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Pedro Santos Guerreiro psg@negocios.pt 08 de Fevereiro de 2008 às 15:08

O proteccionismo ao contrário

Como qualquer monopolista natural, a EDP colhe agruras sempre que um regulador se agita. Sempre? Bem, a partir de ontem a EDP pode agradecer à ERSE ter-lhe posto o pé na porta do mercado espanhol. E em que é que isso melhora a vida dos consumidores? Em al

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Como qualquer monopolista natural, a EDP colhe agruras sempre que um regulador se agita. Sempre? Bem, a partir de ontem a EDP pode agradecer à ERSE ter-lhe posto o pé na porta do mercado espanhol. E em que é que isso melhora a vida dos consumidores? Em algumas coisas...

Muitos pequenos investidores ainda se lembram quando, há quase uma década, a Entidade Reguladora para os Serviços Energéticos impôs uma redução nas tarifas tal que afundou as cotações em Bolsa. Na altura, havia tantos portugueses com acções da EDP como há hoje funcionários públicos, o que causou a esquizofrenia de ter metade do país a elogiar as tarifas baixas para as casas e a outra metade a reclamar lucros altos para as acções.

Mas agora não há qualquer bipolaridade: a EDP é um operador dominante na produção e comercialização de electricidade em Portugal; e o mercado ibérico da electricidade (Mibel) não funciona. Sim, estas surpreendentes notícias foram dadas ontem pelo conselho de reguladores do mercado ibérico.

Mas não foi apenas um conjunto de evidências, aquilo que os reguladores reconheceram (ver páginas 12 e 13 desta edição). De facto, após um ano e meio desde que troou o clarim do Mibel, os consumidores domésticos continuam a não sentir qualquer benefício nem têm possibilidade de escolha de fornecedores de energia. Porque não há, ainda, capacidade de interligação, ou seja, de os operadores "escoarem" electricidade desde o sítio onde a produzem (barragens, turbinas eólicas, centrais nucleares, etc.) até ao local onde a comercializam. Mas também por falta de concorrência, dizem os reguladores.

Na proposta feita aos governos, os reguladores vêm limitar a capacidade de crescimento das grandes empresas nos seus países: da EDP em Portugal; da Iberdrola, Endesa e Fenosa em Espanha. Na Península, resta crescer do outro lado da fronteira.

O "pé na porta" pela ERSE está em que, ao contrário da Iberdrola e da Endesa, a EDP não pode comprar energia em Espanha (excepto através da "sua" Hidrocantábrico que, lá está, não tem como "escoar" electricidade até Portugal).

É o princípio da reciprocidade. Que é, também, um teste ao instinto proteccionista do Estado espanhol. O documento ontem apresentado pelos reguladores destina-se mais aos governos que às empresas. As limitações previstas para a EDP até já estavam a ser assimiladas pela empresa, que não só já começou a fazer leilões de capacidade como, sobretudo, está a reduzir a dependência dos negócios ibéricos, investindo na Polónia, em França e sobretudo nos Estados Unidos.

A Endesa e a Iberdrola têm criticado, e bem, os entraves ao seu crescimento em Portugal. Mas nunca dizem que a EDP não pode sequer aceder ao mercado espanhol. Proteccionismo puro.

O recente caso do interesse da francesa EDF na Iberdrola é revelador deste proteccionismo nacionalista espanhol, cujo Governo já deu mostras de que está disposto a usar todos os anti-concepcionais para evitar o nascimento desse colosso de aquém e além Pirinéus. Já com o interesse dos alemães da E.ON na Endesa assim foi, com o prestimoso auxílio dos italianos da Enel.

Itália, Espanha e França são hoje faces do nacionalismo empresarial populista, fazendo leituras utilitárias do europeísmo que professam. O pior é quando outros, em Portugal, entendem que esse exemplo deve ser seguido. Fechar as fronteiras das empresas não é favorecer os cidadãos, é prejudicar os consumidores. Ser proteccionista não é ser mais esperto. É ser mais medroso.

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