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09 de Outubro de 2007 às 13:59

De como Portugal se transformou numa imensa alcateia

Durante várias semanas, vimos milhões de portugueses vibrarem com o comportamento de uma equipa nacional, num desporto até muito recentemente quase desconhecido dos portugueses – o rugby.

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O curioso desta situação prende-se com o facto de, ao contrário do que normalmente sucede em eventos desportivos, este entusiasmo não ter resultado de estrondosas vitórias mas sim de valores e do comportamento corajoso da equipa.

Num estudo recente em que participei sobre fãs de futebol em Portugal, foi possível constatar a existência de uma conhecida teoria aplicável aos fãs desportivos, onde realçam os conceitos de BIRG (Basking in Reflected Glory) e CORF (Cutting off Reflected Glory) que defendem que os adeptos tendem a apropriar-se das vitórias da sua equipa considerando que “nós ganhámos”, distanciando-se das derrotas que tentam minimizar com expressões do tipo “eles perderam”.

Sendo que um campeonato se compõe de vários jogos entre equipas diversas, é óbvio que, exceptuando as equipas extraordinárias, como é o caso do Brasil, no futebol,  as outras equipas tendem a dividir vitórias e derrotas – por vezes muito previsíveis – que levam, naturalmente, a um sentimento de desilusão.

Ora, o curioso é que tal não se verificou com a nossa selecção de rugby. Do ponto de vista da gestão do marketing de uma organização desportiva e das respectivas marcas que à equipa se associam, seria interessante aprofundar as razões pelas quais tal não aconteceu.

Segundo o pensamento pós-moderno, as pessoas tendem a juntar-se em torno de comunidades com as quais partilham afinidades e elos de ligação criados à volta de marcas, comportamentos de consumo ou, de alguma forma, de valores partilhados. No caso em apreço, a selecção nacional de rugby soube associar aos tradicionais símbolos portugueses, como a bandeira e o hino nacional, um conjunto de valores característicos da própria modalidade: fair-play, entrega total, espírito de equipa, respeito pelo adversário, espírito de sacrifício e capacidade de superação face a equipas profissionais e com importante tradição na modalidade.

Na verdade, estes valores que, por vezes, parecem bem distantes da nossa realidade do século XXI mas que foram responsáveis por algumas das mais gloriosas páginas da nossa história passada enquanto nação, foram bem veiculados ao longo de todo o campeonato e, antes ainda, na fase de qualificação, por amadores capazes de grandes sacrifícios pessoais e familiares como, por exemplo, o de se deslocar centenas de quilómetros várias vezes por semana para treinar.

Sendo o rugby um desporto com fracas assistências em Portugal, o processo de comunicação do campeonato e da nossa selecção foi feito fundamentalmente através dos media. Num primeiro momento, a motivação partiu do seleccionador Tomaz Morais através de um discurso claro, da definição de objectivos e capacidade de mobilização de jogadores e espectadores, quer nos estádios, quer em frente da televisão.

Penso que é justo destacar o papel da Sport TV que, este propósito, prestou um verdadeiro serviço público com um programa diário sobre a equipa e também o protagonismo da imprensa desportiva – habitualmente mais preocupada com o futebol – que dedicou diariamente várias páginas ao rugby e à selecção.

Os patrocinadores, como a Volkswagen ou a Caixa Geral de Depósitos também deram “um empurrãozinho”, excepção feita ao patrocínio da empresa de equipamentos desportivos Quebramar que, incompreensivelmente, não tinha camisolas de rugby para entrega perdendo, assim, uma excelente oportunidade de venda.

Mau grado os comentários negativos “dos mesmos do costume”, a selecção de rugby soube ganhar o respeito e a admiração de um país pouco habituado a esta modalidade, desde logo pela forma como se preparou num estágio com os fuzileiros mas, sobretudo, na forma como entrou em campo e, desde o cantar do hino até ao final do jogo, avançou estoicamente cada metro em busca do ensaio ou da placagem de cada adversário.

No papel de observador externo, foi bom ver como todas as pessoas ligadas à modalidade – dirigentes da federação e dos clubes, jogadores e ex-jogadores – souberam acompanhar e apoiar a equipa em bloco, esquecendo a natural diversidade de opiniões sobre o critério de convocações ou sobre a justeza das tácticas de jogo e não retirando protagonismo à equipa.

Tal como, então, me afirmava o Secretário de Estado dos Desportos, trata-se de uma viragem na relação dos portugueses com uma selecção, mantendo-se o apoio independentemente dos resultados desportivos, facto a que não é alheia a gestão do processo de comunicação.

Penso que os portugueses precisam do tipo de valores que a selecção nacional de rugby soube dar-lhes. No futuro, o sucesso da modalidade e o enorme capital de confiança agora conquistado dependerão, sobretudo, da gestão das expectativas junto dos adeptos e do apoio das marcas que saibam associar-se a esta selecção.

Como dizia o conhecido jornal desportivo francês “L’Équipe”, defendendo a não redução do número de equipas para que selecções como a portuguesa não deixassem de nele ter lugar “Força Lobos e obrigado!” Subscrevo!

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