Opinião
A máquina de Morel nas mãos de Passos Coelho
Em consciência, nenhum português é favorável a um aumento de impostos. Em consciência, todos os que conhecem as contas públicas e dão como bom o memorando da troika, sabem que o Governo português não conseguirá atingir os objectivos estabelecidos no programa de assistência financeira, sem um aumento da carga fiscal.
1. Em consciência, nenhum português é favorável a um aumento de impostos. Em consciência, todos os que conhecem as contas públicas e dão como bom o memorando da troika, sabem que o Governo português não conseguirá atingir os objectivos estabelecidos no programa de assistência financeira, sem um aumento da carga fiscal. Foi essa inevitabilidade que Passos Coelho anunciou sexta-feira ao país, acrescido de mais um corte da despesa por via da redução dos salários da Função Pública.
2. O ‘timing’escolhido pelo primeiro-ministro para revelar estas medidas não foi, claro, inocente. No plano especulativo é natural deduzir que o fez antes de ser conhecida a quinta avaliação da troika para que esta, com o respaldo da austeridade prometida para 2013, aceitar suavizar as metas do défice para o ano em curso.
Com esta estratégia, a provável cedência da troika deixa de ser vista como uma derrota, passando a ser olhada como uma atitude que premeia o empenho do Governo português.
3. A Passos Coelho, no discurso de sexta-feira, faltou ser tão assertivo no anúncio de medidas que incidam sobre os mais ricos, as grandes empresas e as rendas excessivas, da mesma forma que o foi em relação aos trabalhadores dos sectores privado e público.
O primeiro-ministro fez floreados linguísticos e deixou promessas no ar, mas não passou disso. Esta omissão de Passos Coelho faz com que muitos, legitimamente, coloquem em causa a equidade deste esforço colectivo, sendo um factor altamente perturbador em termos de coesão social.
Um imposto sobre os mais ricos, por exemplo, faz entrar menos dinheiro nos cofres do Estado que o aumento da TSU. Contudo, mais do que o montante, o que está em causa é a tomada de decisões que se baseiem no primado da justiça social.
4. Sem esta perspectiva, as medidas anunciadas por Passos Coelho assemelham-se à invenção de Morel, a máquina que reproduz realidades passadas, descrita magistralmente pelo escritor argentino Adolfo Bioy Casares. E quando o passado se repete, o presente não traz futuro. Nenhum.
Nota: A editora de política do "Público", Leonete Botelho, escreveu um artigo de opinião na edição de sábado do jornal, onde afirma que o facto de o Negócios ter revelado em primeira-mão as medidas que Passos Coelho anunciou na sexta-feira resultou de um "privilégio" do Governo aos "media amigos". Trata-se de uma insinuação cheia de despeito, desprovida de sentido e, como tal, mentirosa, que eu, enquanto autor das referidas notícias repudio veementemente. Em jornalismo não existem "amigos" ou "inimigos". Existem notícias. Por isso, se a editora de política do "Público" quer dar notícias deve procurá-las, em vez de se refugiar em teorias desculpabilizantes.
2. O ‘timing’escolhido pelo primeiro-ministro para revelar estas medidas não foi, claro, inocente. No plano especulativo é natural deduzir que o fez antes de ser conhecida a quinta avaliação da troika para que esta, com o respaldo da austeridade prometida para 2013, aceitar suavizar as metas do défice para o ano em curso.
3. A Passos Coelho, no discurso de sexta-feira, faltou ser tão assertivo no anúncio de medidas que incidam sobre os mais ricos, as grandes empresas e as rendas excessivas, da mesma forma que o foi em relação aos trabalhadores dos sectores privado e público.
O primeiro-ministro fez floreados linguísticos e deixou promessas no ar, mas não passou disso. Esta omissão de Passos Coelho faz com que muitos, legitimamente, coloquem em causa a equidade deste esforço colectivo, sendo um factor altamente perturbador em termos de coesão social.
Um imposto sobre os mais ricos, por exemplo, faz entrar menos dinheiro nos cofres do Estado que o aumento da TSU. Contudo, mais do que o montante, o que está em causa é a tomada de decisões que se baseiem no primado da justiça social.
4. Sem esta perspectiva, as medidas anunciadas por Passos Coelho assemelham-se à invenção de Morel, a máquina que reproduz realidades passadas, descrita magistralmente pelo escritor argentino Adolfo Bioy Casares. E quando o passado se repete, o presente não traz futuro. Nenhum.
Nota: A editora de política do "Público", Leonete Botelho, escreveu um artigo de opinião na edição de sábado do jornal, onde afirma que o facto de o Negócios ter revelado em primeira-mão as medidas que Passos Coelho anunciou na sexta-feira resultou de um "privilégio" do Governo aos "media amigos". Trata-se de uma insinuação cheia de despeito, desprovida de sentido e, como tal, mentirosa, que eu, enquanto autor das referidas notícias repudio veementemente. Em jornalismo não existem "amigos" ou "inimigos". Existem notícias. Por isso, se a editora de política do "Público" quer dar notícias deve procurá-las, em vez de se refugiar em teorias desculpabilizantes.
*Subdirector
Visto por dentro é um espaço de opinião de jornalistas do Negócios
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