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26 de Outubro de 2012 às 12:34

Até quando podemos suportar estas afrontas?

Entende-se que, ante a baralhada da vida política e económica, António José Seguro não esteja muito interessado em assumir o poder.

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Entende-se que, ante a baralhada da vida política e económica, António José Seguro não esteja muito interessado em assumir o poder. "Serei primeiro-ministro quando os portugueses quiserem", diz. Uma maneira extremamente habilidosa de salvar as aparências e de garantir uma espécie de resguardo da sua pessoa. Mas será António José Seguro o homem indicado para o momento certo? A verdade é que, com este sistema de "alternância" entre PS e PSD, não há volta a dar. E deixar Pedro Passos Coelho crestar em lume brando é uma estratégia que está a resultar. Entretanto, somos nós que pagamos, dolorosamente, a experiência ideológica de um grupo de políticos muito mal preparado, e de obstinação cega. O Orçamento do Estado, lido nos itens que se nos oferecem, é um documento pavoroso.

Neste ínterim, o dr. Cavaco demonstra, claramente, a dubiedade do seu carácter e as indecisões criminosas do seu espírito. Não há que contar com ele para uma alteração substancial das coisas. Os apelos feitos para que intervenha caem em cesto roto. Não é, somente, a sua alarmante falta de coragem moral, é a verificação de que está de acordo com as políticas ultraliberais desta claque. Nada de novo na frente ocidental.

Nada parece demover a classe dominante. A pobreza do povo português atinge as zonas da miséria. As instituições de apoio social, como a Caritas e outras ligadas ou não à Igreja, estão num sufoco. Aumentam os pedidos e escasseiam os géneros. A solidariedade nacional é posta à prova como nunca o foi. Famílias sem apoio do Estado, que se divorciou dos seus deveres fundamentais, aumentam dramaticamente todos os dias. Figuras de proa do Portugal contemporâneo, erguem as suas vozes protestando contra as decisões governamentais que empurram as populações para o abismo. Pior que tudo, são as centenas de milhares de jovens que abandonam o País, incentivados pelas afirmações fatais dos dirigentes, e pela inexistência da mais ténue réstia de esperança.

Nunca é de mais insistir nestes factos. E, enquanto houver uma possibilidade de protesto, os jornalistas não se devem calar. Mas as ameaças que pairam sobre a comunicação social são medonhas. E não dizem, apenas, respeito aos profissionais. A crise, cada vez mais acentuada, tem a ver com os leitores, com a democracia e com a liberdade. O que se passa na Lusa e no "Público" parece ter sido dissimulado. A minha solidariedade para com os meus camaradas afectados por este vendaval perigosíssimo, é inteira e sem rasuras. Junto a minha à voz amargurada dessas centenas de profissionais, e manifesto-lhes o meu apoio moral e fraterno. O que está em causa exige a indignação generalizada, pois o assunto não corresponde, somente, a um movimento corporativo.

O afastamento de Vítor Ramalho da presidência do INATEL insere-se na mesma política do abafador. Ramalho fez um trabalho commumente elogiado; porém, tem um estorvo: criticava as políticas do PSD. Ele próprio o afirmou, numa entrevista a Mário Crespo: foi saneado por dizer o que diz e, também, porque é militante do PS. Os saneamentos têm sido, à direita e à esquerda, aleijões de uma democracia de superfície, comandada e orientada por dois partidos: os do chamado "arco do poder." Todos eles e alguns mais têm culpa no cartório, e está por fazer a história das tropelias cometidas nesse sentido. A questão, no entanto, consiste no seguinte: que deseja fazer do INATEL o governo de Passos Coelho?

A estratégia do medo está instalada na nossa sociedade. E o abafo sob o qual vivemos nota-se todos os dias, nos mais escassos pormenores, na menor das nossas atitudes. No tempo do fascismo animava-nos a ideia de que outro tempo surgiria. Por isso, e para isso, os melhores de nós se bateram, foram presos, mortos e exilados. Que nos resta? Tentam dobrar-nos o carácter, enquanto amolecem o nosso querer.

Passos Coelho vai crestando, em lume brando, devido à falta de coragem daqueles que dirigem o País, e a crispação agrava-se, larvar e endémica como uma praga. As indicações que nos chegam são de molde a inquietar-nos. É curto o espaço entre a resignação e a indignação, dizia, há dias, o general Ramalho Eanes, com a sabedoria que se lhe reconhece. Torna-se claro que ninguém pode viver neste clima sem alma e sem perspectivas. Não é só a fome que nos assalta: é a sensação de que nos manietaram, de que nos desprezam e de que não nos ouvem.

Até quando podemos suportar este fardo, que pesa e nos esmaga? Até quando?



b.bastos@netcabo.pt

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