Opinião
Desobediência Civil
Este governo não se move por estratégias elaboradas mas por convicções ou melhor dito, por uma única convicção, tipo fé, que se resume em acreditar que é preciso tudo fazer para agradar aos mercados.
Este governo não se move por estratégias elaboradas mas por convicções ou melhor dito, por uma única convicção, tipo fé, que se resume em acreditar que é preciso tudo fazer para agradar aos mercados.
Até aqui tudo bem, já que cada um tem a crença que merece. O que não está bem explicado é qual a utilidade prática deste desígnio para a generalidade dos portugueses.
O governo aumentou impostos, cortou salários, reduziu drasticamente a liquidez em circulação e a atividade económica, provocou uma catadupa de falências e um crescimento brutal do desemprego. O país entrou em recessão e praticamente todos os indicadores económicos pioraram. Para quem não gosta de estatísticas, basta andar pelas ruas e ver a quantidade impressionante de lojas que fecharam e casas para vender e alugar que ninguém quer. Ou falar com os amigos e vizinhos e constatar o pânico e a falta de dinheiro. Portugal estagnou.
Desta operação resultou uma ligeira diminuição do défice. Muito menos do que o necessário, apesar das engenharias financeiras de toda a ordem. Não é preciso ser economista ou matemático para perceber que a recessão resulta em menor cobrança de impostos, maior despesa social e, portanto, acrescida dificuldade em equilibrar as contas públicas.
A primeira pergunta de um milhão de euros é, pois, a de saber se esta situação irá mesmo agradar aos mercados? Se até aqui se dizia que ninguém queria emprestar dinheiro a Portugal porque gastava mais do que as suas possibilidades, quem vai emprestar dinheiro a um país literalmente falido?
Mas pode e deve ir-se ainda mais longe. A segunda pergunta, que também vale um milhão de euros, está em saber para que serve agradar aos mercados? Para conseguir empréstimos a juro baixo? Ou seja, para voltar ao endividamento? Para gastar outra vez mais do que as possibilidades? Não se entende.
Concentrados na austeridade, no défice e na conquista emocional dos mercados não estamos a abordar aquilo que realmente devia estar na ordem do dia. O papel do Estado. Ninguém o faz e compreende-se. O governo não o faz porque, ao contrário do que afirma, é clientelar e estatista. A esquerda também não porque defende um Estado grande e gastador. Capitalistas, empresários e afins ainda menos porque parte substancial dos seus rendimentos provêm da captura dos dinheiros públicos e das benesses do Estado.
E, no entanto, a diminuição radical do peso do Estado, tanto na cobrança de impostos quanto na interferência na vida dos cidadãos e das empresas, seria a única coisa que realmente poderia contribuir para arejar o ambiente geral. A tarefa prioritária do governo e aquilo que se devia estar a discutir e não está, seria portanto definir que funções do Estado são essenciais e o que deve ser desmantelado. Saúde, educação, Segurança Social, fiscalização e regulação são óbvias. Tudo o resto pode ser reavaliado e redefinido.
Anda muito esquecido e por isso é preciso recordar. Os cidadãos pagam impostos em troca de direitos e serviços fundamentais. O Estado não faz nenhum favor quando trata um doente num hospital. Ao contrário do que se diz com frequência, a saúde não é gratuita, pois foi paga em adiantado pelos contribuintes. As pensões não são benesses, as pessoas já as pagaram antecipadamente. O Estado, que hoje só aparece como cobrador, é um grande devedor. Não se vire o mundo de pernas para o ar.
Não fosse Portugal um país sem sociedade civil, e sem pensamento político livre e autónomo, e por esta altura devíamos estar a discutir algumas ideias de Henry Thoreau, já que o marxismo/leninismo deu cabo das boas ideias de Marx. Thoreau e alguma esquerda libertária, consideram que qualquer alteração social sustentável deve partir dos próprios indivíduos e da sua consciência, em oposição à tirania do Estado. Este não pode fazer tudo o que quer, nem gastar o dinheiro dos contribuintes de forma discricionária e venal. Thoreau não escreveu só o livro "Desobediência Civil" (1849), praticou-a, recusando-se a pagar impostos o que lhe valeu a prisão. Já faltou mais para lhe seguirmos o exemplo.
Até aqui tudo bem, já que cada um tem a crença que merece. O que não está bem explicado é qual a utilidade prática deste desígnio para a generalidade dos portugueses.
Desta operação resultou uma ligeira diminuição do défice. Muito menos do que o necessário, apesar das engenharias financeiras de toda a ordem. Não é preciso ser economista ou matemático para perceber que a recessão resulta em menor cobrança de impostos, maior despesa social e, portanto, acrescida dificuldade em equilibrar as contas públicas.
A primeira pergunta de um milhão de euros é, pois, a de saber se esta situação irá mesmo agradar aos mercados? Se até aqui se dizia que ninguém queria emprestar dinheiro a Portugal porque gastava mais do que as suas possibilidades, quem vai emprestar dinheiro a um país literalmente falido?
Mas pode e deve ir-se ainda mais longe. A segunda pergunta, que também vale um milhão de euros, está em saber para que serve agradar aos mercados? Para conseguir empréstimos a juro baixo? Ou seja, para voltar ao endividamento? Para gastar outra vez mais do que as possibilidades? Não se entende.
Concentrados na austeridade, no défice e na conquista emocional dos mercados não estamos a abordar aquilo que realmente devia estar na ordem do dia. O papel do Estado. Ninguém o faz e compreende-se. O governo não o faz porque, ao contrário do que afirma, é clientelar e estatista. A esquerda também não porque defende um Estado grande e gastador. Capitalistas, empresários e afins ainda menos porque parte substancial dos seus rendimentos provêm da captura dos dinheiros públicos e das benesses do Estado.
E, no entanto, a diminuição radical do peso do Estado, tanto na cobrança de impostos quanto na interferência na vida dos cidadãos e das empresas, seria a única coisa que realmente poderia contribuir para arejar o ambiente geral. A tarefa prioritária do governo e aquilo que se devia estar a discutir e não está, seria portanto definir que funções do Estado são essenciais e o que deve ser desmantelado. Saúde, educação, Segurança Social, fiscalização e regulação são óbvias. Tudo o resto pode ser reavaliado e redefinido.
Anda muito esquecido e por isso é preciso recordar. Os cidadãos pagam impostos em troca de direitos e serviços fundamentais. O Estado não faz nenhum favor quando trata um doente num hospital. Ao contrário do que se diz com frequência, a saúde não é gratuita, pois foi paga em adiantado pelos contribuintes. As pensões não são benesses, as pessoas já as pagaram antecipadamente. O Estado, que hoje só aparece como cobrador, é um grande devedor. Não se vire o mundo de pernas para o ar.
Não fosse Portugal um país sem sociedade civil, e sem pensamento político livre e autónomo, e por esta altura devíamos estar a discutir algumas ideias de Henry Thoreau, já que o marxismo/leninismo deu cabo das boas ideias de Marx. Thoreau e alguma esquerda libertária, consideram que qualquer alteração social sustentável deve partir dos próprios indivíduos e da sua consciência, em oposição à tirania do Estado. Este não pode fazer tudo o que quer, nem gastar o dinheiro dos contribuintes de forma discricionária e venal. Thoreau não escreveu só o livro "Desobediência Civil" (1849), praticou-a, recusando-se a pagar impostos o que lhe valeu a prisão. Já faltou mais para lhe seguirmos o exemplo.
Este artigo de opinião foi escrito em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.
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