Opinião
Eles estão ali?
Os criminosos da Croácia e da Sérvia continuam a monte, a integridade da procuradora do TPI ficou manchada e a estratégia negocial da União revela-se um incomensurável erro político.
Ronda o meio milhão a estimativa falível de entradas de imigrantes ilegais na União Europeia a cada ano que passa. No flanco mediterrânico Espanha e Itália estão na linha da frente, recebendo dois terços das entradas ilegais, e as recentes investidas sobre Ceuta e Melilla revelam um padrão indesejável.
As detenções de clandestinos em Espanha não sofreram alteração significativa desde 2002, tendo sido capturados 19 451 ilegais nos primeiros nove meses deste ano, mas o reforço da vigilância no estreito de Gibraltar e nas Canárias tornou mais perigosa a travessia e desviou as rotas de migração clandestina para os enclaves em Marrocos.
O acordo entre Madrid e Rabat, em vigor desde 1992, ao permitir a repatriação imediata de ilegais diminuiu a pressão da imigração ilegal marroquina, mas não obsta à avalancha de desesperados oriundos da África subsaariana que podem almejar à possibilidade de permanência provisória em Espanha até determinação da sua nacionalidade e aproveitando a inexistência de acordos de repatriação.
Após a legalização de clandestinos concluída em Maio, os imigrantes legais em Espanha oriundos da África negra rondam os 150 000 (considerando-se, no entanto, outros 80 000 ilegais), vêm sobretudo do Senegal e da Nigéria, mas não chegam a cinco por cento dos estrangeiros residentes, muito atrás das comunidades de marroquinos, equatorianos e colombianos.
Senegal, Mali, Níger, Nigéria, Guiné-Bissau, Guiné Conackry, Guiné Equatorial e Gâmbia partilham o triste destino de serem países em crise permanente, mal governados, corruptos, ora avassalados por secas, ora devastados por conflitos étnicos. A travessia do Saara rumo à miragem da Europa nas costas de Marrocos persistirá dado a inexistência de padrões mínimos de bom governo comprometer a recuperação económica. Na ausência de interlocutores sérios na África subsaariana – independentemente da relevância demográfica e petrolífera da Nigéria – todo e qualquer auxílio de índole não-humanitária deve submeter-se exclusivamente a imperativos de controlo por parte dos doadores. O programa de três anos de assistência à gestão económica e boa governação aceite pela Libéria, em Setembro, ao colocar o controlo das receitas fiscais, alfandegárias e produtos financeiros sob tutela internacional é um exemplo a seguir nos casos extremos de estados falhados.
No Magreb, a população crescerá 48 por cento até 2025 e as economias locais, com índices de desemprego superiores a 15 por cento, não dão sinais de criação de postos de trabalho capaz de absorver tal pressão demográfica. O processo de parceria entre a União Europeia e os países do Mediterrâneo, lançado em 1995 com a Declaração de Barcelona, ao visar a criação de «um espaço de paz, estabilidade, segurança e prosperidade comum» esvaiu-se em ambiguidades estratégicas do Líbano à Argélia e não passa de rosário de bons intenções com escassos resultados práticos, enquanto, a nível comezinho, a produção de haxixe continuou a aumentar em Marrocos. Só o negócio do haxixe marroquino movimenta anualmente mais de 3 mil milhões de euros e alimenta, via contrabando, 70 por cento do mercado europeu, independentemente dos regimes legais sobre uso e consumo do estupefaciente.
Na impossibilidade de a União Europeia definir a curto prazo uma política comum de imigração e de ajuda efectiva ao desenvolvimento de países terceiros cumpre discutir e definir objectivos.
Nesse sentido é de considerar o seguinte:
– As sucessivas e descoordenadas legalizações de imigrantes ilegais devem terminar e submeter-se a um quadro comum de pautas de entradas em função das necessidades dos mercados de trabalho e no respeito pelas relações preferenciais dos diversos países motivadas por relações de ordem histórica;
– As políticas de permanência e reunião familiar devem visar a integração de estrangeiros no respeito pelos valores constitucionais dos países de acolhimento;
– O combate à imigração ilegal deve continuar a passar pela repressão das redes de tráfico, das formas de economia clandestina e ilegal (prostituição compulsiva, exploração de trabalho escravo, não-inscrição de trabalhadores em sistemas de segurança social e sindical, etc.) e pela celebração de acordos com países de passagem que os obrigue a aceitar o retorno de clandestinos comprovadamente oriundos do seu território em condições compatíveis com o respeito pelos direitos do homem;
– A concessão de pedidos de asilo não se confunde com política de imigração e implica, em consequência, a suspensão das formas de auxílio bilateral ou multilateral aos estados responsáveis por actos sistemáticos e repetidos de perseguição;
– Os programas de auxílio ao desenvolvimento devem calendarizar objectivos mensuráveis aferidos por comissões paritárias em que o voto de qualidade seja assegurado por personalidade ou entidade previamente acordada entre doadores e beneficiados.
São requerimentos mínimos face à realidade das migrações que têm de levar em conta a inevitabilidade dos fluxos demográficos, as capacidades e necessidades de absorção do mercado de trabalho e dos sistemas de segurança e assistência social, os limiares de conflitualidade social e cultural, a vital promoção das trocas culturais e os imperativos de segurança face à criminalidade e a actos terroristas.
Convém fazer face ao destino em muitas e variadas línguas.