Opinião
Associação “na hora”
Depois do sucesso verificado com o programa “Empresa na hora”, consubstanciado no facto de a maior parte das empresas serem hoje constituídas em Portugal por recurso a este procedimento simplificado (sendo que 99% das sociedades constituídas “na hora” são
Depois do sucesso verificado com o programa “Empresa na hora”, consubstanciado no facto de a maior parte das empresas serem hoje constituídas em Portugal por recurso a este procedimento simplificado (sendo que 99% das sociedades constituídas “na hora” são-no sob a forma de sociedade por quotas ou unipessoais por quotas, o que diz muito sobre o tecido empresarial português), o Governo português desencadeou e o parlamento aprovou um regime especial de constituição imediata de associações, vulgarmente conhecido como “Associação na hora”.
Aprovado pela Lei n.º 40/2007, de 24 de Agosto, este novo regime, que entrará em vigor no dia 31 de Outubro de 2007, vem permitir a constituição imediata de associações com personalidade jurídica, sem que para o efeito haja necessidade de escritura pública, podendo ocorrer, se nisso os associados fundadores tiverem interesse, a simultânea aquisição de uma marca registada. Tudo numa lógica de “one stop shop” (fazendo uso de um estrangeirismo hoje em voga).
Deverá ser tido em atenção que o regime da associação na hora não será aplicável à constituição de associações que revistam o carácter de partidos políticos, pessoas colectivas religiosas, associações socioprofissionais de militares e agentes das forças de segurança, associações de empregadores, associações sindicais, comissões de trabalhadores e associações humanitárias de bombeiros, as quais, como é sabido, beneficiam de um regime jurídico próprio que impõe maiores exigências ao acto constitutivo (sujeitas, algumas delas, a um regime de autorização).
Tal como no regime da empresa na hora, é pressuposto da aplicação do regime associação na hora (i) a opção por uma denominação de fantasia reservada a favor do Estado ou a apresentação de certificado de admissibilidade de denominação emitido pelo registo Nacional de Pessoas Colectivas e (ii) a opção por estatutos de modelo aprovado pelo Instituto dos Registos e Notariado.
Assim, embora careça ainda de regulamentação específica (a definir por portaria a publicar brevemente), quem a partir do dia 31 de Outubro de 2007 pretender constituir uma associação recorrendo a este procedimento simplificado deverá dirigir-se a uma conservatória do registo comercial e, no caso das pessoas singulares, apresentar os respectivos documentos de identificação e, no caso das pessoas colectivas, apresentar também os documentos de identificação e acreditação da respectiva capacidade e poderes para o acto (leia-se, certidão do registo comercial e eventual deliberação social ou procuração para o efeito).
No acto de constituição, o funcionário da conservatória do registo comercial (i) cobrará os encargos devidos (no montante de €170), (ii) afectará, por via informática, a denominação escolhida e o número de identificação de pessoa colectiva associado à denominação, (iii) preencherá o acto constitutivo e os estatutos, por documento particular, de acordo com o modelo previamente escolhido, (iv) fará o reconhecimento presencial das assinaturas dos intervenientes no acto, (v) emitirá o cartão de pessoa colectiva e comunicará o número de inscrição da associação na segurança social, (vi) arquivará, em suporte informático, o acto constitutivo, os estatutos e os documentos comprovativos da capacidade dos associados fundadores, (vii) publicará o acto constitutivo e os estatutos da associação no site do Ministério da Justiça destinado à publicação de actos societários e (viii), caso os associados fundadores o requeiram, submeterá a declaração de início de actividade da associação à administração fiscal.
Concluído o procedimento de constituição da associação, os associados fundadores receberão de imediato uma certidão do acto constitutivo e dos estatutos da associação.
Nas situações em que não seja possível o arquivo electrónico do acto constitutivo, dos estatutos e dos documentos comprovativos da capacidade dos associados fundadores, deve o serviço que acompanhou a constituição da associação remeter tais documentos à conservatória do registo comercial da sede da associação.
Deverá notar-se, todavia, que, ao contrário do que sucede com as sociedades, as associações não são objecto de matrícula na conservatória do registo comercial da respectiva sede ou em qualquer outra, funcionando as conservatórias do registo comercial apenas como agentes constitutivos e de arquivo da documentação subjacente à constituição (tendo também competência para emitir certidões de tais documentos). A este nível, manter-se-á o actual regime legal, que prescreve que apenas as associações que beneficiem do estatuto de utilidade pública carecem de estar matriculadas na conservatória do registo comercial da respectiva sede, não tendo estas conservatórias qualquer competência quanto à matrícula e controlo de legalidade dos actos associativos das restantes associações. Compreende-se, naturalmente, a manutenção do actual regime de não sujeição das associações a registo nas conservatórias do registo comercial, por absoluta desnecessidade de tornar mais complexo o que hoje é simples.
Em jeito de apreciação, deverá dizer-se que, no âmbito do processo especial de constituição de associações agora aprovado têm cabimento as críticas que em 9 de Janeiro de 2006, neste mesmo jornal, fizemos ao programa “empresa na hora”.
Dissemos, à data, que a escolha de entre denominações pré-aprovadas não servia os interesses dos sócios das sociedades a constituir e sustentámos também que o minimalismo regulatório dos pactos sociais previamente aprovados não será, a grande parte das vezes, suficiente para acautelar os interesses dos sócios (no caso das sociedades) e associados (no caso das associações). Mantemos em absoluto o afirmado, constatando-se que, em grande número de casos, à constituição da empresa na hora se segue a alteração da denominação e dos estatutos da sociedade. Não é difícil prever que nas associações na hora venha a ocorrer exactamente o mesmo, o que na prática anulará os eventuais ganhos de tempo e financeiros que a rapidez da constituição proporciona.
Propusemos à data e reafirmamos hoje essa proposta (embora se admita que a mesma terá maior cabimento no que às sociedades comerciais respeita) que nada obsta, do ponto de vista jurídico, que sociedades e associações se possam constituir sem denominação aprovada por serem dotadas de um elemento único e distintivo que é o número de pessoa colectiva, eventualmente dispondo de um prazo razoável (3 ou 6 meses, por exemplo) para posterior apresentação de certificado de admissibilidade de firma e alteração dos respectivos estatutos.
Parece-nos, aliás, que, especialmente no que às sociedades comerciais respeita, em alternativa ao recurso a denominações sociais pré-aprovadas melhor seria se aquelas pudessem optar por compor a denominação com o respectivo número de pessoa colectiva seguido do elemento identificativo do tipo societário Lda. ou S.A. (por exemplo, “599999999, Lda.”), podendo, naturalmente, alterar a mesma no futuro se e quando o entendam conveniente.
Aqui fica a sugestão ao Ministério da Justiça.