Opinião
Optimismo é estupidez?
Por um conjunto de razões o optimismo tem sido o centro de vários debates em Portugal e fora. Em Portugal a Visão deu a capa de um dos seus números de Janeiro ao tema. A ideia: aprenda a ser optimista. Em reacção a este dossiê ou por coincidência, as respostas...
Por um conjunto de razões o optimismo tem sido o centro de vários debates em Portugal e fora. Em Portugal a Visão deu a capa de um dos seus números de Janeiro ao tema. A ideia: aprenda a ser optimista. Em reacção a este dossiê ou por coincidência, as respostas vieram de vários cronistas que basicamente sublinharam a equivalência entre o optimista e o pateta alegre. Mais pateta ou mais alegre, o optimista não deixa de ser um pateta alegre, em particular em Portugal onde, de acordo com os plumitivos, ninguém devia ter motivos para andar alegre. Como dizia Miguel Esteves Cardoso, "ser optimista é passar por estúpido". E o optimismo foi apresentado no Negócios como banha-da-cobra com resultados potencialmente trágicos.
Curiosamente, o debate nos países de língua inglesa foi espoletado pela publicação de um livro de Barbara Ehrenreich, Smile or Die, que associa muitos males da América à prevalência do espírito positivo, algo americano até à medula. A interpretação, deste lado do Atlântico, do optimismo americano é simples: os americanos são optimistas por serem frívolos e superficiais. Os europeus como nós são pessimistas por serem informados e profundos. Esta interpretação já a vimos também aplicada aos brasileiros, outros que não se deixam ir na superioridade da melancolia. A resposta ao argumento de Ehrenreich surgiu no Financial Times, com assinaturas de Luke Johnson e de Michael Skapinker. O optimismo, dizem, construiu a América e sem ele a América perderá a glória.
A que se deve tanta atenção ao optimismo? Aos tempos de crise, certamente, mas também ao trabalho de muitos autores da chamada psicologia positiva que têm enfatizado as vantagens de uma abordagem positiva da realidade. O optimismo surgiu neste âmbito, como um dos quatro ingredientes do chamado capital psicológico positivo, sendo os outros a auto-eficácia, a resiliência e a esperança. Podem ser trabalhados e melhorados e revelam associações com resultados pessoais e organizacionais desejáveis. Mas o que caracteriza afinal o optimismo?
O optimismo pode ser definido como uma característica cognitiva e emocional que estimula expectativas de resultado positivas e atribuições causais positivas. É motivado e motivador. Não tem apenas uma base cognitiva "fria", sendo igualmente dotado de uma componente emocional "quente", que estimula a acção. Porventura por estas razões, as vantagens decorrentes do optimismo são geralmente reconhecidas. Exerce impacto favorável sobre a saúde física e psicológica das pessoas. Influencia a persistência e a realização, facilitando o sucesso. E, não menos importante, reflecte e fomenta o bem-estar. Em contraste, o pessimismo conduz tendencialmente à passividade, ao fracasso, ao isolamento social, ao mal-estar psicológico.
Os três elementos que, com o optimismo, constituem o chamado capital psicológico positivo, são a esperança, o processo que reflecte a convicção de que um objectivo é alcançável e que podem ser definidos planos para tornar esse objectivo realizável; a resiliência, que se refere à capacidade de suportar adversidades e de recuperar após a ocorrência de desaires; e a auto-eficácia, a crença de se ser detentor das competências necessárias para alcançar um resultado desejado.
Como é evidente, os bons resultados não acontecem por alguém simplesmente acreditar que eles podem acontecer. É necessário que sejam acompanhados de trabalho, esforço e competência. Mas os maus resultados podem ser potenciados pelo facto de acreditarmos que os bons resultados não são possíveis. Ser optimista pode ser um exercício de ingenuidade, mas apostar no pessimismo é aceitar o fado que nos venha a calhar com a resignação de que não havia nada a fazer porque as coisas são o que são. A grande vantagem do pessimista é, no fundo, nada o surpreender: se as coisas estão mal, ele já o tinha previsto; se estão bem, é só esperar até ficarem mal. Em suma: os optimistas são os que fazem avançar o mundo, os pessimistas os que acabam por ter sempre razão.
Professor catedrático, Faculdade de Economia, Universidade Nova de Lisboa
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Curiosamente, o debate nos países de língua inglesa foi espoletado pela publicação de um livro de Barbara Ehrenreich, Smile or Die, que associa muitos males da América à prevalência do espírito positivo, algo americano até à medula. A interpretação, deste lado do Atlântico, do optimismo americano é simples: os americanos são optimistas por serem frívolos e superficiais. Os europeus como nós são pessimistas por serem informados e profundos. Esta interpretação já a vimos também aplicada aos brasileiros, outros que não se deixam ir na superioridade da melancolia. A resposta ao argumento de Ehrenreich surgiu no Financial Times, com assinaturas de Luke Johnson e de Michael Skapinker. O optimismo, dizem, construiu a América e sem ele a América perderá a glória.
O optimismo pode ser definido como uma característica cognitiva e emocional que estimula expectativas de resultado positivas e atribuições causais positivas. É motivado e motivador. Não tem apenas uma base cognitiva "fria", sendo igualmente dotado de uma componente emocional "quente", que estimula a acção. Porventura por estas razões, as vantagens decorrentes do optimismo são geralmente reconhecidas. Exerce impacto favorável sobre a saúde física e psicológica das pessoas. Influencia a persistência e a realização, facilitando o sucesso. E, não menos importante, reflecte e fomenta o bem-estar. Em contraste, o pessimismo conduz tendencialmente à passividade, ao fracasso, ao isolamento social, ao mal-estar psicológico.
Os três elementos que, com o optimismo, constituem o chamado capital psicológico positivo, são a esperança, o processo que reflecte a convicção de que um objectivo é alcançável e que podem ser definidos planos para tornar esse objectivo realizável; a resiliência, que se refere à capacidade de suportar adversidades e de recuperar após a ocorrência de desaires; e a auto-eficácia, a crença de se ser detentor das competências necessárias para alcançar um resultado desejado.
Como é evidente, os bons resultados não acontecem por alguém simplesmente acreditar que eles podem acontecer. É necessário que sejam acompanhados de trabalho, esforço e competência. Mas os maus resultados podem ser potenciados pelo facto de acreditarmos que os bons resultados não são possíveis. Ser optimista pode ser um exercício de ingenuidade, mas apostar no pessimismo é aceitar o fado que nos venha a calhar com a resignação de que não havia nada a fazer porque as coisas são o que são. A grande vantagem do pessimista é, no fundo, nada o surpreender: se as coisas estão mal, ele já o tinha previsto; se estão bem, é só esperar até ficarem mal. Em suma: os optimistas são os que fazem avançar o mundo, os pessimistas os que acabam por ter sempre razão.
Professor catedrático, Faculdade de Economia, Universidade Nova de Lisboa
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