Opinião
O fim da febre dos fenos
A principal candidata contra Shinzo Abe, o primeiro-ministro do Japão, propõe-se dar um passo mais na irredutível infantilização da política.
No cardápio de propostas, uma delas é a distribuição do já famoso rendimento básico universal garantido, uma espécie de remuneração para todos, trabalhem ou não, embora sem detalhes sobre o modo de pagar tamanha empreitada.
A outra é talvez ainda mais ousada: acabar com a irritante febre dos fenos. Sem tirar nem pôr: a febre dos fenos será dizimada para alívio dos milhões de sofredores alérgicos. Yuriko Koike, a adversária de Shinzo Abe, volta a não dizer como o fará, limita-se a chamar a este pacote de políticas públicas "doze zeros". Além do "zero febre dos fenos", zero carruagens de metro a abarrotar de pessoas à hora de ponta, zero aumento de impostos sobre o consumo, um "must" nipónico, e por aí em diante, embora também zero informação sobre o modo e a capacidade de execução deste exótico delírio eleitoral.
Além de ficar outra vez demonstrado que não há limites de razoabilidade aos defensores dos amanhãs que cantam, há outro lado do problema que também me interessa. Não há eleições sem promessas extravagantes. O eleitoralismo, em maior ou menor grau, é parte intrínseca da democracia, faz parte da natureza do sistema e, embora bem longe de Tóquio e das respetivas idiossincrasias, marcará também os dois anos que viveremos em Portugal até chegarmos às legislativas de 2019.
Ou serão já em 2018? Desde domingo passado que me parece cada vez mais provável que as eleições sejam antecipadas. O PCP lambe as feridas provocadas pela hecatombe autárquica e não lhe resta outro caminho que não seja dar prova de vida nas ruas. Depois da pacatez dos últimos anos, começa a cheirar a greves, paralisações e ameaças. Até na Autoeuropa, locomotiva do país que produz e exporta, a lista da CGTP, não tendo ganho as eleições para a comissão de trabalhadores, será determinante nas negociações com a administração da empresa.
O Bloco de Esquerda, embora de forma menos evidente e mais hábil, também tem caminho a fazer. Para já, basta-lhe reivindicar como suas as partes mais suculentas do Orçamento do Estado. Esta semana que passou foi o IRS, os dois novos escalões que estavam para voltar apenas em 2109, mas e depois, como será? O que exigir mais a António Costa? Basta olhar de relance para o que está sobre a mesa para compreender que o ciclo económico e o resultado nas autárquicas acelerou o metabolismo orçamental.
O aumento do mínimo de existência e das pensões, mais salário mínimo, a devolução integral da sobretaxa para todos, os tais novos escalões de IRS - embora alisados no topo da pirâmide com menos deduções e benefícios fiscais -, o descongelamento mais veloz das carreiras na função pública incluindo pagamento mais favorável das horas extraordinárias, além das pressões setoriais na saúde, educação, segurança e justiça. Uma lista de compras impressionante.
Perante esta avalancha, o governo tornou-se vítima do próprio sucesso. Tudo o que dará agora, já não poderá voltar a dar em 2019, o que o enfraquecerá em ano eleitoral. Ou seja, o êxito atual tem implícita a semente dos problemas seguintes. Acresce que os indicadores económicos provavelmente atingiram o pico: o défice público deste ano talvez fique bem próximo de 1% do PIB, o desemprego, embora continue a cair, terá um curva descendente mais suave, o investimento público será menos saliente e o crescimento económico dificilmente será tão bom em 2018 como em 2017 - mais de 2,5% do PIB é deveras único.
Ora bem, perante dois partidos reticentes e em luta pela sobrevivência, Bloco e PCP, e um contexto financeiro e económico extraordinariamente favorável, além de um líder pintado de fresco no PSD, não consigo imaginar o que pode levar António Costa a levar a legislatura até ao fim, correndo o risco de ter de prometer o que o país não tem condições para oferecer: gastos públicos sem fim à vista. Talvez o fim da febre dos fenos seja, na altura, a única oferta viável do PS.
Este artigo está em conformidade com o novo acordo ortográfico
A outra é talvez ainda mais ousada: acabar com a irritante febre dos fenos. Sem tirar nem pôr: a febre dos fenos será dizimada para alívio dos milhões de sofredores alérgicos. Yuriko Koike, a adversária de Shinzo Abe, volta a não dizer como o fará, limita-se a chamar a este pacote de políticas públicas "doze zeros". Além do "zero febre dos fenos", zero carruagens de metro a abarrotar de pessoas à hora de ponta, zero aumento de impostos sobre o consumo, um "must" nipónico, e por aí em diante, embora também zero informação sobre o modo e a capacidade de execução deste exótico delírio eleitoral.
Ou serão já em 2018? Desde domingo passado que me parece cada vez mais provável que as eleições sejam antecipadas. O PCP lambe as feridas provocadas pela hecatombe autárquica e não lhe resta outro caminho que não seja dar prova de vida nas ruas. Depois da pacatez dos últimos anos, começa a cheirar a greves, paralisações e ameaças. Até na Autoeuropa, locomotiva do país que produz e exporta, a lista da CGTP, não tendo ganho as eleições para a comissão de trabalhadores, será determinante nas negociações com a administração da empresa.
O Bloco de Esquerda, embora de forma menos evidente e mais hábil, também tem caminho a fazer. Para já, basta-lhe reivindicar como suas as partes mais suculentas do Orçamento do Estado. Esta semana que passou foi o IRS, os dois novos escalões que estavam para voltar apenas em 2109, mas e depois, como será? O que exigir mais a António Costa? Basta olhar de relance para o que está sobre a mesa para compreender que o ciclo económico e o resultado nas autárquicas acelerou o metabolismo orçamental.
O aumento do mínimo de existência e das pensões, mais salário mínimo, a devolução integral da sobretaxa para todos, os tais novos escalões de IRS - embora alisados no topo da pirâmide com menos deduções e benefícios fiscais -, o descongelamento mais veloz das carreiras na função pública incluindo pagamento mais favorável das horas extraordinárias, além das pressões setoriais na saúde, educação, segurança e justiça. Uma lista de compras impressionante.
Perante esta avalancha, o governo tornou-se vítima do próprio sucesso. Tudo o que dará agora, já não poderá voltar a dar em 2019, o que o enfraquecerá em ano eleitoral. Ou seja, o êxito atual tem implícita a semente dos problemas seguintes. Acresce que os indicadores económicos provavelmente atingiram o pico: o défice público deste ano talvez fique bem próximo de 1% do PIB, o desemprego, embora continue a cair, terá um curva descendente mais suave, o investimento público será menos saliente e o crescimento económico dificilmente será tão bom em 2018 como em 2017 - mais de 2,5% do PIB é deveras único.
Ora bem, perante dois partidos reticentes e em luta pela sobrevivência, Bloco e PCP, e um contexto financeiro e económico extraordinariamente favorável, além de um líder pintado de fresco no PSD, não consigo imaginar o que pode levar António Costa a levar a legislatura até ao fim, correndo o risco de ter de prometer o que o país não tem condições para oferecer: gastos públicos sem fim à vista. Talvez o fim da febre dos fenos seja, na altura, a única oferta viável do PS.
Este artigo está em conformidade com o novo acordo ortográfico
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