Opinião
As empresas no mercado espanhol
As relações com as Autonomias espanholas devem ser vistas como tal, mas também como portas de passagem para outras regiões, onde necessitamos de expandir a nossa actividade económica.
A relação económica com a Espanha é fundamental para Portugal.
A presença cultural em Espanha é decisiva para a afirmação da identidade portuguesa no espaço ibérico e ibero-americano.
Não é correcta a percepção de que o mais importante é a relação com Madrid. Esta, sendo obviamente necessária, não é a única perspectiva. Pelo contrário, do ponto de vista político, cultural e económico é vital a descentralização da nossa relação externa com a Espanha. Se prosseguirmos no afunilamento da nossa relação com Madrid, estaremos apenas a potenciar um mero papel regional dentro do enquadramento ibérico.
As relações com as Autonomias espanholas devem ser vistas como tal, mas também como portas de passagem para outras regiões, onde necessitamos de expandir a nossa actividade económica. Exemplos: o Pais Basco é um ponto importante de «salto» para a região de Bordéus, a Andaluzia e a Região de Valência são portas logísticas do Mediterrâneo, Barcelona é uma peça fundamental para uma acção no sul de França, etc.
A rede de Conselheiros comerciais – que deveria ser criada nos Consulados em Espanha – deverá também ter uma acção regional.
As relações empresariais entre os dois países passaram por momentos muito distintos. Em 1986, com a adesão à UE, constatei um grande entusiasmo das nossas empresas, mas que rapidamente se desvaneceu por duas razões básicas: em primeiro lugar porque existiram grandes possibilidades de desenvolvimento no mercado interno português, que começou a receber apoios comunitários e onde, naquele momento, se registavam transformações profundas de caracter político e principalmente económico, com uma participação, pela primeira vez efectiva, na economia europeia.
Por outro lado, a penetração em Espanha resultou num fracasso para muitas empresas que desconheciam efectivamente o funcionamento deste mercado. Há também que dizer que a Espanha procedeu de forma hábil naquele momento, ao bloquear as nossas exportações tradicionais, actuando no capitulo da certificação técnica, que apanhou desprevenidos os nossos empresários e permitiu evitar uma primeira tentativa de penetração comercial das nossas empresas.
O desinteresse manteve-se até há pouco tempo e só a conjugação de vários factores: implementação do Euro, que deu aos dois países a mesma moeda; crise económica interna que forçou as empresas para o caminho da exportação; dificuldades em muitos dos nossos mercados internacionais; e em particular o facto de os empresários terem – finalmente – percebido que a Espanha é o país europeu que se tem ressentido menos da concorrência decorrente do alargamento e onde, portanto, os nossos produtos ainda têm, durante um tempo limitado, é certo, maior competitividade.
As empresas portuguesas também se aperceberam de que a Espanha tem mantido um crescimento interno invejável, graças à procura interna, tanto privada como pública, já que resolveu o problema do défice de forma inteligente no período expansivo do ciclo económico.
A primeira noção fundamental a reter neste mercado é que estamos perante, não de um mercado único mas sim de 18 mercados, tantos quanto as Autonomias em presença.
Para as empresas portuguesas importa definir zonas preferenciais de actuação em Espanha, já que poucas terão capacidade financeira, logística e de gestão para poderem actuar em todo o país vizinho, um mercado bem maior do que o nosso.
Tem-se verificado uma progressiva transferência de poderes do Estado Central para as Autonomias. É a estas que têm de ser solicitados os apoios ao desenvolvimento concedidos às empresas que trabalham em diversos sectores (embora existam marginalmente entidades do poder central que ainda concedem subsídios).
As verbas concedidas podem ter origem tanto nos Orçamentos das Comunidades Autónomas, como em fundos transferidos pela Comunidade Europeia.
Os principais tipos de apoios são os seguintes:
Para comércio externo e cooperação internacional; educação e formação; criação de emprego; criação de empresas; sector do comércio; energia e o transporte; investigação cientifica e seu desenvolvimento; meio ambiente e qualidade produtiva; novas tecnologias, informação e comunicação; política regional; para turismo; para habitação e urbanismo.
Recomendo a acção principal em alguma(s) das seguintes Comunidades Autónomas, que têm fronteira com Portugal: Galiza (sede de Governo em Santiago de Compostela), Castilha-León (Governo em Valladolid); Estremadura (Governo em Mérida); Andaluzia (Governo em Sevilha). E também pela sua grande importância económica e relação com Portugal, o País Basco (Governo em Bilbau) e a Catalunha (Governo em Barcelona).
Os espanhóis são muito nacionalistas e mesmo «localistas». Daí que os gostos, tendências e maneira de fazer negócio variem de Região para Região. Por outro lado o «apelo do estrangeiro» é limitado a produtos muito específicos de gama alta e com prestígio. No geral, o espanhol instintivamente acha que o seu produto é o melhor. A maneira mais simples de fazer uma primeira abordagem é com o concurso de um agente local. Numa segunda fase é sempre bem acolhida a ideia de criar uma empresa em Espanha (mesmo que seja só de distribuição...). Não é um mercado fácil e implica uma acção constante até conquistar efectivamente um lugar na mente do cliente-alvo, o qual só se consegue com qualidade e desempenho comercial muito atento. Sublinho para quem não sabe que o cliente em Espanha é muito mais exigente do que em Portugal. As empresas espanholas já estão habituadas a esse facto e são por sua vez também exigentes quanto a prazos e homogeneidade do produto.
Finalmente acrescento que convém não confundir a simpatia (em geral verdadeira) de que nós portugueses gozamos em Espanha com resultados comerciais imediatos. O espanhol é mais efusivo no trato, mas esse aspecto não significa nada em termos práticos de negócio, onde são bastante duros. Como se diz em Barcelona «la pela (peseta) es la pela...».
As necessidades das empresas portuguesas e o imperativo da afirmação da nossa cultura são, em nosso entender, elementos essenciais da relação com Espanha.