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Pode a Europa protestar que está a meter as contas em ordem. Mas não tem liderança. Ou, pelo menos, tem uma líder que opta por não liderar nem se deixar liderar. Não existe uma verdadeira equipa de gestão: apenas indecisas cimeiras.
Pode a Europa protestar que está a meter as contas em ordem. Mas não tem liderança. Ou, pelo menos, tem uma líder que opta por não liderar nem se deixar liderar. Não existe uma verdadeira equipa de gestão: apenas indecisas cimeiras.
Esta semana tivemos mais um "downgrade". Mais uma apreciação negativa da forma coma a Europa se deixa conduzir numa crise "global" da qual todas as restantes geografias aparentam estar a sair. Mais um coro de protestos "anti-rating" dos denominados "líderes" europeus cuja incapacidade de coordenação e de liderança atiram a Europa para uma morte lenta e dolorosa. Mais um atirar das culpas da crise para as "americanas" agências de "rating" (o facto de uma ser de capitais franceses não a livra deste euro-insulto). Mais do mesmo.
As agências de "rating", a par com os governantes, supervisores bancários e empresas de auditoria partilham responsabilidades na crise de 2008. A estas entidades competia regulamentar, no caso dos governos, e avaliar, no caso das restantes, os riscos tomados pelas instituições financeiras e respectiva cobertura com capitais próprios. Todos falharam. Mas, o falhanço das agências de "rating", envoltas em nebulosos conflitos de interesses, foi demasiado evidente. A sua credibilidade foi desfeita em pedaços. Entre colossais vagas de "downgrades", os mercados fugiam até dos papéis melhor notados. Todo o sistema independente de avaliação do risco de crédito estava em causa. A sobrevivência das três grandes não estava em causa. Mas a sua dominância sim.
Não surpreende, portanto, que as todas poderosas agências hajam optado por adoptar uma postura super-exigente e rigorosa. Havia que afastar o estigma de "professor benevolente" que distingue com boas notas os maus alunos para que estes não lhe dêem problemas. Havia que recuperar a reputação de rigor e exigência imprescindíveis à credibilização (e rendibilização) da sua actividade junto dos investidores, mesmo à custa de irritar os seus clientes (os emitentes). Assim o fizeram. Aliás, é caso para dizer que trataram de recuperar a respectiva credibilidade mais rapidamente do que a maioria dos governos do espaço europeu.
Uma análise de "rating" não é focada apenas nas contas do emitente. Estas traduzem, na melhor das hipóteses, um passado recente. O objectivo do "rating" é a previsão da capacidade de honrar os compromissos financeiros no futuro. Não no passado. Por isso, importa analisar os factores que ditarão a sustentabilidade futura do emitente. Começando pela respectiva liderança e equipa de gestão. A respectiva estratégia. A sua competitividade. As ameaças que enfrenta e oportunidades de que dispõe. A concorrência. Os seus recursos estratégicos.
Ora, bem pode a Europa protestar que está a meter as contas em ordem. Mas não tem liderança. Ou, pelo menos, tem uma líder que opta por não liderar nem se deixar liderar. Não existe uma verdadeira equipa de gestão: apenas indecisas cimeiras. Em vez de ter uma estratégia para combater a crise prefere responder pífiamente às sucessivas crises do que em as antecipar, resolvendo proactivamente os problemas. Está em progressiva perda de competitividade. A sua actividade cai, tornando mais difícil a sustentação da receita fiscal no futuro. O resto do Mundo, em contraste, dá sinais de crescer. Mas, acima de tudo, no "mercado" ninguém nela acredita. Olhando para os factores estratégicos e organizacionais de competitividade, esta Europa está, na realidade, pior do que a imagem dela pintada pelas agências de notação financeira.
Não há dúvida que este recente "downgrade" só desajuda a Europa a sair da crise. Mas não vale a pena cortar a cabeça ao portador das más notícias. Em vez de atacar as agências, melhor fariam os líderes europeus em abandonar ortodoxias monetárias e o medo de perder votos (por ajudar os países mal-comportados) e, de uma vez por todas, apresentar uma estratégia comum de ultrapassagem da crise de liquidez da Zona Euro, falando a uma só voz. Depois, uma vez ultrapassado o pior, seria então chegada a vez de arrumar a casa, fazendo os euro-perdulários pagar pelos custos que impuseram ao resto da União Europeia. Assim, apenas nos fazem perder tempo e dinheiro.
Professor da Universidade Nova de Lisboa
Assina esta coluna quinzenalmente à quinta-feira
Esta semana tivemos mais um "downgrade". Mais uma apreciação negativa da forma coma a Europa se deixa conduzir numa crise "global" da qual todas as restantes geografias aparentam estar a sair. Mais um coro de protestos "anti-rating" dos denominados "líderes" europeus cuja incapacidade de coordenação e de liderança atiram a Europa para uma morte lenta e dolorosa. Mais um atirar das culpas da crise para as "americanas" agências de "rating" (o facto de uma ser de capitais franceses não a livra deste euro-insulto). Mais do mesmo.
Não surpreende, portanto, que as todas poderosas agências hajam optado por adoptar uma postura super-exigente e rigorosa. Havia que afastar o estigma de "professor benevolente" que distingue com boas notas os maus alunos para que estes não lhe dêem problemas. Havia que recuperar a reputação de rigor e exigência imprescindíveis à credibilização (e rendibilização) da sua actividade junto dos investidores, mesmo à custa de irritar os seus clientes (os emitentes). Assim o fizeram. Aliás, é caso para dizer que trataram de recuperar a respectiva credibilidade mais rapidamente do que a maioria dos governos do espaço europeu.
Uma análise de "rating" não é focada apenas nas contas do emitente. Estas traduzem, na melhor das hipóteses, um passado recente. O objectivo do "rating" é a previsão da capacidade de honrar os compromissos financeiros no futuro. Não no passado. Por isso, importa analisar os factores que ditarão a sustentabilidade futura do emitente. Começando pela respectiva liderança e equipa de gestão. A respectiva estratégia. A sua competitividade. As ameaças que enfrenta e oportunidades de que dispõe. A concorrência. Os seus recursos estratégicos.
Ora, bem pode a Europa protestar que está a meter as contas em ordem. Mas não tem liderança. Ou, pelo menos, tem uma líder que opta por não liderar nem se deixar liderar. Não existe uma verdadeira equipa de gestão: apenas indecisas cimeiras. Em vez de ter uma estratégia para combater a crise prefere responder pífiamente às sucessivas crises do que em as antecipar, resolvendo proactivamente os problemas. Está em progressiva perda de competitividade. A sua actividade cai, tornando mais difícil a sustentação da receita fiscal no futuro. O resto do Mundo, em contraste, dá sinais de crescer. Mas, acima de tudo, no "mercado" ninguém nela acredita. Olhando para os factores estratégicos e organizacionais de competitividade, esta Europa está, na realidade, pior do que a imagem dela pintada pelas agências de notação financeira.
Não há dúvida que este recente "downgrade" só desajuda a Europa a sair da crise. Mas não vale a pena cortar a cabeça ao portador das más notícias. Em vez de atacar as agências, melhor fariam os líderes europeus em abandonar ortodoxias monetárias e o medo de perder votos (por ajudar os países mal-comportados) e, de uma vez por todas, apresentar uma estratégia comum de ultrapassagem da crise de liquidez da Zona Euro, falando a uma só voz. Depois, uma vez ultrapassado o pior, seria então chegada a vez de arrumar a casa, fazendo os euro-perdulários pagar pelos custos que impuseram ao resto da União Europeia. Assim, apenas nos fazem perder tempo e dinheiro.
Professor da Universidade Nova de Lisboa
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