Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Opinião
31 de Maio de 2016 às 09:45

Nobre Guedes: Uma geração atraiçoada e excepcional

Há quem lhe chame geração atraiçoada. Penosamente, é a geração dos nossos filhos.

  • 1
  • ...

Paradoxalmente, é uma geração excepcional. Filhos de uma crise que não mereciam. Netos de uma esperança sempre adiada. À minha geração , fica a enorme amargura de ter tido todas as oportunidades e  de nada, ou quase nada, termos sabido aproveitar. Perdido o império, foi-nos dado o legado da Europa. Mas, há 30 anos que Portugal  é incapaz de  definir uma  estratégia. Parece  não entendermos o novo mundo global do século XXI  .

 Portugal tem de começar por entender o seu papel no mundo. O  nosso futuro passa por África e pelo Brasil. Esta é uma constatação que é , afinal, o maior dos lugares comuns. Por todos é reconhecido. Mas, por muito poucos é assumido e vivido. No século XXI e neste mundo global, Portugal tem  mais um novíssimo desafio - entender o nosso parceiro ibérico  e  abrir novos horizontes para a América Latina. É como parceiro privilegiado nesta triangulação e como País atlântico e lusófono que Portugal se deve afirmar na Europa. Queremos ser europeus e reconhecemos que esse é um espaço de prosperidade privilegiado, mesmo com todas as suas contradições. Mas temos uma vocação universal que é única. Aí está a nossa riqueza,  a nossa afirmação e a nossa  diferença. Mas multiculturalismo é muito mais que pontuais vantagens empresariais. É um novo mundo que temos de ter o engenho e a arte de aceitar, perceber e  integrar. 
 
Portugal não é mais um País rural, atrasado e retrógrado. Mas, constatar essa realidade é pouco , ou quase nada . Portugal tem de mudar e melhorar . Para isso, Portugal tem de aceitar o desafio do reformismo. Diria mesmo, do mais ousado reformismo. Há décadas que identificamos as reformas estruturais. Mas padecemos de uma enorme resistência à mudança. As reformas devem focalizar-se em  áreas nevrálgicas. Na estrutura administrativa do País (a mesma há 200 anos). Na (re)dignificação do serviço público. Na introdução de competitividade nas estruturas do estado social. Na gestão eficiente da Justiça. Na reforma firme da Segurança Social. Reformismo, em Portugal, é facilmente confundido com menor sensibilidade social. Este será mais um equivoco a vencer. Mas, assumir estes ventos de mudança, muitas vezes de ruptura, é , com certeza, ter capacidade de resistência a forças de bloqueio, desde há muito, enraizadas. 

Acima de tudo, urge uma mudança de mentalidades. A sociedade continua profundamente condicionada pelas desventuras de um passado conturbado. Conceitos como risco, mérito, ambição, empreendedorismo, competitividade, tolerância e diferença passarão a ser o léxico nacional. É este mundo de permanente incerteza e conquista que as novas gerações  estão preparadas para enfrentar e vencer. Estas  novas gerações não querem partir e imigrar. Mas, e bem, não se conformam com uma sociedade que só lhes oferece mediocridade e resignação. Estas novas gerações são profundamente solidárias. São as primeiras a, também, ter como prioridade lutar contra tanta pobreza, sofrimento e solidão que não fomos capazes de erradicar. Estas gerações aprenderam a ser ousadas. A reindustrialização é uma aposta inadiável. Assim, entre outros, conceitos como economia circular, economia digital ou biotecnologia , também, deveriam fazer parte do nosso quotidiano. A nossa afirmação passa por aí.

A minha geração deveria aceitar um último  desafio. Sair da sua zona de conforto. Dar aos nossos filhos a riqueza incrível da experiência de uma vida. Assim,  as novas gerações não seriam mais  gerações  atraiçoadas. Mas passariam a ser gerações reconhecidas. Como nós fomos em relação a quem, antes de nós, nos deu tantas oportunidades . Tudo isto só é realizável se formos capazes de reinventar Portugal. E este sentimento tem de ser entendido como um novo desígnio nacional. 

Advogado

Ver comentários
Mais artigos do Autor
Ver mais
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio