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O Finório II | opin 19 de Agosto de 2005 às 13:59

Fraudes (con)frades

«C Con», palavra inglesa, quer dizer fraude. Frade, palavra portuguesa, quer dizer irmão. Confrade poderia então significar «fraudes perpetradas por irmãos». Mas que tipo de fraudes? Aquelas que levam à valorização de algo através de simulação. Aquelas qu

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CONtracenar

À saída de um supermercado Américo (simulador A) posiciona-se estrategicamente perto da vítima. Aproximando-se de ambos, Boavida (simulador B), encontra ali mesmo à frente deles uma mala (prévia e estrategicamente posicionada) cheia de dinheiro. Américo reclama o achado para a si e para a vítima. Começam então a contracenar, discutindo a propriedade da coisa, com Boavida a ir concordando que está disposto a dividir o achado pelos três. Teatro atrás de teatro, concluem, depois, que estão ali para cima de 75 mil euros... e um papel que diz: «João, este é o teu quinhão do golpe, encontramo-nos amanhã no sitio combinado». É dinheiro sujo, portanto. Se é sujo, não pode reclamar-se. Se não pode reclamar-se, é nosso!

«Mais devagar» – recomenda Américo, afirmando ainda que é uma pessoa honesta e que precisa de certificar-se se o dinheiro pode ser dividido logo ali. Boavida oferece-se então para ligar ao seu advogado, com quem simula, depois, falar ao telemóvel. O advogado aconselha que, apesar de se tratar de dinheiro presumivelmente sujo, é melhor darem um certo tempo para ver se alguém o reclama. Boavida sugere então que seja a vítima a guardar o dinheiro em sua casa.

«Mais devagar» – recomenda Américo, afirmando que não conhece a vítima e como tal não lhe vai passar todo aquele dinheiro para as mãos assim sem mais nem menos. Boavida concorda. A vítima ofende-se, dizendo que é uma pessoa idónea. Américo diz-lhe não duvidar disso, mas sugere-lhe que dê uma prova de que tem facilidade em levantar dinheiro – prova de que não começará a fatiar o bolo por antecipação... Boavida acena em tom concordante e sugere que ele e Américo, entretanto, vão comprar também um pequeno cadeado ao supermercado. Começando a cheirar a cor do dinheiro, e após uma análise mais cuidada das notas, a vítima, empolga-se: «2 mil euros está bem para vocês?» Ambos, Américo e Boavida, mostram uma expressão de completa rendição...

Passado um bocado, a vítima aparece com o dinheiro. Américo diz-se convencido e coloca a maquia na mala, mesmo em frente à vítima. Entretanto, vira-se e abaixa-se para colocar o pequeno cadeado, apenas para que todos tenham a certeza de que a mala não será aberta. Só que a mala é trocada naquele preciso momento. A coisa fica, assim «equilibrada»: a pessoa que até nem precisa de dinheiro leva a mala; mas a mala leva um pequeno cadeado, cuja chaves ficam uma na posse de Américo e outra na posse de Boavida, para garantir a inviolabilidade do bolo.

A vítima afasta-se, rejubilando e levando consigo uma mala cheia de papel lá dentro, enquanto os confrades se preparam para repartir os 2 mil euros que jazem junto dos 75 mil falsos.

CONfirmar

Américo simula encontrar um anel de diamantes ao mesmo tempo que uma vítima, que o encontrou primeiro, se baixa já para o apanhar. Américo reclama o anel para ele, dizendo que já antes o havia topado. A vítima não concorda, olhando para Américo com desconfiança. Fazendo-se intimidado, Américo propõe-lhe então deixá-la partir com a jóia mediante o pagamento de uma pequena recompensa de 10% para sanar a dúvida levantada sobre quem achou primeiro. Faz umas pequenas contas e conclui que deverá levar 10% de 10 mil euros, ou seja mil euros. A vítima protesta, dizendo que o anel não vale aquilo.

Américo sugere então que ela avalie o anel ali naquela ourivesaria da esquina. Ele esperará por ela cá fora, uma vez que o seu aspecto não é lá muito católico. A vítima acede e o ourives, Boavida, avalia a jóia em 20 mil euros! A vítima, aldrabando, confirma a Américo o valor de 10 mil e entrega-lhe os mil. Ambos vão à sua vida.

Mais à frente, no seu caminho, a vítima é abordada por um maluquinho (julga ela) que lhe entrega um saco de moedas, dizendo que a ama. A vítima, achando a situação engraçada e vendo que o outro é inofensivo, acaba por pegar no saco sorrindo. Depois, a sua cara fica séria, ao ler um papel que atesta que aquelas moedas são de colecção e que pertencem a alguém cujo telemóvel e morada ali constam.

Intrigada, a vítima pergunta ao maluco se ele é aquele sujeito do papel. Ele responde que não. A vítima resolve então telefonar para o suposto dono das moedas raras. Este, de nome Américo, depois de lhe agradecer mil vezes, confirma que as moedas são raríssimas, e pede-lhe que ela dê uma pequena recompensa de 250 euros ao maluquinho e que devolva as moedas na morada indicada, pois uma recompensa de mil euros a espera. Ela assim procede, preparando-se para ganhar 750 com um esforço mínimo.

«Há dias de sorte» - pensa enquanto se dirige para casa do dono das moedas raras – «primeiro um diamante, agora uma recompensa»...

Algures noutra rua, Américo, Boavida e o maluquinho preparam-se para dividir o produto do dia: 1250 euros – 500 para Américo, 500 para Boavida e 250 para o outro.

Quanto à vítima, haverá de concluir que transporta duas falsidades: um anel falso e uma morada inexistente.

CONtratar

Paulo tem um empregado que quer despedir. Só que o empregado, que paga fortunas ao seu advogado, pede-lhe uma indemnização exorbitante. A coisa não sai deste impasse, arrastando-se há vários meses. Paulo até teria feito melhor negócio se logo ao início o tivesse despedido pelo tal valor exorbitante. Mas abriria um precedente em termos de referencial de indemnização.

Paulo contacta Paulo, seu amigo que trabalha no mesmo ramo, e pede-lhe que ofereça um ordenado principesco ao seu empregado. Depois, ver-se-á livre dele aproveitando os seis meses de período experimental da praxe. Paulo acede, desde que Paulo pague os cerca de cinco meses de salário implícitos na contratação. O empregado cai na esparrela, muda de emprego e é despedido no período experimental. Paulo oferece então um Corum Bubble Joker a Paulo, como prova da sua amizade...

Entretanto, a amante de Paulo combina-se com um comerciante do ramo automóvel para lhe comprar um TVR Cerbera, avaliado em cerca de 45 mil euros. Incentiva, então, o amante a oferecer apenas dois terços do preço pedido pelo bólide, dizendo que convencerá o comerciante a vendê-lo com esse desconto. Paulo, que está convencido de que brevemente se casará com a senhora, concorda.

A amante de Paulo faz a mesma proposta a Pedro, seu marido. Pedro concorda, igualmente convencido da sua genialidade para os negócios. Paulo e Pedro, em momentos separados, claro, entregam cada um um cheque de 30 mil euros ao comerciante, dizendo que aquele é o valor máximo que estão dispostos a pagar pelo carro.

Naturalmente, Paulo não sabe da oferta de Pedro e vice-versa. Os únicos que sabem que os patos em conjunto estão a oferecer 60 mil euros por um carro de 45 mil são os confrades - mulher e comerciante. Depois, dividem os 15 mil euros de troco com um cheque de 7.500 euros passado cuidadosamente pelo comerciante com uma Faber Castell - 240th Anniversary Limited Edition.

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