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15 de Maio de 2012 às 23:30

Juízo à vista?

Na Europa é instrutivo verificar que as facilidades do euro deslumbraram demais sobretudo países passados quase directamente de longas ditaduras às liberdades e responsabilidades da democracia. Até nesses, porém, há tradições que tornam muito improvável o triunfo de populismos anti-democráticos.

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No fim da vida, enquanto a doença de Lou Gehrig (esclerose lateral amiotrófica) o ia isolando cada vez mais dentro da prisão do corpo, Tony Judt, judeu inglês residente nos Estados Unidos onde dirigia o Instituto Remarque da Universidade de Nova Iorque (criado com um legado da viúva do autor de "Nada de Novo na Frente Ocidental"), historiador da esquerda francesa e da Europa do post-guerra e intelectual polémico, com vontade e memória prodigiosas conseguiu ainda comunicar ao exterior vários textos luminosos sobre algumas questões cruciais do nosso tempo, que "The New York Review of Books" foi publicando, antes e depois da sua morte em Agosto de 2010.

Fragmento dado à estampa em número da revista saída em Março, vem a propósito no debate que agora se trava sobre a democracia na Europa, ou melhor, sobre os riscos que a austeridade estaria a fazer correr à democracia. Há quem verbere a imposição de governos tecnocráticos em Atenas e Roma pela ‘Europa’ (neste caso, Europa é a maneira de dizer Alemanha com anestesia) os quais procuram fazer cumprir medidas que arruinam cada vez mais a Grécia, dão também mau viver em Itália e, "mutatis mutandis", em Espanha e em Portugal. Se italianos e gregos tivessem governos eleitos, reflectindo as respectivas vontades populares, pretende-se, estes não apoiariam a austeridade (esquece-se que os governos português e espanhol foram eleitos e que o Presidente grego se desunha para chamar os eleitos do seu povo à razão, mas adiante).

Passo a citar Tony Judt. "Se se olha para a história das nações que maximizaram as virtudes que associamos à democracia, vê-se que vieram primeiro constitucionalidade, estado de direito e separação de poderes. A democracia veio quase sempre no fim. Se por democracia quisermos dizer o direito de todos os adultos a tomarem parte na escolha daqueles que os vão governar, isso veio mais tarde ainda" (e cita a Suíça e a França em seu abono).

Eleições recentes vigiadas pela chamada ‘comunidade internacional’, incapazes de levarem os países respectivos a governos viáveis ilustram o argumento de Judt – por exemplo, nem o Congo nem a Bósnia têm tradições de constitucionalidade, ou de estado de direito, ou de separação de poderes. E na Europa é instrutivo verificar que as facilidades do euro deslumbraram demais, sobretudo países passados quase directamente de longas ditaduras às liberdades e responsabilidades da democracia. Até nesses, porém, há tradições que tornam muito improvável o triunfo de populismos anti-democráticos.

O problema não está aí, mas na Alemanha de Merkel cuja visão curta e provinciana não dá para a chefia que os outros, França à frente, lhe concedem numa espécie de sonambulismo colectivo. Tal parece começar a mudar – até na Alemanha - e é um alívio. O major David dos Santos que dava matemática no Valsassina dizia-nos às vezes: "Ó Senhor, é bom ser burro, mas não tanto!" Lembrei-me dele no rescaldo de alguns Conselhos Europeus do último par de anos.

Embaixador

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