propósitos entre as duas organizações, um factor de esperança de desenvolvimentos futuros.
A troca de informações é essencial também na luta contra a evasão fiscal das pessoas físicas, mas essa troca de informações só é eficaz se for acompanhada, como é óbvio da utilização dessas informações pelas administrações fiscais competentes. A massa de dados hoje objecto de troca de informações é certamente imensa, mas de nada valerá se não puder ser utilizada para penalizar os infractores.
4. Também preocupa a evasão aos impostos que assume a natureza de fraude através da deliberada omissão ou falsificação dos rendimentos, ou até, mais radicalmente, a tentativa de se tornar invisível aos olhos das autoridades tributárias. Recentemente, em Março de 2017, a OCDE publicou um importante relatório sobre a utilização da informática na luta contra estas formas, diríamos mais primitivas, de evasão. Embora reconhecendo que a tecnologia também fornece aos contribuintes desonestos meio mais sofisticados de evasão, as autoridades tributárias podem e devem usar as novas tecnologias para contrariar tais práticas. O relatório, intitulado "Technology Tools to Tackle Tax Evasion and Tax Fraud" mostra que várias jurisdições obtiveram sucesso na prevenção da fraude fiscal, através do uso de tais tecnologias, recuperando milhares de milhões de euros de receitas fiscais.
5. Os pessimistas, apressados, dirão que estamos longe de conseguir que cada um pague o que é justo pagar e que cada Estado receba a sua fatia justa das receitas das actividades económicas que se prendem com o seu território. Para quem, todavia, conhece a complexidade destes problemas, as divergências de interesses entre as diferentes jurisdições, e as características das economias em que hoje vivemos, com liberdade de circulação de capitais e com comércio electrónico, os pequenos passos que se vão dando no sentido de uma fiscalidade mais justa, à escala internacional, valem a pena e fazem crer que as coisas irão melhorando, a pouco e pouco, sem nunca porventura chegarem à perfeição que mentes mais radicais certamente almejam.